Opinião

Uma agenda positiva para a energia eólica

Expandir a matriz elétrica brasileira priorizando as fonte hidrelétrica, solar, biomassa e eólica é estratégia correta e benéfica em termos econômico, social e ambiental para o país, para o presente e para o futuro.

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A forte expansão da eólica nos últimos anos, no Brasil e no mundo, é um caso de sucesso digno de destaque. Uma ótima resposta ao combate às mudanças climáticas, que se destaca pela inovação e redução de custos de geração.Vamos ao racional que justifica essa expansão no contexto Brasileiro.

  • A geração eólica está cada vez mais barata

Desde o ano 2000 foram instalados cerca de 500 GW de energia eólica no mundo, correspondendo a uma geração renovável de mais de 1000 TWh em 2017 (Figura 1). O custo médio da geração eólica caiu de 0,14 USD/kWh no ano 2000 para 0,06 USD/kWh em 2017 (IRENA, 2018a), cerca de 60%. O Brasil está entre os top 10 no mundo e atualmente já foram instalados mais de 14 GW, ou 9% da capacidade instalada total (~160 GW), e nos últimos leilões projetos chegaram a ser contratados por 0,02 USD/kWh (R$68/MWh), uma queda de aproximadamente 50% em relação ao ano 2009 (Figura 2). Atualmente a fonte eólica apresenta preços bastante competitivos, no mundo e no Brasil – globalmente, a faixa de custos da geração com combustíveis fósseis fica entre 0,05 e 0,17 USD/kWh (IRENA, 2018a) (Figura 3).

Figura 1 - Energia Eólica no Mundo

Capacidade Instalada (GW)

Fonte: estatísticas de energia renovável da IRENA disponíveis em www.irena.org.

Fonte: elaboração própria baseada em dados da CCEE

Figura 3 - Custos médios globais de geração de eletricidade (2010-2017)
e ABEEólica.

Fonte: IRENA (2018a)

  • No Brasil, o recurso renovável é abundante e competitivo

Estima-se que o potencial técnico da fonte eólica no mundo ultrapasse os 32.000 GW. No Brasil o potencial on-shore está estimado em mais de 300 GW (EPE, 2018), valor várias vezes mais do que suficiente para a expansão do consumo até 2050. Está localizado em grande parte no Nordeste, onde a qualidade dos ventos permite fatores de capacidade que superam 45%, enquanto a média mundial está em torno de 30%. Os ventos do Brasil estão de fato entre os melhores do mundo, uma enorme vantagem comparativa (Figura 4).

Figura 4 – Média ponderada dos Fatores de Capacidade para Eólica em países selecionados, 2010 e 2016

Fonte: IRENA (2018a)

  • Diversificação renovável da matriz energética e aumento da segurança de suprimento

O aumento de expansão da geração eólica também favorece uma distribuição mais equilibrada entre as diferentes fontes de geração renováveis. Desta maneira contribui para a segurança de suprimento ao adicionar à matriz uma outra fonte primária de energia. O aumento de fontes renováveis variáveis ao longo do tempo exige que se adeque a flexibility e adequacy do sistema elétrico. As soluções tecnológicas para isso já existem, e aqui, mais uma vez, o Brasil apresenta uma vantagem comparativa, como explicado a seguir.

  • A configuração física do sistema elétrico nacional é apropriada para expansão de renováveis

Enquanto países com grandes territórios (USA, China) ou regiões (Europa, Sudeste Asiático) estão em processo de aumento da integração e reforço de conexão de seus sistemas elétricos, com o objetivo de otimizar o aproveitamento renovável disponível em diferentes partes do território, o Brasil em grande parte já fez seu dever de casa e o atual SIN permite intercâmbio entre os subsistemas em praticamente todo território nacional. E os reservatórios funcionam como um estoque potencial de energia, como uma grande bateria, que pode ser carregada por energia eólica quando disponível e suprir energia renovável no caso de ausência de geração eólica. Assim, a expansão de geração eólica tem alicerce nos projetos hidráulicos e na atual configuração física do SIN (IRENA, 2016). Vale ressaltar os recordes de participação de geração eólica no atendimento ao Nordeste, que recentemente chegaram a superar 70% da carga local, com fator de capacidade de mais de 75% (ABEEólica, 2018).

  • A tendência de eletrificação crescente da economia é ótima oportunidade para expansão dos benefícios da geração renovável

Há uma tendência observada no mundo e no Brasil de aumento da eletrificação da matriz energética. Isto decorre da perspectiva de expansão de consumo na indústria e ao aumento de eletroeletrônicos nas residências, comércio e serviços, ou seja, aumento do conforto e bem estar, especialmente térmico, assim como ao aumento da penetração de veículos elétricos. No caso brasileiro, por exemplo, há perspectiva de forte crescimento do consumo per-capita de eletricidade (2,5 MWh/capita para 7 MWh/capita até 2050), o que nos aproximaria de países europeus como França (8,7 MWh/capita) e Alemanha (7,9 MWh/capita). Elevar a eletrificação é uma oportunidade para o país melhorar sua eficiência energética, ao mesmo tempo em que pode aumentar, assim, a participação das energias renováveis e manter-se na liderança mundial, de maneira competitiva. A participação atual de renováveis na matriz energética é de cerca de 45% (EPE, 2017). O Brasil é parte de um seleto grupo no mundo em termos de renovabilidade de sua matriz energética, estando muito acima da média global de cerca de 14% (IEA statistics, 2016). Na medida em que os demais países avançam, o Brasil também pode aumentar ainda mais a renovabilidade da matriz, elevando também nossa competitividade.

