Adiamento de LRCap e o risco sistêmico do setor elétrico

Revista Brasil Energia | Termelétricas e Segurança Energética

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Adiamento de LRCap e o risco sistêmico do setor elétrico

A decisão do MME de suspender o LRCAP 2025 provocou, além da frustração de receitas para empreendedores que haviam relacionado seus projetos no certame, uma ampliação do risco sistêmico do setor elétrico

Por Eugênio Melloni

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Obras de rede para atender a UTE Trombudo Central (28 MW), primeiro projeto térmico a ser atendido pela SCGás, programado para operar comercialmente em julho de 2026 (Foto: Divulgação)

Em 2025 os projetos de termelétricas descontratadas deverão atingir uma capacidade conjunta de 8.589 MW, considerando-se usinas a gás natural, óleo combustível, óleo diesel e carvão. A expectativa era de que muitos desses projetos conquistassem contratos no certame. Os cálculos são da Thymos Energia.

A descontratação das termelétricas, cuja principal característica é a garantia de energia firme ao sistema elétrico, ocorre justamente quando o ONS enfrenta dificuldades para administrar uma maior complexidade operacional proporcionada pela expansão das fontes eólica e solar.

À Brasil Energia, o CEO da Thymos, João Carlos Mello (foto), lembrou que a recontratação das termelétricas vem sendo adiada desde 2021, quando foi realizado o primeiro LRCap. No certame, foram contratados 4.632 MW de potência disponível em projetos de usinas termelétricas para início de fornecimento em julho de 2026.

Levantamento da consultoria aponta que as termelétricas em contratos com expiração prevista até 2028 somam 14.219 MW. “Estamos vivendo um problema real de segurança energética”, disse Mello, para quem é um indicador desta situação a recomendação do CMSE, feita em maio, para a antecipação do início do suprimento das termelétricas contratadas no LRCAP 2021. 

Ao anunciar em abril a suspensão do LRCap 2025, o MME anunciou que a medida foi consequência de disputa judicial travada entre grupos envolvidos no certame. Estavam cadastrados para participação no leilão 327 projetos de geração, somando mais de 74 MW de capacidade total, segundo a EPE.  Desse total, 67% eram projetos de termelétricas novas, 30% de existentes e 3% de ampliações de hidrelétricas. 

SCGás tem sete negociações interrompidas

O cancelamento foi um balde de água fria nas negociações que a SCGas, distribuidora de gás catarinense, vinha tocando desde o início do ano com empreendedores interessados em implantar usinas a gás no estado. As termelétricas, se saíssem vencedoras do certame, poderiam mais que quadruplicar a atual demanda por GN junto à distribuidora.

Rafael Nicollazzi (foto), gerente Comercial, Industrial e Veicular da SCGás, informou que no início do ano a companhia foi procurada por empresas responsáveis por dez projetos de térmicas a gás, interessadas em se cadastrar no LRCap 2025. Os projetos representariam um incremento da oferta de potência ao estado de 1.100 MW.

Para a SCGás, esses projetos de termelétricas representariam uma demanda por 7,5 MM m3/dia de GN, inaugurando o segmento de termelétricas entre os clientes das distribuidoras. Atualmente, a companhia distribui 1,6 MM m3/dia.

Com o cancelamento do leilão, as negociações foram interrompidas. Com a confirmação de realização do LRCap 2026, os empreendedores de dois dos projetos voltaram à mesa de negociações.  Juntos, os projetos somam 193 MW de potência instalada e poderão consumir 1,3 milhão de m³/dia, caso conquistem a contratação de energia no certame.

A Região Sul não é autossuficiente em suprimento energético e projetos termelétricos são alternativas para mitigar riscos no suprimento, especialmente em decorrência dos efeitos das mudanças climáticas. Santa Catarina conta com 5.096 MW de potência instalada, dos quais 2.758 MW são de 12 hidrelétricas (54,1% da capacidade total). Da matriz catarinense, 1.119 MW são gerados por 125 hidrelétricas (21,9%), 678,6 MW são de 61 PCHs (13,3%), 265,8 MW vem de 192 CGHs (5,2%), 250,5 MW são de eólicas (4,9%) e 23,4 MW de fotovoltaicas (0,4%).

