Opinião

Brasil pode protagonizar a descarbonização marítima

O recente anúncio da ANP de inclusão da comercialização de biodiesel marítimo até 24%, é um passo gigantesco. Começamos a caminhar para uma navegação mais limpa e sustentável.

Por Flavio Ribeiro

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Descarbonizar o transporte marítimo global até 2050. Esse é o objetivo da Organização Marítima Internacional (IMO, sigla em inglês). Eficiência energética e operacional, otimização da frota e da viagem, automação de diversas funções e, principalmente, a adoção de novos combustíveis são os caminhos para atingirmos as metas. 

Até 2030, precisaremos alcançar uma redução nas emissões de gases do efeito estufa (GEE) de pelo menos 20% em relação aos níveis de 2008, subindo para 70% dez anos depois. Para isso, até o início da próxima década, 5% dos combustíveis marítimos já não devem emitir GEE ou terão emissões muito próximas a zero. 

Medidas obrigatórias de curto prazo entraram em vigor no ano passado, exigindo que os navios cumpram requisitos técnicos de eficiência energética e intensidade de carbono. Já as propostas a serem adotadas a médio prazo, com entrada em vigor prevista para 2027, estão sendo discutidas pelos Estados-membros, entre elas uma norma sobre a redução faseada da intensidade de GEE. 

Em março passado, o Comitê de Proteção do Ambiente Marinho da IMO decidiu elaborar um quadro de referência de emissões líquidas zero, que é um primeiro passo para incorporar essas medidas ao direito internacional. 

Além das definições da IMO, outras regulações, especialmente europeias, têm o objetivo de reduzir e controlar a emissão de GEE, como o EU ETS (European Union Emissions Trading System), um sistema para controle de emissões baseado na disponibilização anual de uma quantidade limitada de cotas de CO2 para determinadas indústrias. 

No caso das embarcações, as que têm mais de 5 mil toneladas e transportam cargas e passageiros devem pagar pelas emissões realizadas, adquirindo créditos de carbono, os European Allowances (EUAs). Também é importante reiterar que outros tipos de embarcações serão, progressivamente, incluídos ao escopo do EU ETS. 

Já a FuelEU Maritime é uma legislação que tem o objetivo de promover a descarbonização da indústria de shipping e, a partir de 2025, determinará o aumento progressivo da participação de combustíveis renováveis e de baixo carbono na matriz de combustíveis marítimos utilizados no bloco europeu.

Todas essas regras são aplicadas e cobradas com base em indicadores de eficiência e sustentabilidade de navios em produção e embarcações já existentes, como Carbon Intensity Indicator Rating e Ship Energy Efficiency Management, estabelecendo parâmetros de avaliação para a frota global, permitindo que a regulamentação ocorra segundo critérios objetivos. 

Frente a todos esses desafios e metas do setor de combustíveis marítimos, o Brasil se destaca por ter um enorme potencial para se tornar um ator-chave na produção de matérias-primas, biocombustíveis e outros combustíveis alternativos para a indústria de bunker. Para isso, é preciso que as partes interessadas, tanto públicas quanto privadas, unam-se em prol de uma produção responsável, especialmente para que os biocombustíveis de primeira geração – a partir de açúcares, amidos ou óleos vegetais – sejam aceitos na comunidade naval, como tem ocorrido nas indústrias automotiva e de aviação.

Se por um lado a IMO e UE têm se esforçado para criar regras internacionais claras para a descarbonização do transporte marítimo, é necessário que haja também regulamentações nacionais claras em relação a essa transição energética. É urgente que esse movimento ganhe tração de modo a criar um ambiente seguro para o desenvolvimento de negócios no cenário dos combustíveis alternativos.

O recente anúncio da ANP (Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis) de que vai alterar a Resolução 903 para incluir a comercialização de biodiesel marítimo até 24%, é um passo gigantesco para a regulamentação do biodiesel e suas misturas no Brasil e, mais ainda, é fundamental para a tão aguardada e necessária transição energética do setor. 

Se antes estávamos atrás dos transportes rodoviário e aeronáutico, agora começamos a caminhar para uma navegação mais limpa e sustentável. E o Brasil, como um dos maiores produtores de biocombustíveis do mundo, precisa atuar com diplomacia para convencer a Organização Marítima Internacional (IMO) do valor estratégico e da necessidade do acesso aos óleos vegetais de primeira geração (através de processos certificáveis de origem) que permitirão garantir e acelerar essa transição energética tão necessária para nossa sociedade.

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