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Redução na conta de energia pode ir além do Mercado Livre

Comercializadoras operam com perfil de gestoras de energia, identificando pontos de economia adicional em seus clientes, inclusive com ajuda de energytechs

Por Nelson Valencio

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Centro de Distribuição da Kalunga, em Barueri: ajustes depois da migração geraram redução de R$ 200 mil por ano na conta (Foto: Divulgação Kalunga)

A migração para o mercado livre de energia - acelerada pela liberação de todos os consumidores de alta e média tensão - reforçou a necessidade de "evangelizar" os novos entrantes. Com acesso aos dados dos clientes, as comercializadoras entram no terreno das escos para aprimorar a eficiência energética em favor dos clientes, identificando brechas no consumo e sugerindo correções. As comercializadoras que não tem um time técnico para tal fim estão buscando formar parcerias com energytechs, combinação que tende a crescer, segundo dois especialistas ouvidos pela Brasil Energia.

“O mercado livre proporciona uma redução de 20% a 35% na conta de energia, mas é possível ter uma economia adicional de 10% a 15% com outras ações”, diz Alan Henn (foto), CEO da Voltera, comercializadora de São Paulo. Ele cita como exemplos de “outras ações” os ganhos adicionais com ajustes no contrato com a distribuidora ou em qualquer outra operação que envolva energia nas empresas.

Para Henn, a desinformação entre os consumidores do varejo - a maioria dos que estão migrando para o mercado livre - é significativa. Como são, em grande parte, pequenos negócios, muitos deles não têm a cultura de gestão de energia. Essa realidade abre uma nova oportunidade para comercializadoras e startups.

No caso da Voltera, o processo começa antes mesmo da oficialização do contrato de migração, uma vez que as distribuidoras têm um prazo de 180 dias para realizar a transição. Durante o período, a comercializadora começa a analisar o contrato com a concessionária e sugere os ajustes necessários.

A jornada de otimização, realizada antes da migração, começa com a avaliação da demanda contratada em comparação ao perfil de consumo. Se a demanda contratada for menor que a real, a distribuidora cobra uma multa pesada, cerca de três vezes a tarifa aplicada sobre o valor excedente. O inverso também acontece: se o cliente consome menos do que contratou, mesmo assim a distribuidora cobra pelo volume acordado.

A relação distribuidora-cliente também tem regras quando o consumidor solicita alteração no nível de sua demanda. Se ele quer alterar para mais, a concessionária tem um prazo entre 30 e 40 dias para atendê-lo. Já se o pedido for para alterar para menos, o prazo é de 90 dias. Embora seja um processo simples de mudança cadastral, o processo foge ao conhecimento da maioria dos clientes.

Outro ajuste comum é o fator de potência exigido pelas distribuidoras. Em muitos casos, a carga dos clientes não atende às especificações da concessionária, o que resulta em multas. “Essa penalidade é cara, com valor regulamentado, mas pode ser eliminada com a adequação do consumo ou da estrutura dos equipamentos do cliente ao fator de potência exigido pela distribuidora”, explica Henn. Isso pode ser feito com a instalação de um banco de capacitores na entrada do transformador, um investimento relativamente baixo que previne o consumidor das multas.

Outras medidas simples, como antecipar a parada das operações antes do horário de pico, também podem gerar economia. Diferentemente dos consumidores de baixa tensão, os de média e alta tensão são cobrados por tarifas horo-sazonais, que variam conforme a hora do dia e, às vezes, a estação do ano.

A desinformação sobre esses aspectos é comum entre as empresas em processo de migração e, segundo o executivo da Voltera, três em cada quatro delas precisam de algum tipo de ajuste. Mesmo no caso de companhias de porte médio, as correções podem gerar ganhos significativos, como aconteceu com a Kalunga, que obteve redução de R$ 200 mil por ano graças às otimizações.

Se por um lado empresas menores não tem a cultura dos negócios de energia, por outro o contato direto com o empreendedor é facilitada com uma comunicação mais simplificada e soluções amigáveis, como dashboards com os dados de consumo de energia, acessíveis por aplicativos de celular. Esse monitoramento pode identificar incongruências, como o consumo atípico de uma padaria às três da manhã.

Como as comercializadoras têm acesso aos dados consolidados dos seus clientes no mercado livre, através dos medidores inteligentes ativados pelas distribuidoras, o uso de IA chega para ajudar a gerar mais insights e identificar tendências, como é o caso da Energia das Coisas, energytech fundada por Rodrigo Lagreca (foto), que está refinando seu modelo com base em dados históricos coletados em vários clientes.

No seu modelo atual de negócio, a startup analisa informações de consumidores na busca por identificar usos ociosos, o que vai além da medição padronizada do consumo de energia das contas. Para isso, é necessário setorizar o consumo e utilizar sensores em equipamentos estratégicos, como as áreas de armazenamento em frigoríficos.

Assim como a Voltera, a Energia das Coisas busca comunicar-se com os responsáveis pelas contas de energia, mas que não são especialistas no assunto. Portanto, a apresentação dos dados deve ser simples e acessível. “Se a informação for excessivamente técnica, elas só serão compreendidas por uma minoria de gestores. Na maioria das vezes, quem analisa os dados são gerentes de hotel, administradores financeiros e outros profissionais. A minoria é de engenheiros”, lembra o CEO.

Lagreca adianta que a análise da demanda exige o entendimento das características do sistema elétrico do cliente, identificando os setores ou ambientes mais críticos, além da avaliação da disponibilidade dos meios de comunicação que vão transportar os dados captados pelos sensores. Assim como a Voltera, a Energia das Coisas disponibiliza os dados de forma simplificada, acessíveis em dispositivos móveis, como celulares.

Na prática, a experiência da empresa mostra que a otimização pode reduzir o consumo de energia em até 40%, sem contar os ganhos com a migração para o mercado livre. Um exemplo disso é o caso de um grande centro de eventos, que apresentava alto consumo de energia durante a madrugada, quando não havia feiras em andamento, para garantir que os seguranças não ficassem no escuro.

Quando o cliente da startup é a própria comercializadora e não o usuário final, os dados servem para orientar o consumo responsável e evitar os desperdícios. Pode parecer contraditório, não para Lagreca. Ele acredita que essa função das comercializadoras é um fator de fidelização, de uma nova postura. O ponto de vista é respaldado por Henn, da Voltera: “A distribuidora foca no consumidor, enquanto as comercializadoras estão focadas no cliente”.

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