Opinião

No gás, o bom exemplo que vem do Sul

Autonomia e independência da agência reguladora guiam mercado de gás do Rio Grande do Sul a tarifas mais justas e equilibradas

Por Letycia Pedroza

Compartilhe Facebook Instagram Twitter Linkedin Whatsapp

Independência decisória, competência regulamentar e participação social. Foi isso que definiu a mais recente revisão tarifária do serviço público de distribuição de gás do Rio Grande do Sul. Orientada por esses preceitos essenciais, a agência estadual reduziu o impacto do reajuste da margem de distribuição de 75% para 7%.

A impressionante atenuação veio de uma importante e histórica decisão da Agência Estadual de Regulação dos Serviços Públicos Delegados do Rio Grande do Sul (Agergs) sobre os custos que devem ou não ser incorporados ao cálculo da tarifa de distribuição da Sulgás.

Com proposta inicial de uma margem 75% maior do que a margem vigente, fruto da complementação do precário pleito da concessionária, a necessidade da intervenção do regulador se fez evidente. Por interpretações do contrato de concessão que favoreciam a concessionária, os consumidores gaúchos pagariam a maior tarifa de distribuição do país. E mais: pelos impostos de renda da Sulgás.

A Agergs excluiu do cálculo da margem de distribuição o Imposto de Renda, reconhecendo a ilegalidade do dispositivo do contrato de concessão frente à Lei do Gás do estado e à Lei Geral de Concessões. Com a exclusão dos impostos associados a resultados, R$ 99 milhões deixarão de onerar as tarifas de gás do estado.

Além dos impostos, a Agergs alterou o cálculo para reparar diferenças entre a margem de cada ciclo tarifário e os custos realmente gerados pelo serviço público. O cálculo feito pela Sulgás, herdado dos 27 anos em que o serviço de distribuição não havia sido regulado por uma agência, além de estar equivocado, não havia sido regulamentado.

O relatório de sua equipe técnica sobre a revisão tarifária demonstra o claro papel do regulador na defesa do interesse público.

Para além da abertura de dois processos de participação social sobre a revisão tarifária, a agência foi presente e ouviu a todos os que se manifestaram a favor e contra aquele reajuste. Reflexo disso é o resultado da revisão tarifária: uma decisão sensata face à situação socioeconômica do estado, que redireciona a concessão ao equilíbrio e não afasta o gás natural e o biometano dos consumidores, seja o consumidor uma indústria, que gera renda e empregos, ou um cidadão que utiliza o gás no dia a dia. 

Acompanhar, atualizar, corrigir e dar transparência sobre as práticas de seus regulados. Assim é a boa regulação.  Foi com essa boa regulação direcionando sua decisão a respeito dos custos que antes compunham o cálculo da margem de distribuição que a Agergs evitou um custo que tiraria mais de R$ 180 milhões do bolso dos consumidores, somente em prol da concessionária.  

Exercendo com autonomia seu poder regulamentador, de mais a mais a agência cumpriu com outro dever para com a concessão, ao assegurar aos agentes do mercado o questionamento dos elevados valores em novos investimentos aprovados para a Sulgás pela Sema/RS. Os investimentos aprovados são incompatíveis com a realidade da expansão da distribuição, que a cada ano distribui menos gás e neste teve uma perspectiva de crescimento de menos de 2%. 

O que se observa aqui é o pleno exercício, pela agência, do poder que lhe foi delegado, garantindo a modicidade tarifária e o equilíbrio econômico-financeiro, pressupostos essenciais à concessão do serviço público.

Ao fim deste processo de revisão tarifária, o regulador gaúcho sinaliza mais uma vez ao Poder Concedente a necessidade da revisão e adequação do contrato de concessão à realidade dos anos 2020. O contrato firmado há mais de 30 anos, à época da hiperinflação, hoje é um instrumento que poderia garantir a hiper remuneração da concessionária, não fosse a firme e independente atuação da Agergs. 

Até o atendimento das recomendações pelo Estado, é essencial que a agência continue atuando com autonomia, independência e plena competência regulamentar, cumprindo com o papel que lhe foi delegado pelo Poder Concedente e guiando o mercado de gás do Rio Grande do Sul à competitividade e à maturidade regulatória.

Outros Artigos