Opinião
Desafios do planejamento das empresas no cenário atual do Sistema Elétrico Brasileiro
Com freqüência, os principais meios de comunicação do país têm estampado manchetes como “Custo da usina de Belo Monte já supera os R$ 30 bi” e “Risco de racionamento de energia cresce e supera 18%”.
O que provocou esse cenário de instabilidade e incerteza em um setor no qual a previsibilidade e a capacidade de planejamento são prioridades?
Parte dessa resposta é histórica: o Sistema Elétrico Brasileiro tem apresentado ciclos de aproximadamente trinta anos que se encerram com crises sistêmicas; elevado crescimento da demanda necessitando de investimentos constantes e risco de racionamento como importante indutor de evolução do sistema ao provocar o planejamento de novos investimentos e a revisão da regulação.
Além disso, o novo modelo do sistema, implantado em 2004, provoca enormes desafios ao país ao passar por momentos de instabilidade em quatro dimensões: infraestrutura, matriz energética, sistema elétrico e regulatório.
No tocante à infraestrutura, apesar de a oferta de energia ter acompanhado a demanda, os novos projetos estruturantes apresentam grandes desafios desde a fase de planejamento e projeto até a fase de implantação, com atraso nas obras e aumento do custo previsto.
A matriz energética do país tem 73% de origem hidráulica e essa predominância deve se manter no médio prazo. As térmicas devem manter sua participação e a eólica, que é intermitente e variável, triplicará nos próximos dez anos, atingindo 9,5%. Com isso, a capacidade de armazenamento de energia do sistema diminuirá de aproximadamente seis meses para quatro meses em 2022, impactando a segurança do sistema. Além disso, essa queda na capacidade de regulação deverá aumentar a volatilidade do custo da energia elétrica de curto prazo, o PLD (Preço de Liquidação das Diferenças), pois ela está diretamente correlacionada ao nível de armazenamento.
O sistema elétrico é interligado e seu controle centralizado. Com as grandes centrais distantes dos centros consumidores, três elementos impactam sua confiabilidade: a localização dos rios que, com o esgotamento da capacidade de expansão no Sul e Sudeste, se encontram na Amazônia; a interligação Norte-Sul que é feita por duas linhas de transmissão; e a interligação de Itaipu.
Tais fragilidades impactam a economia e a vida dos brasileiros com sucessivos apagões. Entre eles, destacam-se o de janeiro de 2002, com 76 milhões de pessoas; o de novembro de 2009, o “Mega-Apagão”, que atingiu 18 estados, e o “Recorde de Demanda”, em fevereiro 2014.
Por fim, as constantes mudanças regulatórias causam incertezas. A renovação das concessões e a redução forçada das tarifas, em média de 20%, foram motivadas pelo esforço para gerar um ciclo de crescimento focado em aumento do investimento e pelas necessidades de estímulo à economia brasileira e à competitividade do setor produtivo e de manutenção da presença estatal na operação do setor.
A antecipação para 2013 da prorrogação dos contratos de concessões que terminariam nos 60 meses seguintes, o que corresponde a 20% da capacidade de geração e 67% das linhas de transmissão, não foi aceita por todas as geradoras, com destaque para a Cemig, Cesp e Copel.
Com isso, as distribuidoras ficaram sem contratos de longo prazo, sendo forçadas a comprar 2 GW no mercado spot com o PLD atingindo o teto em fev./14.
Em uma tentativa que não foi bem-sucedida de conter a inflação, esse custo adicional não foi inicialmente passado às tarifas. Entretanto, a situação extrema das distribuidoras está exigindo um reequilíbrio forte em todo o setor.
Equilíbrio necessário
A qualidade de vida do brasileiro e a competitividade da economia dependem do sistema elétrico, que hoje encontra dificuldades para atingir esse equilíbrio devido aos enormes desafios apresentados.
Isso exige um maior esforço por parte da iniciativa privada no planejamento, gestão e tomada de decisão. O planejamento elétrico de médio e longo prazo depende da relação entre o custo das ações possíveis e o eventual custo de inação.
Marcos Teixeira de Freitas Filho é Gerente em Consultoria e Estruturação de Projetos da Promon Intelligens. Tem mestrado em Engenharia Elétrica e MBA em Gestão Empresarial.