Opinião
Combustíveis sustentáveis de aviação e o Brasil como líder da transição energética
Atualmente, os SAF são regulados no Brasil pela ANP, mas não há um marco legal dos combustíveis avançados, o que aumenta a insegurança jurídica e afasta investimentos
Derivados de fontes alternativas ao querosene de aviação de origem fóssil, como biomassa, óleos vegetais, resíduos sólidos etc., os combustíveis sustentáveis de aviação (sustainable aviation fuels – SAF, em inglês) permitem redução significativa da pegada de carbono.
O setor de transporte aéreo é responsável por 2% das emissões dos gases causadores do efeito estufa. A substituição do querosene fóssil pelos SAF é uma medida é uma das principais formas para a redução dessas emissões e para o atingimento das metas estabelecidas em compromissos internacionais.
Como os SAF têm estrutura molecular idêntica à do querosene fóssil, são considerados biocombustíveis drop-in, ou seja, substituem os combustíveis fósseis sem a necessidade de que os motores, as aeronaves e os sistemas de abastecimento sejam alterados. É uma enorme vantagem, se comparada a outras medidas voltadas à descarbonização, como a eletrificação, por exemplo.
Embora a tecnologia ainda esteja no início do seu desenvolvimento no Brasil, há consenso de que nosso país tem o potencial de se tornar um relevante fornecedor global de SAF.
Há diversas rotas de produção dos SAF, que têm um custo de produção superior ao do combustível fóssil. A que hoje tem maior viabilidade comercial é denominada HEFA – e utiliza ácidos graxos e ésteres hidroprocessados.
Outra rota relevante, a FT (Fischer-Tropsch), permite a produção do combustível utilizando-se hidrogênio verde, produzido a partir de eletrólise da água, sendo a energia elétrica para tanto obtida de fontes renováveis, especialmente solar e eólica. É o chamado eSAF. Ainda, a maior parte das rotas de produção tem como coproduto o diesel verde, obtido por fontes alternativas ao combustível fóssil.
Os chamados combustíveis avançados – como o SAF e o diesel verde – estão na vanguarda da transição energética. E o Brasil tem um potencial enorme nesse mercado. Segundo estudo do Instituto Interamericano de Cooperação para a Agricultura, o mercado de SAF deve atingir 449 bilhões de litros até 2050. A fins de comparação, a produção atingiu aproximadamente 300 milhões de litros em 2022.
Em abril de 2021, mapeamento da Roundtable on Sustainable Biomaterials (RSB) indicou que a capacidade do Brasil para produção desses combustíveis ultrapassava 12 bilhões de litros, cobrindo toda a demanda interna e com volume excedente para exportação. Porém, o Brasil carece de infraestrutura, especialmente de biorrefinarias, cuja instalação demanda investimentos altíssimos.
Atualmente, os SAF são regulados no Brasil pela Resolução ANP nº 856/2021, mas não há um marco legal dos combustíveis avançados, o que aumenta a insegurança jurídica e afasta investimentos. Existem diversos projetos de lei em trâmite nesse sentido. Os principais são o PL 528/2020, o PL 1.873/2021, o PL 3.314/2021, o PL 4.196/2023 e o PL 4.516/2023. Esse último é conhecido como Projeto de Lei do Combustível do Futuro, e se propõe a ser o marco legal do SAF, do diesel verde e da captura e estocagem de dióxido de carbono. Nenhum dos projetos, porém, se encontra em estágio avançado de tramitação.
Diante desse cenário, é crucial que seja dada prioridade à criação do respectivo marco legal, de modo a viabilizar o desenvolvimento dessa indústria. O Brasil tem tudo para liderar a transição energética mundial. Só é preciso avançarmos rápido nessas pautas legislativas para não “perdermos o bonde”.
Leonardo Dib Freire é advogado e head da área de Energia do RMMG Advogados