Opinião

Premissas para Inserção de Energia Eólica na Expansão do SIN

Em todos os cenários avaliados no PDE, a fonte eólica possui a maior capacidade adicional entre as fontes avaliadas até 2026

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A energia eólica não é mais considerada uma fonte marginal no Brasil, pois já é responsável por 12 GW de potência instalada (8% da matriz), havendo mais 4 GW entre já contratados e em construção até 2020.

Até 2026, o Plano Decenal de Expansão de Energia (PDE), elaborado pela Empresa de Pesquisa Energética (EPE) e Ministério de Minas e Energia (MME), em seu cenário de referência, indica contratação adicional de 12GW de energia eólica para atender o crescimento de demanda esperado. No cenário alternativo de demanda (com maior taxa de crescimento da demanda futura), essa necessidade adicional chega a praticamente 20 GW. Para atingirmos estes valores indicados, temos “na gaveta” mais de 25 GW em projetos cadastrados para o próximo leilão A-4, o que mostra o tamanho do apetite dos empreendedores pela energia eólica e a disponibilidade da fonte.

Neste artigo, são apresentadas as principais razões que nos levam a acreditar no crescimento contínuo da energia eólica no Brasil, ressaltando que, em todos os cenários avaliados no PDE, a fonte eólica possui a maior capacidade adicional entre as fontes avaliadas até 2026.

Na análise da expansão da oferta do PDE 2026 utilizou-se o Modelo de Decisão de Investimentos (MDI), que sinaliza a expansão ótima do sistema seguindo o enfoque clássico de planejamento: minimizar o custo de expansão (custo de investimento mais custo de operação) garantindo o atendimento à carga de energia e à demanda máxima de potência a um dado risco.

Para minimizar o custo da expansão, a fonte eólica tem um papel essencial. Além de ter um custo de operação muito baixo, com Custo Variável Unitário (CVU) nulo, isto é, sem custo de combustível, o recurso eólico da região predominante dos empreendimentos, o Nordeste do Brasil, possui um alto fator de capacidade (fator de geração em função da potência instalada), possibilitando um custo nivelado da energia (LCOE) muito competitivo com as outras fontes. Ademais, a sobre oferta nos leilões de energia causa uma forte competição entre os agentes, impulsionando a queda do custo da fonte, conforme observado no histórico dos leilões mostrado na figura abaixo.

Figura 1 – Evolução dos preços da energia contratada em valores correntes[1]

Como mencionado, o MDI efetua o balanço da expansão do sistema, isto é, escolher as fontes que minimizem o custo total da expansão e garantir que a carga de energia e a ponta sejam atendidas. Para fazer o balanço de atendimento à carga de energia, o MDI efetua a análise em períodos mensais, tomando como base a contribuição média mensal de cada agrupamento das eólicas. Os agrupamentos idealmente são as representações do recurso separadas por região e comportamento do recurso. No momento, o recurso eólico somente é separado entre subsistemas, portanto havendo um agrupamento para o Nordeste e outro para o Sul, representando as características dos portfólios regionais. Os valores utilizados no MDI são estimados em função da garantia física das usinas vencedoras de leilão, e podem ser vistos na Figura 4.

Quanto ao risco associado, a fonte eólica é um recurso energético mais previsível e menos incerto que a fonte hídrica, quando observado em escalas mensais e anuais. Como exemplo, pode-se observar nos gráficos abaixo a variação mensal na Região Nordeste da Energia Natural Afluente (ENA) e da densidade de potência do vento entre 2012 e 2015. Dado esse fato e o cronograma de melhoramentos do MDI, no PDE 2026 não se utilizou o risco deste recurso, sendo sua contribuição energética determinística em função do histórico da fonte.

Figura 2 – Energia natural afluente e índice de energia do vento no Nordeste

O atendimento à demanda máxima de potência requer uma análise da fonte eólica em intervalos de tempo menores que o mensal. No PDE 2026, a análise foi feita utilizando dados de 10 em 10 minutos, maior granularidade disponível na EPE. É importante ressaltar que a geração eólica de um único aerogerador possui uma altíssima variabilidade, no entanto, a geração simultânea de muitos aerogeradores geograficamente dispersos é muito menos variável, como mostra a figura abaixo.

