Opinião
A guerra por talento na indústria mundial de gás
Recursos humanos são a segunda maior barreira para o crescimento do setor, segundo enquete da GL Noble Denton
A edição de novembro de Brasil Energia ressaltou os desafios que a indústria brasileira de óleo e gás vem encontrando para atrair e reter recursos humanos qualificados, essenciais para desenvolver e expandir o setor no país. Este, porém, é um fenômeno global.
O aumento do preço do petróleo abriu novas fronteiras, que vão desde a exploração em zonas árticas, projetos em águas superprofundas, novas províncias no leste da África e o desenvolvimento de tight gas e shale gas. O crescimento do comércio de GNL impulsiona projetos na América do Norte e na Austrália.
A cadeia de valor do gás natural vem se diversificando, com empresas tradicionais de middlestream e downstream passando a atuar no upstream, buscando garantir suprimentos para seus mercados. Esse é o caso da Kogas, da Coreia do Sul, um dos maiores importadores globais de GNL, que vem investindo no desenvolvimento de campos de óleo e gás no Iraque. Além disso, empresas nacionais de petróleo estão cada vez mais agressivas na busca de oportunidades no exterior, visando diversificar seus planos de negócios, como a Petronas (Malásia), a CNPC (China) e a PTT (Tailândia).
A Austrália está desenvolvendo projetos de GNL totalizando US$ 180 bilhões. Estima-se uma escassez de 36 mil trabalhadores qualificados. O salário médio do profissional de óleo e gás na Austrália é US$ 140 mil por ano, enquanto a média mundial é de US$ 76 mil. A inflação de custos está ameaçando a concretização de diversos projetos australianos.
Uma enquete da GL Noble Denton e The Economist com líderes da indústria mostra que 42% estão otimistas quanto ao futuro em exploração e produção, mas que os recursos humanos são a segunda maior barreira para o crescimento do setor, logo após os custos inflacionados.
A indústria está acordando para o problema e tem buscado agir. Durante o período 2009-2012, coordenei uma força-tarefa da International Gas Union (IGU) sobre o capital humano para a indústria de gás. Nesse período realizamos duas enquetes com cerca de 100 empresas em toda a cadeia de valor, entrevistamos mais de 30 experts e jovens profissionais e organizamos dois seminários regionais.
Os resultados mostram que a idade média do profissional é superior a 45 anos, exceto no Brasil e no Oriente Médio, onde é da ordem de 35 anos. A participação de mulheres ainda é baixa, com apenas 8% dos cargos gerenciais de alto nível – no Oriente Médio a participação é de apenas 3%. O setor sofre com a falta de profissionais em engenharia, produção e operação, e a maioria das empresas avalia que o problema vai se agravar nos próximos dez anos. As empresas de gás estão priorizando a contratação de profissionais com experiência em comercialização e trading e em GNL.
As regiões com mais dificuldade para atrair talento são o Oriente Médio, América do Sul e África. Os profissionais experientes consideram que salários e alto grau de responsabilidade são fatores-chave para atração de talentos, enquanto os jovens profissionais estão interessados em perspectivas de desenvolvimento, salários e na imagem da empresa. A guerra real é por profissionais experientes, sobretudo em áreas técnicas, como geofísica, engenharia de petróleo, engenharia de perfuração, construção e operação de plantas de GNL, mas também em áreas comerciais, como negociação de contratos e comercialização de gás e GNL.
As empresas estão recorrendo a diversas iniciativas para atrair e desenvolver talento. À semelhança da Petrobras, a Gas Natural Fenosa implementou uma universidade empresarial. A Petronas tem um centro de treinamento voltado para pessoal de suas joint ventures na África e Ásia Central e possivelmente de outras empresas. A Companhia de Petróleo e Gás da Polônia está contratando aposentados como consultores e mentores de empregados mais jovens. Oman LNG implantou o programa “Hire today, deploy later”. O Qatar tem um programa nacional de desenvolvimento de novos graduados.
Somente isso, porém, não é suficiente para garantir mão de obra qualificada no momento certo. A formação de um profissional qualificado leva de oito a dez anos, o mesmo tempo necessário para explorar um campo em águas profundas. A indústria precisa inovar. Trabalhar com universidades para melhorar a oferta de cursos, incentivar o estudo de ciências e engenharia e utilizar profissionais experientes como mentores. E, sobretudo, investir em sua imagem e nos atrativos de uma carreira em petróleo e gás natural.
A coluna de Ieda Gomes é publicada a cada três meses
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