  • As renováveis permitem a redução de consumo de combustíveis fósseis, e beneficiam a sociedade através da diminuição da poluição, da importação e do risco de stranded assets.

A estratégia de expansão de renováveis, como a eólica, ao minimizar o consumo de combustíveis fósseis, de um lado, impacta positivamente a balança comercial ao reduzir as importações (no ano de 2017 as importações de gás natural e derivados no país foram de cerca de 15 bilhões de US$, segundo Anuário Estatístico da ANP 2018, tabela 2.58 e gráfico 2.25), enquanto reduz os custos associados à saúde e aos impactos diretos da poluição na manutenção das cidades (IRENA, 2018b). Outro aspecto, pouco mencionado no país, diz respeito ao conceito de stranded assets. Ao não aprodundarmos uma estratégia renovável estamos aumentando a exposição ao risco em investimentos que potencialmente, no futuro, podem levar à perda de valor nos seus ativos por estarem associados a combustíveis fósseis. Tipicamente, isso poderia acontecer caso sejam adotadas estratégias que priorizem geração a partir de combustíveis fósseis na base em detrimento de soluções renováveis (IRENA, 2017a).

  • A energia eólica contribui positivamente com o desenvilvimento econômico, através de geração de emprego qualificado e renda, e novos investimentos.

De maneira contracíclica, o setor elétrico vem sustentando significativos investimentos no Brasil, em especial associados a projetos de geração por fontes renováveis. Os investimentos em projetos de geração eólica ultrapassaram a marca dos US$ 30 bilhões no período entre 2010 e 2017 (ABEEólica, 2017). Isto reforça os benefícios à economia nacional e regional com geração de empregos qualificados e renda, inclusive nas áreas com baixo IDH, o que também contribui para a redução de desigualdade entre as regiões do país. Neste sentido, tampouco podemos deixar de destacar as mais de 133 empresas que fornecem produtos e serviços ligados à cadeia de fornecimento das usinas eólicas e os mais de 30 mil postos de trabalho gerados nessa cadeia em 2017 no Brasil (ABEEólica, 2017). É um exemplo da capacidade de atração de capital do negócio de energia renovável. No mundo os investimentos chegaram a US$ 107 bilhões em 2017 (GWEC, 2017), e a perspectiva é que aumentem continuamente. Até 2050, a energia eólica poderá responder por algo entre US$ 87 a 314 bilhões de investimento anualmente e gerar 2 milhões de postos de trabalho no mundo (IRENA, 2018b). A América do Sul poderá representar cerca de 5% deste valor, correspondendo a 285 GW instalados em 2050. Este mercado potencial não pode ser negligenciado pelo Brasil, que poderia funcionar como um hub de produção regional, atendendo os mercados de países vizinhos.

  • A energia eólica é essencial para o Brasil alcançar a meta de emissões de gases de efeito estufa até 2025 - 2030.

Com uma capacidade instalada em torno de 35 GW e 120 TWh/ano em 2030, a fonte eólica no Brasil poderia ser responsável por uma emissão evitada de 10 milhões de toneladas de CO2 por ano, considerando-se o fator de emissão médio da rede elétrica brasileira no cenário de referência projetado.  No mundo, estima-se que a eólica também apresentaria uma rápida expansão e um papel essencial na transição energética (figura 5) (IRENA, 2018b). Em 2050 estima-se em cerca de 5.000 GW instalados de fonte eólica, aproximadamente 36% da geração total mundial, o que significaria uma emissão evitada de 3.3 GtCO2/ano (figura 6) (IRENA, 2018b).

Figura 5 – REmap cenário: Geração de eletricidade no mundo, em 2050.

Fonte: IRENA (2018b)

Figura 6 – Emissões evitadas de CO2 no setor de energia no mundo, em 2050.

Fonte: IRENA (2018b)

  • O Brasil é líder em inovadoras soluções regulatórias e comerciais para energia renovável: os leilões de energias renováveis

Não apenas o Brasil possui vantagens comparativas devido aos abundantes recursos renováveis, ou em razão da configuração do sistema interligado e seu porte continental, mas também é destaque em estudos de planejamento do setor energético, assim como no desenho de arranjos comerciais e regulatórios para contratação de energia renovável. Aqui, mais uma vez, o caso da contratação de geração eólica é digno de nota. Após a contratação via feed in de cerca de 1 GW pelo PROINFA, instituído em 2002, o país enveredou para os leilões de energia renovável em 2005. Foram estabelecidos mecanismos de leilões e contratos - PPAs que permitiram a expansão de investimentos privados no setor. O enorme sucesso chamou a atenção de vários países no mundo. Em 2005 apenas 6 países adotavam leilão como forma de contratação, dentre os quais o Brasil, e passados mais de 10 anos são cerca de 70 países (IRENA, 2017b).

Este conjunto de aspectos constitui sólido racional para a continuidade de expansão da geração eólica no país, no atual contexto de reflexão sobre aprimoramento do marco regulatório do setor elétrico nacional.

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