Opinião

Construindo as fronteiras do setor elétrico brasileiro

Artigo de Claudio J. D. Sales, presidente do Instituto Acende Brasil

Por Redação

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O setor elétrico brasileiro é intrinsecamente complexo: multidisciplinar, intensivo em capital, baseado em lógicas contratuais e econômicas de longo prazo e sujeito a fortes interferências políticas. Por causa dessa arquitetura, tentativas de conduzi-lo com base em fórmulas mágicas, receitas prontas e soluções de curto prazo são fadadas ao fracasso.

No meio de tantos desafios, alguns temas setoriais se posicionam como as fronteiras que definirão os contornos estratégicos do setor nas esferas empresarial, acadêmica e de políticas públicas.

Um dos temas cruciais para o futuro do setor elétrico é a redução da carga tributária média que pesa sobre sua cadeia de valor, carga que tem superado os 40% na última década e ultrapassou os 45% em 2008. Apesar de recentes – e tardias – iniciativas governamentais para reduzir esse ônus, com a eliminação e/ou diminuição de alguns encargos, ainda existem mais de 30 rubricas de tributos e encargos, com múltiplos tributos para os mesmos fatos geradores e bases de cálculo. Dada a essencialidade e o papel estratégico da energia elétrica, é preciso que sejam elaboradas e implementadas propostas para reduzir a carga tributária sobre a conta de luz e melhorar tanto a transparência da tributação quanto a governança da aplicação de encargos setoriais.

Outro tema de fronteira é a interferência dos projetos de usinas e linhas de transmissão nas populações tradicionais: dos 19.673 MW de potência adicional previstos no Plano Decenal de Energia para serem viabilizados no período 2017-2021, 16.089 MW (82%) interferem em terras indígenas. Isso mostra a complexidade de explorar o potencial hidráulico na Amazônia, tendo em vista a falta de definições e a pouca experiência sobre esse tema no Brasil. O planejamento e a construção de hidrelétricas precisarão incorporar a avaliação das interferências de tais projetos em terras indígenas e propor alternativas para reduzir esse impacto. 

E como o mecanismo de leilões regulados é o principal instrumento para o planejamento da expansão da matriz elétrica, é fundamental que o regime de leilões seja cuidadosamente desenhado e implementado para garantir a eficiência na expansão e operação do sistema. Qualquer erro na formatação e execução dos leilões pode comprometer o custo e a segurança do suprimento de energia. Basta ver o custo que o recente cancelamento do Leilão A-1 de 2012 impôs ao consumidor.

Os três temas citados serão tratados na edição de 2013 do Congresso Brazil Energy Frontiers (www.brazilenergyfrontiers.com). Em 3 e 4 de outubro, em São Paulo, empresários, acadêmicos e autoridades governamentais e regulatórias vão se reunir para trabalhar três painéis: “Tributos e encargos sobre a eletricidade: eficiência econômica e social”; “Energia, comunidades locais e povos tradicionais: participação e inclusão”; e “Expansão da oferta de energia: planejamento e leilões”.

Além de chamada para trabalhos acadêmicos com premiação, está confirmada para as sessões plenárias a presença de pensadores internacionais e brasileiros, como Jack Mintz (renomado especialista em política fiscal e tributária e fundador da Escola de Políticas Públicas da Universidade de Calgary, no Canadá), Peter Cramton (professor de economia da Universidade de Maryland e conselheiro de governos ao redor do mundo sobre teoria e prática de leilões) e Bernard Appy (ex-secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda e professor licenciado da PUC-SP).

Não há atalhos. A construção de um setor elétrico sem artificialidades e sustentável no longo prazo requer políticas públicas que consolidem a disciplina financeira, a boa engenharia e as melhores práticas socioambientais, sem se deixar abater pelas interferências de grupos de pressão, que constantemente procuram usar o setor como ferramenta para seus objetivos eleitorais e econômicos.

 

Claudio J. D. Sales é presidente do Instituto Acende Brasil (www.acendebrasil.com.br)

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