Entre os projetos que aguardam definições nas regras do próximo LRCap está a UTE Norte Catarinense, de 450 MW, projeto da Al Mas, joint venture entre a Diamante Geração de Energia e a Nebras Power, empresa internacional de investimentos em energia e subsidiária da Qatar Electricity & Water Company (QWEC). Se forem vencedores do leilão, os empreendedores prometem erguer a usina em três anos, em terreno já adquirido em Garuva (SC), com demanda prevista de 2,5 milhões de m3/dia.  O empreendimento prevê o abastecimento via Gasbol.

Enquanto aguarda o LRCap 26, a SCGás está se preparando para atender ao primeiro projeto de termelétrica no estado: a UTE Trombudo Central, com 28 MW, já em construção e programada para operar comercialmente em julho de 2026. A distribuidora iniciou em setembro as obras da rede para suprir a termelétrica.

Trombudo Central, empreendimento vencedor no LRFCap 2021, está sendo construída no município homônimo pela Beta Produtora de Energia SPE, ao custo de R$ 72 milhões. 

“Vimos que o sistema elétrico necessitaria de fontes termelétricas com potência firme para despacho pelo ONS e que a rede de distribuição de gás natural próxima tem capacidade de atendimento ao projeto termelétrico”, destacou Luciano Quadros, sócio da Beta. “O projeto abrirá caminho para novos empreendimentos a gás, para atender a carga de ponta (18 às 21 horas), quando o consumo de energia aumenta e a geração solar é nula”.

Ramal de alta capacidade para atender UTE Trombudo terá 1,45 km e poderá escoar gás a partir do Gasbol ou do terminal de GNL de Babitonga, da NFE (Foto: Divulgação)

Para atender seu primeiro cliente na categoria geração de energia, a SCGás iniciou a construção de um ramal de 1,45 km de alta capacidade, já que a UTE deverá consumir de início 70 mil m3/dia e tem previsão de dobrar essa demanda quando em plena operação. A obra compromete investimentos de R$ 2,6 milhões e a expectativa é que o gás já estará disponível para início de testes no primeiro trimestre de 2026.

A molécula do gás virá, em princípio, do Gasbol, mas a SCGás informou que o cliente também conta com a possibilidade de receber GNL do terminal de Babitonga, da NFE. 

Mudanças no LRCap 2026 leva Binatural a suspender investimentos

O anúncio de que os projetos de termelétricas movidas a biocombustíveis não entrariam no LRCap 2026 levou a produtora de biodiesel Binatural a postergar o projeto de uma nova planta, que produziria 540 milhões de litros para atender a uma usina termelétrica no Nordeste. Com a decisão, foram suspensos investimentos previstos de cerca de R$ 500 milhões.

O projeto, segundo a Binatural, atenderia ao primeiro complexo termelétrico sustentável do Brasil. A Binatural não revelou a empresa com a qual vinha negociando, nem o projeto que atenderia. Com o atendimento a esse projeto, a Binatural, que conta com duas plantas, uma em Formosa (GO) e outra em Simões Filho (BA), quase duplicaria a sua produção atual, de 600 milhões de litros.

O MME informou que as mudanças foram propostas para oferecer maior flexibilidade operacional ao sistema elétrico, estimular a competição entre as diferentes fontes incluídas no planejamento do certame e, consequentemente, trazer maior benefício ao consumidor

“Seguimos acompanhando atentamente as discussões do setor e iremos avaliar as condições de mercado e regulatórias para decidir sobre a retomada do projeto e de novos investimentos” afirmou André de Lavor (foto), CEO da Binatural.

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* Leilão de Reserva de Capacidade na forma de Potência

**Comitê de Monitoramento do Setor Elétrico

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