Opinião

Antes de salvarmos o planeta, salvemos o nosso quintal

Por Redação

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No final de junho, a divulgação de três metas ambientais pela presidente Dilma Rousseff em encontro com o presidente americano Barack Obama tomou conta da mídia brasileira. Entre os compromissos antecipados que serão apresentados na Conferência do Clima, em Paris, no final de 2015, está o de fazer com que as energias renováveis respondam por 28% a 33% da matriz energética do País. As outras foram reflorestar 12 milhões de hectares e reduzir a zero o desmatamento ilegal. Todas até 2030.

Não há dúvida quanto a importância do anúncio e de como a energia renovável vem ocupando mais espaços nos meios de comunicação. Porém, até que ponto a clareza das informações divulgadas realmente favorece o entendimento do público, que é a maior força de mobilização, pressão e transformação dos hábitos de consumo?

A pergunta é pertinente até porque muito do que é divulgado não fica claro nem mesmo para especialistas no assunto. Basta pegarmos o balanço energético nacional de 2014. O relatório aponta que, em 2013, a produção de energia renovável atingiu 119,8 toneladas equivalentes de petróleo, o que significa 46% do total. Então, é preciso deixar claro o que representa exatamente o percentual anunciado pela presidente, já que as metas anunciadas estão abaixo dos patamares já divulgados. Provavelmente as informações anunciadas têm como base o plano nacional de energia 2030, que exclui a energia hidráulica produzida em grande escala da lista de renováveis.

As especificações detalhadas dos dados e as análises de cenários são fundamentais para criação de uma consciência real sobre a situação e para começar a tornar o assunto claro e mais corriqueiro entre as pessoas em geral. Hoje, com exceção da mídia especializada que se aprofunda mais sobre o tema, declarações como a da presidente Dilma acabam servindo apenas como uma forma caricata de dizer ao grande público “estamos salvando o planeta”. Mas a realidade, infelizmente, é muito mais complexa.

O Brasil, certamente, tem potencial gigantesco para o uso das energias renováveis. Basta lembrar que a pior área de incidência solar no País equivale à melhor área da Alemanha, que hoje é a referência global em consumo de energia solar. Mas quando vemos que a fonte representa menos de 0,1% da energia gerada no Brasil, percebemos o quanto é longo o caminho a se trilhar para se chegar a um cenário até mesmo próximo do ideal. Embora, valha lembrar, já existam bons projetos prontos para serem financiados, o que aceleraria o desenvolvimento do mercado.

Sabemos que a tecnologia para se obter energia limpa está disponível. Mas nem tudo é realizável e não vai acontecer sem apoio real (leia-se financiamento) das esferas do governo, além de suporte organizacional, mais pesquisas para os novos sistemas e simplificação das regras para o net-metering – que atualmente é bastante complexo e nem sempre viável para os investidores, mas que poderia ser muito interessante se houvesse mais flexibilidade. O próprio net-metering poderia ser melhor esclarecido como um instrumento de política de incentivo a energia fotovoltaica, mostrando suas vantagens para a sociedade. E é aí que vale nos debruçarmos mais sobre a importância das diversas formas de comunicação para engajamento público e de iniciativas que possam servir de exemplo do quanto as tecnologias renováveis são viáveis.

Modelos de produção em plataformas menores deixam isso evidente, como o projeto Região Energética Maraú (REM) – www.regiaoenergeticamarau.com.br –, que tem ganhado corpo na Península de Maraú, na Bahia, por meio de lideranças e empresários locais, além do apoio obtido de empresas nacionais e internacionais. Preocupados com o aumento dos preços da energia elétrica e com o excesso de consumo durante a alta temporada do turismo, que sempre ameaça colapsar o sistema de energia, eles vem reunindo a comunidade em torno do objetivo de tornar o local a primeira região do Brasil independente do ponto de vista do consumo energético.

O projeto vai muito além da implementação de placas fotovoltaicas e passa principalmente pela conquista do entendimento público. Por isso, desde o começo, ele vem sendo desenvolvido buscando o engajamento da população, principalmente dos jovens. Foram eles, por exemplo, que fizeram todo mapeamento de consumo da região, após um detalhado processo de treinamento.

Em uma cidade onde o sol pode ser uma fonte de renda, entender do assunto tem se tornado prioridade. Para a comunidade da Península de Maraú, falar de energia solar ou tecnologia renovável não é mais algo que será esquecido na velocidade das mudanças das notícias nos jornais. É algo, ainda que pequeno para as dimensões brasileiras, bem mais real e palpável, que depende cada vez mais deles para salvar, antes do planeta, o seu próprio quintal.
  
Diretor de Novos Negócios da Geoklock Consultoria e Engenharia Ambiental
 

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