Opinião

Transição Energética: Como assim, Justa?

A transição energética é inevitável, mas precisa ser justa e equilibrada. Não se trata apenas de substituir tecnologias, mas de redefinir responsabilidades globais e garantir que os custos dessa mudança não recaiam desproporcionalmente sobre os países e populações que menos contribuíram para o problema climático.

Por João Clark

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O momento histórico por que passa a humanidade contempla a necessidade de descarbonização da atmosfera, a partir da substituição gradual da queima de combustíveis fósseis por fontes energéticas renováveis, menos emissoras de gases de efeito estufa (GEE). A esse processo histórico dá-se o nome de transição energética.

Entretanto, essa mudança não acontece da noite para o dia. Mesmo nos cenários mais otimistas da Agência Internacional de Energia (AIE), o petróleo e o gás ainda permanecerão na matriz energética global por muito tempo — ainda que em escala gradativamente menor. 

As tecnologias atuais de geração de energia renovável ainda não possuem custo e escala suficientes para substituir completamente os combustíveis fósseis em nível global.

Não há como substituir em curto prazo, por exemplo, os derivados de petróleo na matriz de transportes, no que diz respeito a navios e aviões. Se esses meios de transporte que viajam pelo mundo diariamente levando milhões de pessoas e mercadorias constituíssem um país, seria o quinto maior poluidor, atrás apenas de China, Estados Unidos, Índia e Rússia.

 

Emissões e desigualdades globais

Outro ponto fundamental é que a geração de energia e a consequente emissão de GEE não ocorrem de forma homogênea no planeta. Países mais industrializados, como Estados Unidos, China e Europa Ocidental, são muito mais responsáveis pela emissão desses gases do que os países mais pobres. 

O gráfico da Figura 1 deste artigo ilustra a distribuição dos principais emissores em 2018. De lá para cá, economias como a da China e da Índia aumentaram significativamente sua participação.

Figura 1: Emissão de GEE por países em 2018
Figura 1: Emissão de GEE por países em 2018 Fonte: World Resources Institute

 

O que torna a transição energética justa

O primeiro pilar da justiça energética é a inclusão social e econômica. A mudança para fontes mais limpas deve priorizar a proteção dos direitos dos trabalhadores e garantir que ninguém seja deixado para trás. 

Países mais pobres, menos responsáveis pela concentração de GEE, precisam ter acesso garantido a energia acessível, ainda que subsidiada pelas nações mais ricas. Se for necessária uma escala de descontinuidade, esses países deveriam ser os últimos a abolir o uso de combustíveis fósseis.

Outro ponto essencial é a criação de políticas públicas que assegurem condições de vida e trabalho dignas, especialmente para os trabalhadores dos setores impactados. A transição deve ser planejada de forma a gerar novos empregos, e não apenas fechar indústrias.

Há também um aspecto geopolítico relevante: a transição energética ocorre na demanda, não na oferta. Enquanto houver demanda por combustíveis fósseis, os países que possuem essas reservas continuarão a produzi-los. 

As nações que construíram suas riquezas sobre o petróleo e o gás - como Reino Unido, Estados Unidos, Rússia e países do Oriente Médio - não podem exigir que países que recentemente se tornaram exportadores, como Brasil, Guiana, Moçambique, ou países pobres como Nigéria, Venezuela ou Indonésia, parem primeiro de explorar seus recursos.

Além disso, é importante considerar a graduação da poluição entre os combustíveis fósseis: o carvão mineral é mais poluente que o petróleo, que, por sua vez, é mais poluente que o gás natural. Portanto, a substituição deve ocorrer nesta ordem, priorizando a eliminação das fontes mais sujas primeiro.

 

O Brasil na transição energética justa

Segundo relatório da EPE (2025), o Brasil possui, entre as maiores economias do mundo, a matriz energética mais limpa, com 44% de fontes renováveis, contra 13% da média mundial (Figura 2).

Figura 2: Matriz energética – Brasil x Mundo
Figura 2: Matriz energética – Brasil x Mundo

Quando se analisa apenas a matriz elétrica, a diferença é ainda mais acentuada: 82% de renováveis no Brasil contra 23% na média global.

Outro aspecto de justiça energética é que os petróleos de melhor qualidade, com menor teor de contaminantes, como o brasileiro, devem ter preferência frente aos de pior qualidade, que deveriam ser os primeiros a serem descontinuados. 

Além disso, é justo valorizar as empresas produtoras com menor pegada de carbono e melhores resultados em captura e armazenamento de CO₂ , critérios em que a Petrobras também se destaca positivamente.

 

Conclusão

A transição energética é inevitável, mas precisa ser justa e equilibrada. Não se trata apenas de substituir tecnologias, mas de redefinir responsabilidades globais e garantir que os custos dessa mudança não recaiam desproporcionalmente sobre os países e populações que menos contribuíram para o problema climático.

O desafio é alinhar sustentabilidade ambiental, equidade social e viabilidade econômica, promovendo uma transformação que seja realmente inclusiva. Nesse cenário, o Brasil ocupa posição privilegiada e estratégica: com uma matriz já predominantemente limpa e um petróleo de alta qualidade, o país pode ser um modelo de transição gradual, sustentável e justa, conciliando o desenvolvimento econômico com o compromisso climático.

 

 

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