Inovação no controle dos GEE, com foco no flare
Opinião
Inovação no controle dos GEE, com foco no flare
A Bacia de Santos conseguiu reduzir suas emissões de metano em 2024, enquanto a Bacia de Campos, com produção menor, teve um salto para quase o dobro do ano anterior. Temos a oportunidade de monitorar emissões de metano da maior frota de FPSOs do mundo
Fruto da sua liderança na exploração e produção de hidrocarbonetos em águas profundas e ultraprofundas, o Brasil detém hoje a maior frota de FPSOs (Floating Production Storage and Offloading) em operação no mundo. Essa liderança global coloca o país em posição estratégica para desenvolver soluções inovadoras de monitoramento de emissões de metano, gás de efeito estufa com impacto climático 25 vezes superior ao dióxido de carbono.
Segundo dados da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), a produção média de petróleo em 2024 foi de 3,358 milhões de barris/dia e a de gás natural, de 153 milhões de metros cúbicos/dia, somando uma produção total de hidrocarbonetos de 4,322 milhões de barris de óleo equivalente por dia (boed).
O pré-sal responde por 76,7% desse volume, enquanto o pós-sal produz 16,33% do total do país. O restante é onshore. As duas maiores bacias produtoras, Santos e Campos, responderam por 76,92% e 20,30% da produção de petróleo, respectivamente, confirmando a curva ascendente do pré-sal nos últimos cinco anos e o declínio da Bacia de Campos.
Contudo, as emissões de gases de efeito estufa, incluindo metano, apresentam evolução bem diferente. A Bacia de Santos, com maior produção líquida, conseguiu reduzir suas emissões de metano em 2024 para 1,88 milhão de toneladas (MT), enquanto a Bacia de Campos, com produção menor, teve um salto para 27 MT, quase o dobro do ano anterior.
E a intensidade de metano nessa bacia aumentou de 0,38 para 0,74 tCH₄/mil tHC, indicando maior emissão por volume produzido. Isso pode estar relacionado a falhas operacionais, aumento de queima ineficiente ou eventos não planejados — exatamente os tipos de ocorrência que um sistema de monitoramento remoto poderia detectar e mitigar.


Apesar de um pico em 2023, a Bacia de Santos apresenta redução significativa em 2024 tanto na emissão absoluta quanto na intensidade de metano, o que sugere maior eficiência ou menor ocorrência de eventos fugitivos.
Já a Bacia de Campos apresenta um aumento expressivo em 2024, tanto na emissão total quanto na intensidade de metano, que quase dobrou em relação ao ano anterior, indicando maior liberação por volume produzido — o que pode estar relacionado a falhas operacionais, aumento de queima ineficiente ou eventos não planejados.

Esses dados reforçam a urgência no desenvolvimento de sistemas de monitoramento remoto com alta resolução para detectar emissões fugitivas e avaliar a eficiência de combustão dos flares, uma vez que a queima continua sendo recorrente e necessária para segurança operacional.
O problema é que, quando a combustão é incompleta ou o queimador está apagado, o metano é liberado diretamente na atmosfera, sendo os flares responsáveis por liberações pontuais de metano no planeta.
Estudos indicam que muitos desses equipamentos não mantêm eficiência igual ou superior a 98%, reforçando a urgência de medidas preditivas e corretivas.
Segundo o IPCC (2023), o potencial de aquecimento global do metano (CH4) é aproximadamente 80 vezes maior que o do CO2, para um período de 20 anos.
O Relatório Anual de Tecnologia e Meio Ambiente 2024 da ANP aponta que a mitigação das emissões de metano é um ‘alvo’ para a redução da concentração de GEE na atmosfera em um prazo mais curto.
Acho que cabe colocar o movimento de empresas e órgãos regulatórios para monitorar isso, como o OGMP 2.0, EPA e a ANP.
Medição complexa
A redução das emissões de metano é uma oportunidade. No entanto, quantificar essas emissões ainda é complexo. Elas frequentemente resultam de vazamentos não planejados, falhas de equipamentos ou manutenção inadequada. A variabilidade torna os métodos tradicionais pouco confiáveis.
As tecnologias de detecção evoluíram: inspeções manuais deram lugar a câmeras infravermelhas, detectores remotos a laser e sistemas de cavidade ressonante. Embora eficazes em ambientes controlados, essas soluções são sensíveis às condições ambientais e dependem de operadores. Tecnologias emergentes, como sistemas aerotransportados de espectroscopia a laser, ainda operam em intervalos limitados e não foram desenvolvidas para avaliar a eficiência da combustão em flares.
A queima em FPSOs é uma fonte significativa de metano, especialmente em regiões como o Brasil, a África Ocidental, a Austrália e o Mar do Norte, onde há forte concentração de FPSOs. No caso brasileiro, a escala da frota offshore torna o país importante protagonista na busca por soluções. O desenvolvimento de sistemas de monitoramento remoto com alta resolução espacial e temporal é estratégico. Uma solução desse tipo permitiria:
- Mitigar emissões fugitivas, reduzindo impacto ambiental.
- Aumentar confiabilidade operacional, evitando multas e paradas não programadas.
- Gerar mapas estatísticos confiáveis sobre desempenho dos queimadores.
- Alinhar o setor às políticas ambientais globais, fortalecendo a imagem do Brasil como produtor de energia de baixo carbono.
Para entender a relevância da frota brasileira, veja este comparativo, com números aproximados:
O Brasil lidera esse mercado com 55 FPSOs, seguido pela África Ocidental (30), Austrália (10) e Mar do Norte (8). Essa diferença mostra o peso estratégico do país e a necessidade de soluções próprias para monitoramento de emissões.
Estudos da Empresa de Pesquisa Energética (EPE) apontam que a descarbonização do setor passa por medidas como eletrificação de plataformas, captura e armazenamento de carbono (CCS) e monitoramento avançado de emissões.
Nesse contexto, o Brasil tem diante de si uma oportunidade única: transformar sua posição de maior operador de FPSOs em um laboratório vivo de inovação climática.
O desenvolvimento de sistemas robustos de monitoramento remoto não é apenas uma necessidade operacional, mas um passo essencial para garantir que a produção de petróleo e gás offshore esteja alinhada com a agenda global de combate ao aquecimento.
Tecnologias atuais e limitações:
- Câmeras infravermelhas detectam hidrocarbonetos, mas são sensíveis às condições ambientais.
- Detectores remotos a laser medem absorção de luz em volumes de gás, mas exigem operação contínua.
- Sistemas de cavidade ressonante são usados em automotivos e pouco adaptados ao ambiente offshore.
- Tecnologias emergentes como sistemas aerotransportados e imageamento a laser, são ainda restritos a pequenas distâncias e sem capacidade de avaliar eficiência de combustão.
A dificuldade de medir a eficiência de queima de forma direta nos flares é uma das principais motivação do projeto denominado FAMES, que embora esteja sendo desenvolvido com foco no flare das unidades offshore, poderá ser aplicado para fazer reconciliação de emissão em outras plantas industriais.
A iniciativa, que utiliza recursos da cláusula de PD&I, é mais uma demonstração de que podemos avançar em projetos de inovação aberta para acelerar a geração de soluções de ponta para a nossa indústria.



