Opinião
PCS: Mais uma batalha que o consumidor perde e o empreendedor sai vencedor
Nos deparamos com a busca por uma solução consensual para usinas que não seguiram as regras do leilão e não pagaram as devidas penalidades por atraso aos consumidores
Por decisão do Tribunal de Contas da União (TCU), deliberada no mês de junho, no dia 07, houve a aprovação de um acordo consensual que permite a manutenção dos contratos das usinas da Karpowership (KPS) contratadas por meio do Procedimento Competitivo Simplificado (PCS), porém com redução da inflexibilidade, mesmo que estas usinas não tenham seguido as regras do leilão.
As quatro usinas da KPS foram contratadas emergencialmente em um momento de crise hídrica onde não se vislumbrava melhoras nas afluências futuras, com diretrizes e regras diferentes da contratação usual das usinas que compõem o atual parque gerador brasileiro. O PCS foi um processo excepcional, atípico e com condições extremamente duras e restritivas, visto que as térmicas precisavam entrar em operação em um curto espaço de tempo, e essa especificidade foi valorada na alta Receita Fixa negociada.
A chuva chegou e permaneceu. Com isso, a condição energética do país melhorou bastante e fez com que não houvesse mais dependência da geração térmica dessas usinas e das demais contratadas. No entanto, como o contrato tem que ser cumprido, as usinas que conseguiram entrar em operação comercial seguem gerando.
No caso das usinas da KPS, elas entraram em operação comercial fora do prazo definido no edital do leilão e acordado em contrato, cerca de cinco meses depois do início de suprimento algumas unidades geradoras começaram a ficar disponíveis para o sistema, com a motorização final apenas no final de 2022. Caso realmente precisássemos dessa energia, o consumidor ficaria à mercê.
A razão dessas usinas estarem gerando é o simples motivo de que a Aneel não julgou os processos de excludente de responsabilidade, que estão parados na agência desde outubro de 2022, quando houve a publicação de uma Nota Técnica concluindo pelo indeferindo de tais pedidos, por se tratar de riscos do empreendedor. O que foi consumado pela publicação do Parecer da Procuradoria Federal da Aneel, no qual não restam dúvidas de que tais pedidos não devem prosperar.
Agora, nos deparamos com a busca por uma solução consensual para usinas que não seguiram as regras do Leilão e não pagaram as devidas penalidades por atraso aos consumidores. Ou seja, mais uma vez o empreendedor saiu vencedor dessa batalha, na qual o consumidor terá que arcar com custos bilionários para sustentar a decisão emitida pelo TCU.
Dos números, a KPS está recebendo uma receita fixa mensal para operar cerca de R$ 255 milhões por mês. Até o momento, ela já recebeu aproximadamente R$ 1,5 bilhões. Com sua operação até o final de 2023, teríamos um custo de R$ 1,53 bilhões. Porém, com a decisão do TCU, devido à redução de inflexibilidade, o consumidor ainda teria que arcar com vultosos R$ 960 milhões para pagar por térmicas que não cumpriram o contrato. Caso sejam mantidos os contratos, os consumidores ainda terão que pagar mais R$ 7,5 bilhões até 2025.
A conta não fecha, e não há razão para que o consumidor fique feliz com essa decisão.Os custos bilionários continuarão.
A decisão foi muito comemorada pelos ministros em seus discursos, porém, analisando os números de perto e sabendo da situação desses empreendimentos, não haveria que se falar em solução conciliatória, e sim que os contratos fossem cumpridos e rescindidos.
O consumidor não quer soluções mitigadoras de problemas que não existem. É necessário pensar no todo, fazer com que os contratos sejam cumpridos e, com isso, contribuir para que a estabilidade jurídica e regulatória do Setor Elétrico Brasileiro (SEB) seja preservada e para que custos indevidos não recaiam sobre aqueles que têm menos poder nesse processo.
Jéssica Guimarães é formada em Engenharia de Energia pela UNB e atua como Analista de Energia na Associação Brasileira de Grandes Consumidores Industriais de Energia e de Consumidores Livres (Abrace)