Opinião
Patinho Feio Pode Virar Cisne? Como a exposição involuntária tem prejudicado o mercado livre
Muito se tem falado sobre a exposição involuntária das distribuidoras. Empréstimos têm sido tomados para salvá-las de sua exposição aos altos preços do mercado de curto prazo. Ousa-se dizer, ainda, que a ajuda não é para as distribuidoras e sim para o próprio consumidor, que ficaria exposto a tarifas ainda maiores. Mas ninguém é ingênuo o suficiente para acreditar que, há poucas semanas das eleições, o consumidor, principalmente o residencial, seria presenteado com um “tarifaço”. Ou seja, não causará nenhuma surpresa que os empréstimos comecem a ser pagos apenas no segundo semestre de 2015.
Em que cenário político e econômico essa conta será paga?
O desespero econômico do setor elétrico não para por aí. Sem nos aprofundarmos nos motivos, a próxima senha para a fila dos expostos involuntariamente são os geradores, com o pesadelo do GSF. Para o consumidor é apenas mais um componente da sopa de letrinhas do tão abalado setor elétrico.
Para o governo, de forma geral, não há motivo para alarde algum, está tudo sob controle, mas não é o que nos parece, já que as medidas adotadas desde a edição da MP 579/12 se apresentaram de forma injusta para os consumidores livres e podem tentar matar de inanição o mercado livre.
Com a renovação das concessões determinada pela MP 579/12, transformada na Lei 12.783/13, a destinação da energia existente das geradoras envolvidas foi totalmente atribuída ao mercado regulado. Evidentemente, essa previsão afastou o aproveitamento da energia existente pelo mercado livre, sendo ignorada a participação desses consumidores na amortização dos ativos. Portanto, a partir daí, ocorreram problemas de difícil mitigação para o mercado, afetando tanto o Ambiente de Contratação Regulado (ACR) como o Ambiente de Contratação Livre (ACL). Aliada ao momento climático, no qual se vê efetiva necessidade de complementação térmica, a alocação de grande volume de energia no ACR acabou por reduzir de modo significativo a oferta para o mercado livre (ACL), que já era penalizado pelo forte aumento dos preços.
Essa difícil realidade vem se mostrando cada vez mais evidente, dado que a necessária remuneração da geração térmica adicional – em conjunto com o ínfimo crescimento da economia – põem em xeque os benefícios prometidos pela Lei 12.783/13, além de comprometer sensivelmente a capacidade e a segurança do sistema. O discurso do governo, porém, segue indicando que os preços de energia chegarão a níveis menores que o atual em pouco tempo.
Nesse contexto, a questão principal, que tem sido jogada para debaixo do tapete e escondida como o patinho feio, é: como solucionar a exposição involuntária do consumidor livre? A indústria, coração da economia brasileira, está na UTI.
Essa indústria, que sempre se planejou, arriscando-se ao desconhecido mercado livre, na esperança de preços menores e melhores condições para sua competitividade e consequente crescimento de sua produção, tem sido exposta ao longo dos últimos meses à falta de energia, o que, infelizmente, tende a perdurar por meses.
O consumidor livre sempre paga a conta, sem qualquer contrapartida, e quando encontra energia, verifica que seu alto custo simplesmente justificaria o fechamento de suas portas. Só que, quando as portas forem fechadas, não haverá mais quem pague a conta.
Nesse caminho, chegaremos ao mundo “ideal”, ao menos para o governo, no qual sobrará energia, inclusive barata. No entanto, estaríamos diante de um paradoxo, pois restará desemprego e recessão, aliados ao pouco crescimento econômico.
É imprescindível a conjunção de esforços para o debate de soluções e a abertura de novos caminhos para o setor elétrico, para salvar e tomar medidas para mitigar o cruel fim do consumidor livre. É certo também que esse patinho feio, o consumidor livre, pode virar um cisne! E devemos nos unir para isso.
Paula Campos é diretora executiva da Associação Nacional dos Consumidores de Energia (Anace)