Por uma energia solar distribuída brilhante

Opinião

Por uma energia solar distribuída brilhante

A experiência dos EUA, que afere o resultado das políticas de incentivos às fontes renováveis, colocam a Lei 14.300/22 defasada em mais de uma década no que tange à eliminação de subsídios ineficientes e, pior, postergando a modernização de modelos de negócios

Por Angela Gomes

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Coautor: Marco Delgado

Nos últimos anos os ganhos de tecnologia, de escala e de competição trouxeram significativas quedas dos preços das fontes renováveis e a tendência é de continuação, segundo estudos da Agência Internacional de Energia Renovável. Porém, há legados. Por mais meritórias e necessárias à transição energética, as políticas públicas de incentivo às fontes renováveis ocasionaram efeitos colaterais negativos, notadamente na tarifa da energia elétrica aos consumidores, e demandam revisão.

Por isso, em linha com as melhores práticas na aplicação de políticas públicas, para que os incentivos às fontes renováveis sejam eficientes, é fundamental ter a capacidade de avaliar o alcance de seus resultados, principalmente daqueles que oferecem subsídios, subvenções e isenções.

De forma geral, essa avaliação deve garantir políticas de incentivos que: (i) envolvam regulação coerente, consistente e razoável; (ii) internalizem claros e legítimos sinais de equidade, no contexto ético-social; e (iii) não coloquem em risco a sustentabilidade do sistema elétrico. Eventuais negligências a esses pilares justificam ações mais arrojadas, demandando comumente alterações regulatórias e, em casos limítrofes, legais.

É neste contexto que se insere o crescimento exponencial da Geração Distribuída (GD) no Brasil, cuja capacidade instalada multiplicou-se por 8 em pouco mais de quatro anos, estando hoje acima de 43 GW. Já é a segunda fonte de geração com mais capacidade do país, atrás apenas das hidrelétricas. Tal evolução, de longe a maior já verificada no setor elétrico brasileiro, foi motivada pelo aumento relevante da taxa de rentabilidade dos seus projetos.

Esta abastada rentabilidade, que supera 50% ao ano, segundo a Empresa de Pesquisa Energética, é estimulada pela conjugação de dois fatores principais: enormes isenções tarifárias, com lentíssima regra de redução (até 2045 à grande maioria dos beneficiados); e significativa queda de preços dos módulos fotovoltaicos (80% em uma década).

O principal efeito colateral está na pressão tarifária sobre os demais consumidores, pois são eles que assumem os custos dos benefícios à GD, que já somaram neste ano (até agosto) R$ 10 bilhões, o maior subsídio do setor elétrico brasileiro.

Além disso, num efeito subsequente e inevitável, ocorre a inflação dos insumos às empresas e famílias brasileiras, devido ao aumento da energia elétrica para custeio dos referidos subsídios.

Mais perverso, os benefícios à GD impactam de forma desproporcional as famílias de menor renda, pois são as tarifas dos pequenos consumidores que carregam proporcionalmente mais os subsídios e porque mais de 20% do preço final da cesta básica refere-se à energia elétrica.

Há ainda o efeito colateral negativo sobre os demais agentes de geração, especialmente eólicos e fotovoltaicos de grande porte. A expansão acelerada da GD ocasiona excesso de oferta de eletricidade, levando os demais geradores a prejuízos bilionários devidos a cortes de geração que precisam ser realizados pelo operador do sistema (ONS) para evitar colapso do sistema elétrico nacional.

Aliás, o aumento da complexidade no planejamento e na operação também se configura como outro efeito adverso da expansão acerelada da GD, pois o operador não consegue operar tais recursos, reduzindo significativamente a flexibilidade que dispõe para manter a confiabilidade e o equilíbrio do sistema elétrico nas horas com maior insolação, quando a GD passa a ter peso relevante no suprimento do país.

Assim, mantidos os incentivos atuais que dinamizam a expansão da GD, consolidam-se riscos relevantes à sustentabilidade do setor elétrico nacional, do ponto de vista econômico, social e físico.

E, neste cenário, voltando às melhores práticas, a experiência dos Estados Unidos clarifica que as implementações de políticas de incentivos às fontes renováveis devem ter seus resultados aferidos e, consequentemente, agilidade na calibragem dos respectivos subsídios. Os mais relevantes exemplos são observados nos estados como Texas, Massachusetts, Geórgia e California, que colocam a Lei 14.300/22, aplicada no Brasil, defasada em mais de uma década no que tange à eliminação de subsídios ineficientes e, pior, postergando a modernização de modelos de negócios.

As lições nestes estados oferecem inspiração e coragem para as imprescindíveis alterações no regramento brasileiro, essencialmente na antecipação da redução de subsídios e isenções.

Importante ressaltar que os efeitos dessa antecipação respeitam, satisfatoriamente, as expectativas de rentabilidade dos empreendedores da GD, preservando a segurança jurídica.

Explica-se: como as taxas de retorno são muito elevadas, por efeito de juros compostos, pode-se alcançar praticamente a integralidade da rentabilidade esperada em cerca da metade da vida útil dos equipamentos dos sistemas fotovoltaicos. Destarte, o legislador tem a segurança técnica e econômica para trazer aprimoramentos ao regramento atual, seja através da redução do prazo das isenções tarifárias atualmente oferecidas pela legislação, ou da aplicação de tarifas que aprimorem o sinal econômico aos beneficiados da GD, tornando-os mais aderentes aos custos que causam ao sistema elétrico.

Decerto,  tais aprimoramentos não impedirão a GD de seguir expandindo no país, impulsionando a trajetória da transição energética por aqui, propiciando, por outro lado, um ato de retidão, equidade e sustentabilidade à sociedade brasileira. Um futuro alvissareiro em que a energia solar distribuída ajudará o setor elétrico a brilhar!

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