Figura 3 – Comparação do efeito portfólio na variabilidade da geração eólica

A partir da análise conjunta dos parques eólicos, a contribuição da fonte eólica para o atendimento à demanda máxima de potência foi calculada como a geração obtida nos 5% piores cenários durante os períodos de demanda máxima do sistema. Os períodos de demanda máxima considerados foram: 1) Verão, meses de novembro até março, ponta entre 13h e 17h; 2) Inverno, meses entre junho e agosto, ponta entre 16h e 20h; 3) Transição, meses entre abril e outubro, ponta entre 14h e 19h. A figura abaixo mostra a contribuição mensal das eólicas para a energia e para o atendimento à demanda máxima.

Figura 4 – Contribuição de energia e ponta das eólicas para o horizonte do PDE 2026

Apesar de poder contribuir para o atendimento da carga de energia e da demanda máxima de potência a um custo competitivo, a energia eólica, mesmo considerando vários parques eólicos dispersos, é uma fonte com variabilidade no curto prazo que não pode ser ignorada. Várias simulações com diferentes configurações de parques eólicos mostram que as variações podem atingir extremos de até 8% da potência total em 10 minutos e até 22% em 1 hora, contudo, 94% das variações em 10 minutos ficam em até 2% e 94% das variações de 1 hora ficaram em até 7%. Portanto, há uma necessidade de capacidade complementar que o SIN deve possuir para garantir a confiabilidade do sistema dado à existência das eólicas, sendo o seu valor uma escolha entre risco e qualidade da previsão do recurso, devendo se situar dentro de uma faixa de segurança entre 7% e 22% da potência instalada, no caso do Nordeste. Vale lembrar que o Operador Nacional do Sistema (ONS) está trabalhando na determinação desta faixa de segurança.

A variabilidade eólica, acrescentada à variabilidade da carga e de outras fontes não controláveis, como a fotovoltaica, impactam o sistema e os estudos de planejamento.  Como mostrado neste artigo, esta variabilidade da produção ocorre em intervalos de tempos distintos. Essa característica vai demandar mais flexibilidade operativa do sistema e demandará que os estudos de planejamento analisem o balanço da demanda e da oferta com uma maior granularidade temporal, isto é, passando para uma análise horária, ou subhorária, que capture tais variações e seus impactos operativos e econômicos.  Portanto, com o avanço nas ferramentas computacionais que vem ocorrendo em todo o mundo, passa a ser fundamental a capacidade de representação temporal do sistema. Contudo, a EPE não dispõe de ferramentas computacionais adequadas para esta análise. Neste sentido, a EPE já está desenvolvendo um modelo de expansão com detalhamento suficiente para avaliação desses efeitos, visando capturar com mais detalhes a necessidade de flexibilidade operativa do sistema e melhor integrar os estudos de geração e transmissão. O equacionamento destes aspectos será fundamental para uma inserção com segurança das fontes não despacháveis e com alta variabilidade, além de permitir a valoração da flexibilidade das fontes atuais e das novas opções de geração flexível, como hidroelétricas reversíveis, baterias, termoelétricas de partida rápida e resposta da demanda.

Visando a sua capacitação e aproximação com o estado da arte neste tema, no final de maio de 2017 a EPE organizou a apresentação e discussão do estudo Utilities of the Future, desenvolvido pelo Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT, na sigla em inglês), que buscou avaliar, através de uma abordagem técnica e isenta, as tecnologias, políticas e modelos de negócio que estão moldando a evolução e transformação da indústria de eletricidade e seus impactos na regulação, planejamento, mercado e empresas. Na discussão participaram as entidades responsáveis pela política energética, comercialização, operação e regulação do setor elétrico brasileiro. Como fruto de tal discussão se reafirmou a principal função do planejamento: criar condições isonômicas que permitam a competição entre as tecnologias, para que as opções mais competitivas e com maior valor ao sistema se desenvolvam naturalmente. Nesse contexto, a energia eólica continua sendo vista como uma forte competidora.

Ressalta-se que os estudos de energia eólica desenvolvidos pela EPE são fundamentados a partir da base de dados AMA (Acompanhamento de Medições Anemométricas), que reúne medições anemométricas e climatológicas realizadas nos locais dos parques vencedores dos Leilões de Energia promovidos pelo MME. Estes dados são medidos de 10 em 10 minutos de acordo com padrão internacional e enviados periodicamente à EPE com o objetivo de reunir informações com a frequência, a quantidade e a qualidade necessárias para fundamentar estudos elétricos e energéticos.

[1] O preço do Proinfa é a média dos Valores Econômicos da Tecnologia Específica da Fonte

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