Opinião

Saneamento e energia: desafios e oportunidades

Por Redação

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O saneamento é um setor eletrointensivo, mas oferece muitas oportunidades para se tornar mais eficiente, adotar fontes alternativas e gerar energia própria. Nesse negócio, o principal gasto de energia ocorre no bombeamento, durante a distribuição da água, e no tratamento de água e esgoto, que, apesar de geralmente ser escoado por gravidade, exige ar soprado no processo de lodos ativados. O consumo é de cerca de 0,6 kWh/m3 no tratamento de água e 0,4 kWh/m3 no de esgoto.
Em eficiência, há várias formas de economia. Para começar pelos ganhos diretos, o uso de equipamentos eficazes, como sopradores parafuso no lugar de trilobulares para injeção de ar no tratamento, pode economizar mais de 20% de energia. Isso sem falar em motores de alto rendimento em bombas, que chegam a uma redução de 10%, ou difusores de ar com melhor taxa de O2/kWh.

É possível também otimizar os processos, reduzindo desperdício em mistura completa com ar e na retrolavagem de filtros em estações de tratamento. Melhorar a manutenção reduzindo incrustação e obstrução em dutos, materiais com menor coeficiente de atrito, bons projetos hidráulicos e rede bem monitorada/operada resultam em menor consumo em bombeamento.

Em ganhos indiretos, os objetivos a serem seguidos são a diminuição de perdas por vazamentos (podem ser da ordem de 1 a cada 1.000 m de rede) e o uso racional da água poupando o conteúdo energético associado a cada m3 de água. Instrumentos gerenciais fomentam melhor gestão e benchmarking entre usuários residenciais e entre linhas de produção ou turnos de uma fábrica. Assim, a medição individualizada em condomínios promove rateio justo e abate em média 30% dos gastos. Já a telemedição permite detectar prontamente tendências e anomalias de consumo e desperdícios. Além disso, a promoção da água de reúso e o aproveitamento da chuva reduzem mais a energia do que a adução de água de mananciais distantes e em cotas mais baixas.

No capítulo das fontes alternativas e da geração própria há um rol interessante de oportunidades que algumas empresas já perseguem. O aproveitamento de desníveis em represas e túneis para PCHs é uma dessas oportunidades. A paulista Sabesp, por exemplo, licitou PCHs na saída do túnel 5 e entrada da ETA Guaraú, no sistema Cantareira, com potência de 6,8 MW. A mineira Copasa tem PPP no sistema rio Manso, sua maior barragem, para gerar 1 MW com o deflúvio.
Outra alternativa é a instalação de microturbinas substituindo válvulas redutoras de pressão (VRPs). Além de autorizada pela Aneel, há pilotos na Noruega com turbinas de até 80 kW e em Boulder, no Colorado, EUA, há sete delas. A instalação é em by-pass das VRPs, que funcionam em reserva. Só a Sabesp possui cerca de 1.000 VRPs.

As medidas não param por aí. Vale lembrar da geração de energia no período de ponta: as elevatórias de esgoto contam com geradores a diesel para evitar extravasamento nos apagões, mas há a oportunidade de acionar na ponta e fornecer para a rede geradores a etanol de 250 kW a 500 kW, mais silenciosos e menos poluentes, aceitáveis para a vizinhança. A queima de biogás de biodigestores e lodo de ETE são uma realidade: a Copasa usa 12 microturbinas Capstone de 200 kW na ETE Arrudas, gerando 1,1 MW médios para consumo próprio.

Mesmo nas atividades de apoio há formas de exploração. Usar aquecedor solar para água quente na lavagem de centrífugas de adensamento de lodo, como na ETE Taubaté, ou para os vestiários, como na ETE Bragança Paulista.

Enfim, a gestão da energia no saneamento envolve muitas oportunidades e várias tecnologias já estão disponíveis. Há ainda novas fronteiras, como a reciclagem de escuma gordurosa acumulada no decantador primário de ETEs e a produção de algas ricas em ácidos graxos em lagos rasos com esgoto diluído, em ambos os casos para a produção de biodiesel. É preciso, porém, apostar sempre na tecnologia dentro de um cenário de mudanças climáticas em que economizar energia é a palavra de ordem.

Marcelo Morgado, engenheiro químico formado pelo Instituto Militar de Engenharia, é consultor da GO Associados

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