Tecnologias trazem eficiência e estabilidade à transmissão

Numa pequena solenidade em setembro do ano passado, que marcou a aprovação de um pedido da Isa à Aneel, o diretor-geral da agência, Sandoval Feitosa, fez questão de destacar: “A agenda da Aneel é de modernização, digitalização e utilização de novas tecnologias e por isso a importância da autorização para que a Isa instale dispositivos Facts, com base na nova tecnologia SSSC, para controle de fluxo de potência, ação pioneira no país. Temos a convicção de que essa nova tecnologia permitirá uma otimização do sistema de transmissão, com postergação de investimentos, menor custo global de alternativas e possibilidade de uso dos equipamentos em outras localidades do sistema”.

De fato, os sistemas de transmissão de corrente alternada flexíveis (Facts) têm um nome longo, mas um objetivo fácil de entender: trata-se de um conjunto de tecnologias que podem aumentar a capacidade da rede, assegurar a estabilidade do sistema e ainda trazer maior confiabilidade. E para entender melhor o que essas novas tecnologias oferecem como vantagens, a Brasil Energia ouviu dois especialistas no tema, um da Isa, outro da Siemens Energy.

Para Renato Guimarães (foto), coordenador de Planejamento da Expansão e Estudos da ISA Energia, a aplicação dos Facts favorece principalmente o ONS e uma gestão mais afinada do grid nacional. 

Na conversa com a Brasil Energia, Guimarães revelou que, numa primeira etapa, o uso dos Facts foi o recurso escolhido para atender uma demanda temporária na SE Ribeirão Preto, em São Paulo, com prazo de ativação até o primeiro semestre desse ano. Os dispositivos vão atender uma necessidade emergencial da região, em especial a demanda industrial por energia, enquanto a concessionária executa obras de reforço nas LTs.

Numa segunda fase, em 2027, os equipamentos ficarão permanentes nas subestações de Votuporanga e São José do Rio Preto, evitando obras adicionais em linhas de transmissão, poupando novos investimentos. Os dois casos, segundo Guimarães, colocam o Brasil em linha com práticas internacionais modernas em gestão do sistema elétrico.

SE Ribeirão Preto: uso do Facts vai atender demanda temporária, para atender necessidade emergencial da região enquanto a concessionária executa obras de reforço nas LTs (Foto: Grupo CPFL)

A modalidade adotada pela Isa é o compensador estático síncrono série modular e vai permitir o redirecionamento do fluxo de energia de circuitos sobrecarregados para outros ociosos, otimizando o aproveitamento do sistema elétrico. A aplicação é pioneira no Brasil e foi planejada com a EPE e ONS.  Sua aplicação envolve investimentos de R$ 75 milhões em Ribeirão Preto e outros R$ 15 milhões para o transporte e ativação nas duas outras cidades paulistas.

Na subestação São José do Rio Preto os equipamentos Facts ficarão permanentes a partir de 2027 (Foto: Grupo CPFL)

Transição energética com novas renováveis

Tecnicamente, os Facts atuam pela combinação de eletrônica de potência, controladores estáticos e equipamentos convencionais, como explica Filipe Formiga (foto), diretor da área de Grid Solutions da Siemens Energy. “São soluções que fornecem a adaptabilidade e flexibilidade necessárias aos sistemas para atuar em momentos críticos imprevisíveis como distúrbios, falhas e faltas”, resume.

Para ele, os Facts são uma solução ideal ainda para a o alcance de metas em transição energética, ao permitirem a potencialização de diferentes tipos de geração de energia, alinhados com a melhoria do desempenho e adaptabilidade da rede de transmissão. E podem ser aplicados em escala industrial.

Na prática, o especialista destaca que a tecnologia também ajuda na melhoria da qualidade de energia, do fator de potência e da redução de desbalanços, além de aumentar a inércia e a flexibilidade de operação. “O mais importante é que os ganhos vão além dos benefícios para as transmissoras, sendo direcionados para o sistema de transmissão com um todo, levando a um cenário mais confiável e estável”, disse, reforçando o argumento usado por Guimarães, da Isa.  

Formiga cita dois exemplos de aplicações recentes no Brasil. O primeiro é o da Taesa, que adquiriu três unidades de bancos de capacitores série, um dos tipos de Facts, para modernização de seus ativos. O segundo exemplo é da Eletrobras, que também atuou na troca de bancos série de compensação reativa para a linha que interliga Itaipu aos estados de São Paulo e Paraná.

Ele lembra que, no Brasil, as tecnologias têm sido aplicadas em pontos-chave do sistema por meio de leilões e iniciativas de reforços e melhorias na transmissão. Outro uso acontece na área de geração, predominantemente renovável, para melhorar o desempenho das concessionárias. Nesse último caso, as contratações são feitas diretamente pelas geradoras.

Taesa adquiriu três unidades de bancos de capacitores série, um dos tipos de Facts, para modernização de seus ativos (Foto: Divulgação)

O uso mais recente dos Facts aconteceu numa área que interessa muito ao Brasil: a integração das novas renováveis, ou seja, a geração solar e eólica, ao grid. Explicando: à medida que a energia de fontes renováveis substitue a geração síncrona convencional, a frequência da rede fica mais sensível. Recursos dos Facts podem emular a inércia do sistema, o que contribui para estabilizar a rede.

Além da transmissão, os Facts podem ser aplicados na indústria. É o caso de grandes fábricas, como siderúrgicas com fornos elétricos a arco, que utilizam o recurso para estabilizar o barramento de média tensão. Segundo Formiga, a aplicação traz estabilidade para a produção do aço, assim como economia de eletrodo do forno. Esse mesmo princípio pode ser aplicado à produção de minérios e metais, entre outros processos.