Dedicada à produção de biodiesel, a Binatural decidiu, no ano passado, trocar parte da lenha de eucalipto usada no aquecimento de caldeiras na unidade de Simões Filho, no sul da Bahia, por um produto típico da região: o coco da piaçava. A mudança de uma biomassa para outra se deu sem redução de eficiência e agregou o estímulo à agricultura familiar local aos benefícios ambientais proporcionados pela produção do biodiesel.

Para obter a nova fonte de biomassa, a Binatural firmou um contrato com a Cooperativa dos Agricultores Familiares do Baixo Sul (Coopafbasul), que reúne pequenos agricultores, assentados da reforma agrária e quilombolas do Sul da Bahia. Pelo contrato, a empresa desembolsa R$ 512 mil por ano pela aquisição de 200 toneladas anuais de coco de piaçava, proporcionando renda para os agricultores da região, segundo o CEO da Binatural, André de Lavor (Foto). “O preço é calculado a partir do volume fornecido, o que garante remuneração justa e previsível para as famílias produtoras.”

O coco de piaçava apresentou alto poder calorífico nos testes realizados, com redução de custos em relação à lenha, mas a empresa aguarda finalizar o atual contrato com a cooperativa para ter melhor definição da economia obtida.

Outro diferencial da iniciativa é o fortalecimento da economia circular. São utilizados no transporte da biomassa sacos de juta confeccionados pela própria cooperativa, o que agrega valor à cadeia produtiva.

Lavor explica que a ideia de utilizar o coco de piaçava surgiu de conversas com as comunidades de agricultores familiares. “Embora já houvesse estudos acadêmicos sobre o potencial energético do coco da piaçava, não havia registros de uso em escala industrial no Brasil”.

A Binatural destaca que as famílias ligadas à Coopafbasul realizam o cultivo da piaçava observando práticas agroecológicas que permitem o uso sustentável dos recursos naturais da Mata Atlântica. Entre as técnicas aplicadas, destacam-se sistemas agroflorestais, que preveem a integração de árvores e cultivos. A produção local excede a demanda regional e a empresa tem absorvido esse excedente, assegurando que nenhum produto seja descartado. 

Fábrica da Binatural em Simões Filho (BA): mudança da lenha de eucalipto para coco da piaçava para aquecer as caldeiras da unidade agregou estímulo à agricultura familiar (Foto: Divulgação/Binatural)

A empresa conta atualmente, em suas unidades de Simões Filho e na de Formosa (GO), com uma capacidade de produção de 600 milhões de litros de biodiesel. A companhia utiliza na produção do combustível óleos de soja, de palma e de algodão, além de óleo de cozinha usado e gordura animal.

Segundo dados obtidos na empresa, já foram produzidos desde 2006, quando iniciou suas operações, 2,4 bilhões de litros de biodiesel, o suficiente para evitar a emissão de 7,48 milhões de toneladas de CO₂, o que equivale ao plantio de mais de 52 milhões de árvores.

Dos ‘masbahas’ à queima, o coco da piaçava é fonte renda para pequenos agricultores

O uso do coco da piaçava como insumo para a geração de calor pela Binatural abre uma nova frente de negócios para a Cooperativa dos Agricultores Familiares do Baixo Sul (Coopafbasul), que produz um leque diversificado de produtos agrícolas in natura e industrializados. A parceria com a fabricante de biodiesel teve início no ano passado, segundo o diretor-executivo da Coopafbasul, Gileno Araújo dos Santos.

Acordo da Binatural com Coopafbasul envolve 150 famílias na produção do coco da piaçava e inclui assistência técnica aos cooperados (Foto: Divulgação/SDR-BA)

Atualmente, 150 famílias se dedicam à produção do coco da piaçava para a Binatural. A cooperativa produz atualmente cerca 350 toneladas de coco da piaçava por ano. As famílias cuidam da colheita, retirada da casca e separação dos cocos bons dos inutilizáveis, processos que envolvem trabalho manual. Para algumas famílias, o cultivo e manejo do coco de piaçava é a única fonte de renda.

Santos destaca que o acordo com a Binatural envolve, além da compra do coco, a assistência técnica da companhia aos cooperados. “Essa parceria proporcionou um preço justo para a produção e possibilitou assistência técnica direta e acessível para um número significativo de cooperados.”

Outras 400 famílias são beneficiadas indiretamente pela atividade, atuando no transporte, armazenamento, suporte técnico e envio do produto final à Binatural. “A produção do coco da piaçava gera um impacto socioeconômico significativo nas comunidades locais, proporcionando renda para um número considerável de famílias.”

Parte dos recursos obtidos pela comercialização do produto é destinada pela cooperativa para iniciativas voltadas para comunidades carentes da região, como construção de parques de diversões. Neste ano, a Coopafbasul passou a fornecer também café e açaí para a Binatural, que são consumidos nos refeitórios da empresa.

Coopafbasul exportou 228 toneladas do coco de piaçava para o Egito em 2023 (Foto: Divulgação/SDR-BA)

A piaçava está no rol de atividades dos cooperados desde o início das atividades da Coopafbasul: em 2010, a cooperativa criou um programa específico para essa atividade, envolvendo a construção de seis unidades de beneficiamento e a produção de vassouras. Mais recentemente, a Coopafbasul encontrou um nicho diferenciado para o coco da piaçava: a produção do ‘masbaha’, como são chamados os terços islâmicos, usados nas preces dos muçulmanos. O ornamento religioso é exportado para Egito, Turquia e Indonésia.

Criada em 2009 por 20 famílias de assentados da reforma agrária, quilombolas e pequenos agricultores do Baixo Sul da Bahia, a Coopafbasul conta atualmente com cerca de 3 mil cooperados. As famílias ligadas à cooperativa se dedicam a um conjunto de atividades, como a produção de cacau, cravo, fruticultura, pupunha, urucum e piaçava.

A Coopafbasul também comercializa produtos industrializados, como a popa de 19 tipos diferentes de frutas, sorvetes de açaí, guaraná em pó, granulado escuro brasileiro – um tipo específico de borracha natural beneficiada, utilizada na fabricação de pneus e outros produtos industriais – e óleo essencial e hidrolato de cravo.