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Captura de carbono é condição para o Net Zero do Brasil em 2050
MME considera necessário que o setor de Energia atinja o padrão de emissões negativas, adotando iniciativas de descarbonização e sequestro de carbono como Bioenergia e BECCS, CCS e CCUS

A captura de carbono deverá ganhar mais espaço entre as estratégias visando a descarbonização e transição energética no Brasil, diante de um cenário em que outras alternativas enfrentam dificuldades para se tornarem efetivas. Em suas apresentações realizadas recentemente no evento CCS Tech Summit, no Rio de Janeiro, o MME situou o desenvolvimento de projetos de captura de carbono entre as principais premissas para que o Brasil atinja o Net Zero em 2050.
“Não havíamos visto, até o momento, a captura de carbono figurar como um dos grandes protagonistas dessa estratégia de neutralidade climática. E isso ficou bem claro na exposição realizada no evento pelo MME e pela EPE”, disse Nathália Weber (foto), diretora da CCS Brasil.
Em sua apresentação, o MME mostrou que o fato de o Brasil possuir uma matriz energética com grande participação (49%) de fontes renováveis contribui para que o país apresente um perfil diferenciado nas emissões de gases de efeito estufa (GEE). No mundo todo, as fontes renováveis têm uma participação de apenas 15%. Em 2022, o setor energético brasileiro contribuiu com cerca de 1% das emissões globais de GEE, enquanto China, EUA, Índia, Rússia e Japão, juntos, foram responsáveis por quase 60% das emissões relacionadas à produção de energia.
Também de acordo com dados do MME, “o Brasil parte de uma realidade distinta no que se refere à contribuição setorial para as emissões de gases de efeito estufa (GEE): enquanto, no cenário global, o setor energético é o principal responsável, no Brasil, a maior parte das emissões está associada às mudanças no uso da terra, florestas e à agropecuária." Se no mundo todo a participação do setor energético nas emissões de GEE é de 66%, no Brasil é de 18%, segundo os dados do MME, que apontam para um protagonismo das mudanças no uso da terra, com participação de 48%.
Com base nesses dados, o MME considera como premissas para que o Brasil atinja o Net Zero em 2050: que o setor de usos da terra e florestas atinja um padrão de emissões negativas com o apoio do reflorestamento; que o setor de energia também obtenha emissões negativas, adotando iniciativas de descarbonização e sequestro de carbono como Bioenergia com Captura e Armazenamento de Carbono (BECCS), Captura e Armazenamento de Carbono (CCS) e Captura, Uso e Armazenamento de Carbono (CCUS); a redução das emissões no setor de transporte e o aproveitamento de resíduos para a produção de biogás e biometano.
A apresentação do MME dá grande destaque para a importância do desenvolvimento de projetos de Bioenergia com Captura e Armazenamento de Carbono (BECCS), que tem como efeito positivo entregar emissões negativas. Trata-se de uma prática que visa a captura do CO2 produzido pela queima de biomassa em projetos como as usinas de etanol de cana-de-açúcar e armazená-lo em locais seguros, como formações geológicas subterrâneas. Ao associar o fato de a biomassa absorver CO2 e a captura de carbono, se tem as emissões negativas.
Segundo as informações do MME, o Brasil apresenta um potencial fantástico para projetos de BECCS, que, além de tudo, oferecem baixo custo de captura. Atualmente, o Brasil conta com 357 plantas de etanol, que poderiam capturar aproximadamente 31 milhões de toneladas de CO2 por ano.
A apresentação do MME foi feita por Carlos Agenor Onofre Cabral, diretor do Departamento de Política de Exploração e Produção de Petróleo e Gás Natural do MME. Procurado, ele não atendeu ao pedido de entrevista até o fechamento dessa reportagem.
A apresentação da EPE, realizada por Heloisa Borges Esteves, diretora de Petróleo, Gás e Biocombustíveis da instituição, mostra que, segundo a plataforma Inova-e, foram realizados entre 2013 e 2023 investimentos em pesquisa e desenvolvimento relacionados a captura, transporte e armazenamento de carbono que somaram R$ 183 milhões. A EPE considera que as indústrias de biocombustíveis, biometano, papel e celulose e usinas de cana podem ser grandes investidoras em BECCS e proporcionar emissões líquidas negativas de CO2.
