Opinião

Licenciamento ambiental – Organizar para avançar

Por Redação

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A partir de março de 2015 o governo federal publicou uma série de normas relacionadas ao licenciamento ambiental, que sem dúvida irão influenciar sobremaneira a prática nas análises de viabilidade, implantação e operação de empreendimentos e atividades no país.

Inicialmente, visando readequar os procedimentos administrativos que disciplinam a atuação dos órgãos e entidades da administração pública federal envolvidos no licenciamento ambiental de competência do Ibama, foi editada a Portaria Interministerial (PI) nº 60, de 24/03/2015. Assim, a Funai, a Fundação Cultural Palmares, o Iphan e o Ministério da Saúde tiveram aprimorados seus procedimentos para interação ao órgão licenciador federal. A referida Portaria recepcionou alguns conceitos já constantes na revogada PI nº 419/11, mas ampliou outros, como o de bens culturais acautelados, e passou a exigir maiores detalhes técnicos de modo a qualificar melhor o tipo da intervenção.

De uma maneira geral, os ajustes relacionados aos procedimentos para a participação dos órgãos e entidades envolvidos no licenciamento ambiental federal foram positivos, com definição mais clara e objetiva, desde a definição do termo de referência para elaboração dos estudos até as análises dos mesmos e, especialmente, com relação às perspectivas dos prazos de cada etapa do processo, chamando atenção a obrigação dos órgãos envolvidos de disponibilizar, em seus respectivos sítios eletrônicos, as datas das atualizações, visando garantir o controle de cumprimento dos prazos. Outro dispositivo interessante refere-se ao fato de que os dados de estudos já realizados numa mesma região poderão ser reutilizados, e caberá ao Ibama, na qualidade de autoridade licenciadora, decidir em última instância sobre as solicitações ou exigências dos órgãos envolvidos.

Em função da PI nº 60/15, os citados órgãos e entidades envolvidos editaram suas respectivas Instruções Normativas com o objetivo de disciplinar os procedimentos para suas manifestações nos processos de licenciamento federal, estadual e municipal. Desse modo, foram também publicadas a IN Iphan nº 01 de 25/03/2015; a IN Fundação Cultural Palmares nº 01 de 25/03/2015 e a IN Funai nº 02 de 27/03/15. Com este conjunto normativo, a expectativa é aprimorar a interação dos órgãos relacionados aos licenciamentos dos projetos, otimizar as etapas e reduzir o tempo a que hoje se sujeitam os processos, conferindo segurança jurídica às partes envolvidas.

Além de organizar os procedimentos administrativos do licenciamento ambiental, o governo federal regulamentou a Lei Complementar nº 140/11, que fixou as competências administrativas em matéria ambiental dos entes da federação. Assim, foi também editado o Decreto nº 8.437/2015, para estabelecer as tipologias de empreendimentos e atividades, cujo licenciamento ambiental será de competência da União, definindo entre rodovias, ferrovias e hidrovias federais, portos e exploração e produção de petróleo e gás natural offshore, além dos sistemas de geração e transmissão de energia elétrica.

Para melhor compreender o espírito do legislador quando da edição do citado Decreto, resgatamos a Resolução Conama nº 237/97, onde a definição das competências para o licenciamento ambiental no Brasil adotava o critério misto, ou seja, as atribuições administrativas em matéria ambiental dos entes da federação eram definidas em função da aplicação de variados critérios. Esta mesma regra foi recepcionada na própria Lei Complementar 140/11, quando dispõe que caberá à União, entre outros assuntos, promover o licenciamento de empreendimentos e atividades localizados ou desenvolvidos em 2 (dois) ou mais estados (critério da abrangência do impacto); em terras indígenas (critério da localização da atividade); em Unidades de Conservação Federais (critério da dominialidade) e em empreendimentos militares e nucleares (critério da tipologia). No entanto, a referida Lei Complementar ainda dependia de regulamentação, para definir o licenciamento de empreendimentos e atividades que, em função do porte, do potencial poluidor e da natureza da atividade ou empreendimento, seria de interesse da União proceder o respectivo licenciamento. Nesse liame é que o Decreto nº 8.437/15 foi editado, visando destinar ao crivo federal o licenciamento de obras que podemos compreender como de significativo impacto.

Nos termos do citado Decreto, serão licenciados pelo órgão federal, além de outros empreendimentos, os sistemas de geração e transmissão de energia elétrica, compostos de hidrelétricas e termelétricas com capacidade instalada igual ou superior a 300 MW, e eólicas offshore ou localizadas na zona de transição terra-mar. Desse modo, observamos que novos empreendimentos que até hoje tiveram seu licenciamento pelos órgãos estaduais competentes – considerando a aplicação de outros critérios de definição de competência, em especial o da localização – passarão a ser licenciados pelo Ibama em função de sua potência, fato que requer reforço institucional suficiente do órgão ambiental federal, para fazer frente às novas as demandas – considerando em especial a necessidade da viabilidade prévia dos projetos como condição para participação nos leilões de energia.

Tendo em vista, ainda, que o intuito da regulamentação visava definir o licenciamento de empreendimentos em função do porte, do potencial poluidor e da natureza da atividade, cabe refletir se de fato empreendimentos termoelétricos a biomassa e a gás natural precisariam necessariamente ser licenciados pelo órgão federal, por se tratar de fontes com potencial poluidor reduzido em relação aos demais combustíveis de base fóssil.

Outro ponto a observar é o relacionado à possibilidade de deslocamento da competência para a União do licenciamento de linhas de transmissão quando caracterizada situação que comprometa a continuidade e a segurança do suprimento eletroenergético, reconhecida pelo CMSE; bem como quando a necessidade do sistema de transmissão, indicada pelo CNPE, estiver associada a empreendimentos estratégicos. Em que pese a lei Complementar disciplinar sobre os instrumentos de cooperação entre os entes federados, visando a cooperação institucional e o reforço à competência comum, foi vontade do legislador destinar a competência administrativa ambiental nesses casos à União.

Tais atos normativos, acrescidos das recentes alterações na presidência do Ibama e do ICMBio, caracterizam, no mínimo, boa vontade do governo de organizar procedimentos e competências, avançando com as tratativas da pasta ambiental.


Adriana Coli Pedreira é advogada, mestre em engenharia da energia, especialista em direito ambiental e coordenadora do Setor Ambiental do Baggio e Costa Filho Sociedade de Advogados

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