Terceirização na distribuição precisa ser profissionalizada

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Terceirização na distribuição precisa ser profissionalizada

Renovação das concessões deveria trazer novos modelo de contratos e gestão mais eficiente das empreiteiras do segmento. O outsourcing na Distribuição continua elevado e pode explicar mortes e falhas

Por Nelson Valencio

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Sistemas de logística e armazenamento de materiais terceirizados já estão consolidados para atender as distribuidoras (Foto: Divulgação/Grupo Emtel)

O conhecimento técnico das redes de distribuição está mais concentrado nas empresas terceirizadas do que nas concessionárias, afirma Alexandre Marques (foto), consultor especialista no tema nesta conversa com a Brasil Energia. Segundo ele, a contratação de terceiros especializados é uma ferramenta estratégica para o setor, mas essa profissionalização esbarra em dois desafios: a gestão inadequada e contratos mal elaborados, que resultam em precificação inadequada. Alexandre Marques, consultor especializado em terceirização

Marques destaca que o chamado outsourcing ganhou grande impulso entre 2003 e 2014, quando o número de profissionais próprios das distribuidoras, segundo ele, caiu da média de 71% para 42%, percentual que teria se mantido nos últimos anos.

Apesar da evolução positiva, a relação entre concessionárias e suas parceiras precisa ser melhorada. O consultor ressalva que a solução não é reverter o processo, mas gerenciá-lo de forma mais inteligente, mantendo parcerias com empresas que possuem o conhecimento técnico específico.

Ele traz dois dados que ilustram um cenário que precisa ser corrigido: segurança do trabalho no setor e diferença salarial.

No primeiro caso, Marques explica que 84,6% das mortes ocorrem entre os trabalhadores terceirizados. “Isso sugere que os investimentos em segurança e treinamento para essa força de trabalho podem melhorar”.

“Obviamente, esse número também está relacionado à proporcionalidade da força de trabalho terceirizada nas operações”, argumenta. Segundo ele, em contextos de maior primarização, ou seja, quando as atividades passam a ser executadas majoritariamente por empregados próprios, é comum que esses indicadores se revertam. “Isso reflete a mudança na composição da mão de obra e, muitas vezes, um controle direto sobre as práticas de segurança”.

Sobre a remuneração diferenciada, Marques avalia que os terceirizados, em média, recebem 4,5% a menos do que funcionários contratados pelas concessionárias. “Este diferencial é atribuído a uma metodologia contratual que não valoriza adequadamente a qualidade da mão de obra”, explica.

Com a renovação das concessões de distribuição, o especialista acredita que é o momento de o setor mudar esse relacionamento. As mudanças devem começar pela metodologia contratual, valorizando a qualidade sobre o custo imediato. Empresas que investem em treinamento, equipamentos de segurança e melhores condições trabalhistas devem ser valorizadas no processo de seleção e não penalizadas.

CPFL e Neoenergia como exemplos

“Os novos contratos devem focar em critérios de avaliação multidimensionais, que considerem não apenas o preço, mas também a qualidade técnica, experiência, condições trabalhistas e sustentabilidade financeira das empresas terceirizadas”, detalha.

Em relação à gestão, o consultor avalia que é importante sofisticar esse processo para ter resultados superiores. A jornada inclui a adoção de sistemas de monitoramento da qualidade, programas de capacitação para terceirizadas e critérios contratuais que valorizam a qualidade.

O especialista lembra que o mercado já tem práticas bem-sucedidas como as iniciativas da CPFL e da Neonergia, por exemplo.

“A CPFL tem um modelo híbrido bem estruturado e já foi premiada, mostrando que é possível conciliar terceirização com excelência operacional e alto padrão de qualidade”, comenta. “A Neoenergia fez uma internalização inteligente, mas mantém um nível de terceirização alto para atividades que exigem conhecimento técnico específico”, complementa.

Os dois exemplos contrastam com casos recentes de terceirizadas que deixaram de operar em função do desalinhamento contratual.

Eletricistas da CPFL em ação

CPFL usa modelo híbrido já premiado e oferece cursos gratuitos de capacitação de eletricistas (Foto: Divulgação/CPFL

Marques cita a Potência Medições, que entrou em recuperação judicial (RJ) em 2022. De acordo com ele, trata-se de um exemplo de como contratos mal elaborados podem levar empresas tecnicamente competentes à falência. “Não foi um problema de capacidade técnica, mas sim de insustentabilidade financeira dos acordos”, argumenta.

Outro caso conhecido envolveu o Grupo Floripark, de Santa Catarina, que pediu a RJ em 2023, com várias empresas especializadas no setor.

Um terceiro exemplo, conhecido no setor, mas que ele prefere não nomear, aconteceu no Sul do país, não chegou à etapa de recuperação judicial, mas envolveu atraso nos salários, em função da pressão por custos.

“O histórico recente mostra que, ao invés de ser vista como vilã da qualidade, a terceirização, quando bem gerenciada e baseada em critérios de qualidade, pode ser uma ferramenta poderosa para melhorar a eficiência e a qualidade dos serviços no setor elétrico. O problema não reside na terceirização em si, mas na forma como ela é conduzida e na sofisticação da gestão aplicada”, resume Marques.

Modelo de terceirização consolidada

Nas áreas de logística e transporte, a terceirização já seria um modelo consolidado, mesmo nas distribuidoras que ainda têm participação pública. Essa é a avaliação de Luciano Miranda (foto), CEO do Grupo Emtel.

Luciano Miranda, do grupo Emtel

Em conversa com a Brasil Energia, ele destacou que desde a privatização do setor as concessionárias investiram mais em locação – que é quase total para veículos leves – e cresce mesmo no caso de equipamentos pesados, inclusive no setor de transmissão.

 “Elas não têm estrutura, interesse ou consideram caro manter frota própria. Preferem ter um fornecedor que gerencie a frota por uma cobrança mensal, evitando investir em ativos que depreciam no balanço”, resume. “As grandes concessionárias, como a Cemig, compram caminhões grandes para uso em emergências ou trabalhos mais especializados, pois a Aneel considera e remunera esses investimentos”, complementa.

O aumento da terceirização de frota entre as empreiteiras que atendem o setor também é uma realidade, com mais intensidade entre aquelas que adotam a contabilização por lucro real, uma vez que podem deduzir 100% do valor da locação no imposto de renda.

Frota terceirizada do Grupo Emtel

A terceirização de frota entre as empreiteiras que atendem o setor é mais utilizada entre aquelas que adotam a contabilização por lucro real, uma vez que podem deduzir 100% do valor da locação no imposto de renda (Foto: Divulgação/Grupo Emtel)

No caso da logística e armazenamento de materiais para atender as concessionárias, Miranda destaca que o processo está ainda mais consolidado.

Distribuidoras como Light, EDP e Cemig estão entre as usuárias de um sistema onde o recebimento, armazenamento e gerenciamento de insumos é feito por um parceiro terceiro. Esse último é quem entrega os materiais em campo para as empreiteiras.

Cabe às concessionárias realizar a gestão dos pedidos e determinar o que será enviado para as empreiteiras. Nesse processo elas usam seus ERPs, softwares de planejamento de uso de recursos, para manter a comunicação e organizar o cruzamento de informações.

“A maioria das concessionárias terceiriza totalmente essa parte da logística, sendo muito raro que mantenham essa base logística internamente”, finaliza Miranda.

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