Cop30: mais biocombustíveis, nenhuma árvore a menos
Opinião
COP30: mais biocombustíveis, nenhuma árvore a menos
A suposta dicotomia entre produzir energia ou alimentos, associada ao Brasil, tem se revelado um equívoco, pois ambas as atividades podem coexistir e se fortalecer mutuamente
O artigo Brazil to ask countries at Cop30 to vastly increase biofuel use, leak suggests, publicado recentemente pelo The Guardian, levanta preocupações sobre a proposta brasileira de ampliar o uso global de biocombustíveis, mas ignora as especificidades e os avanços do modelo nacional. Anunciada nas negociações da Pré-COP, a proposta prevê que a produção seja quadruplicada até 2035.
Críticas aos biocombustíveis agrícolas costumam refletir percepções formuladas em contextos distintos do brasileiro, sustentadas por simulações que não refletem as dinâmicas produtivas da maioria dos países tropicais. A suposta dicotomia entre produzir energia ou alimentos, associada ao Brasil, tem se revelado um equívoco, pois ambas as atividades podem coexistir e se fortalecer mutuamente. Hoje, o país utiliza uma pequena fração de terras para – bioenergia, principalmente pastagens degradadas, sem expandir as fronteiras agrícolas.
Uma governança adequada favorece essas sinergias, como reconhecem organizações internacionais e estudos que indicam ganhos sociais e ambientais, traduzidos em segurança alimentar e resiliência agrícola.
Em termos ambientais, a agricultura brasileira evoluiu também, favorecendo uma coexistência entre áreas ocupadas e preservadas. A expansão dos plantios tem se dado principalmente associada à recuperação de pastagens degradadas, contribuindo para o aumento da produtividade e a conservação de ecossistemas nativos.
Com isso, o território nacional mantém ampla cobertura vegetal, como mostra o quadro neste artigo. As áreas de lavouras, incluindo as de produção de cana, soja e florestas plantadas, representam menos de 10% do total do território, sem pressionar novas fronteiras agrícolas.
A qualidade ambiental dos biocombustíveis brasileiros se manifesta ainda em termos de emissões de gases de efeito estufa. O etanol de milho exemplifica esse desempenho, com emissões diretas entre 18,3 e 25,9 gCO₂e/MJ e potencial de redução para 0,8 a 4,5 gCO₂e/MJ considerando efeitos indiretos, segundo o estudo Socio-environmental and land-use impacts of double-cropped maize ethanol in Brazil.
O balanço de carbono também é favorecido no que diz respeito às biomassas. A conversão de pastagens em eucalipto para suprimento de carvão vegetal sustentável pode resultar em remoção líquida de CO₂ e fortalecer a integração entre o setor florestal e a produção de biocombustíveis. Esses resultados superam os obtidos em outros países e demonstram a maturidade técnica do setor e sua contribuição efetiva à mitigação climática.
Por fim, o país domina tecnologias de conversão energética baseadas no aproveitamento de resíduos. A cogeração com bagaço de cana e a produção de biogás e biometano a partir de vinhaça e torta de filtro são exemplos da prática na indústria sucroalcooleira. Essas rotas ampliam o potencial de descarbonização sem competir com a produção de alimentos, reforçando a circularidade e o uso eficiente dos recursos.
Evidentemente que todos os predicados favoráveis das biossoluções energéticas não eliminam a responsabilidade de a sociedade como um todo – incluindo reguladores e o terceiro setor, entre outros agentes – monitorar atentamente e garantir que os projetos sejam desenvolvidos com as salvaguardas socioambientais adequadas. O histórico de desmatamento ilegal vinculado à expansão agrícola e os casos gravíssimos de conflitos trabalhistas no campo reforçam essa importância.
De qualquer forma, o aproveitamento do carbono biogênico é um caminho sem volta: o aumento da eficiência nos cultivos e seu custo relativamente baixo têm tudo para ampliarem seu protagonismo na transição energética.
O Brasil chega à COP30 apoiado em políticas estruturantes como o RenovaBio e o Programa Combustível do Futuro, que consolidam uma matriz energética renovável. Com governança, inovação e base científica sólida, o país demonstra que a bioenergia sustentável é parte essencial da solução climática global, e não do problema. Mas há muito a ser feito para que o resto do mundo compreenda, aceite e contribua nessa direção.

Fonte: adaptado de https://www.embrapa.br/car-2021/resultados

Fonte: adaptado de https://www.embrapa.br/car-2021/resultados