O órgão também acrescenta que o país conta com uma variedade de sítios de armazenamento permanente: campos depletados, reservatórios salinos e mineralização em basaltos são objeto de estudos em diferentes regiões e ampliam possibilidades de desenvolvimento de tecnologia, mão de obra e mercados.
Procurada, a EPE informou que “atualmente, todos os cenários energéticos de longo prazo, considerando os de diferentes instituições, apontam a atividade de CCS como estratégica para atingir o net zero. No mesmo sentido, a EPE, no planejamento energético, enxerga a CCS como parte integrante do mix tecnológico necessário para que o Brasil atinja seus objetivos de Net Zero, alinhando inovação tecnológica com as características únicas do nosso sistema energético e com a segurança energética do país”.
Protótipo para CCS na indústria
A startup DeCarb está desenvolvendo uma tecnologia com o objetivo de capturar o carbono diretamente de tubulações e chaminés industriais. O projeto, que vem sendo desenvolvido em parceria com o Instituto Senai de Inovação em Biomassa (ISI Biomassa) e com a mineradora Anglo American, encontra-se em fase de prototipagem. A expectativa é oferecer a tecnologia para empresas dos segmentos de mineração, siderurgia, petroquímicas, alumínio e metalúrgicas.
“A nossa previsão é podermos contar com um protótipo em um prazo de dois anos”, previu Flávio Costa (foto), um dos sócios fundadores da startup. A DeCarb é uma spin-off da Recicli, cujas atividades são focadas em tecnologias de sustentabilidade ambiental, resultantes de pesquisas científicas que recebem o apoio do CNPQ desde 2005.
A DeCarb participou, em 2021, de um programa de inovação da Federação de Indústrias de Minas Gerais, o FIEMG Lab 4.0, no qual se desenvolveu uma prova de conceito da tecnologia que permitiu validar a capacidade de captura de CO2 do sistema. Os resultados foram a captura de 99,3% de CO2.
O projeto atraiu a atenção da Anglo American, que passou a participar do desenvolvimento das pesquisas. A mineradora aportou, inicialmente, R$ 27.500 na fase de prova de conceito. E, mais tarde, realizou um novo aporte, de R$ 3 milhões.
Segundo informações da empresa, a tecnologia em desenvolvimento pela DeCarb utiliza “um componente específico de um resíduo orgânico, de elevado quantitativo de descarte no Brasil, evitando a poluição ambiental que é gerada pela decomposição deste resíduo, e evitando também a liberação de metano resultante de sua degradação”. O resíduo, que não foi revelado, é a matéria-prima para o material de captura do protótipo que está sendo desenvolvido.
Protótipo da startup DeCarb, para capturar o carbono diretamente de tubulações e chaminés industriais, com capacidade de até 170 mil toneladas de CO2 por ano, deve estar pronto em dois anos
Segundo Costa, o uso desse resíduo é um diferencial em relação a outras iniciativas que vêm sendo desenvolvidas ao redor do planeta, como o uso de aminas, um material tóxico. Ele acrescenta que, por questões contratuais, a DeCarb não revela detalhes do projeto. Outro diferencial é o fato de a captura ocorrer dentro de chaminés e dutos. “Fazemos uma captura preventiva, evitando que o CO2 se disperse na atmosfera”, diz ele.
A expectativa é que o protótipo em desenvolvimento apresente um potencial para a captura de até 170 mil toneladas de CO2 por ano. Costa acrescenta que a expectativa é produzir equipamentos de acordo com as necessidades das empresas, o que permitirá que apresentem diferentes capacidades de captura de carbono.
A DeCarb está iniciando uma nova fase de pesquisas com o objetivo de desenvolver produtos a partir do carbono capturado. Costa considera que a opção de reinjetar o CO2 na terra apresenta riscos, citando casos em que somente 30% do carbono capturado e injetado permaneceu no solo. “A expectativa é conseguir isolar o carbono do CO2 e gerar carbono sintético cristalino, que é a matéria-prima para grafite, diamantes industriais e brocas usadas por dentistas, por exemplo”, disse ele.
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