Opinião
Tecnologia e inovação: os desafios de desenvolver uma indústria do zero
Quando o governo federal acenou com a possibilidade de realização de leilão exclusivo para a fonte eólica em meados de 2008, a principal expectativa do mercado era que a iniciativa pudesse estimular o crescimento de uma indústria ainda incipiente no Brasil. Com o potencial dos ventos brasileiros e a perspectiva de que focar em novas fontes renováveis poderia levar flexibilidade ao grid, o investimento na energia eólica parecia adequado e bastante alinhado à realidade do País, ainda que o caminho a ser percorrido no decorrer dos anos seguintes não fosse necessariamente fácil.
Desenvolver uma indústria a partir do zero traz uma série de desafios, sobretudo quando essa indústria requer inovações tecnológicas constantes e altíssimo nível de qualificação de seus profissionais. Neste sentido, cabe analisar as oportunidades criadas a partir dos desafios que se apresentaram no decorrer do percurso. Afinal, foi a partir da fixação de normas para nacionalização de componentes eólicos que empresas e profissionais de fora foram atraídos para o Brasil, criando as condições adequadas para a realização de investimentos de longo prazo e, consequentemente, para o desenvolvimento de mão de obra local e qualificada.
Visto hoje, esse movimento se mostrou fundamental para dar suporte ao crescimento da indústria e criar as bases para a resolução de gargalos que limitavam uma expansão em ritmo mais acelerado. Se hoje podemos apontar o Brasil como uma potência no setor, isto somente foi possível por causa da chegada de empresas e profissionais de ponta que introduziram aqui o que havia de mais revolucionário e inovador em mercados mais maduros.
Exemplo prático disso é que elementos que integram o que conceitualmente chamamos de indústria 4.0 passam a integrar as turbinas comercializadas no mercado brasileiro. Hoje, avanços em software permitem prever a direção e velocidade dos próximos ventos, fazendo com que hub e pás se movimentem do modo mais adequado para garantir a máxima taxa de conversão de energia. Paralelamente, os aerogeradores mais modernos começam a combinar hélices mais leves e resistentes com áreas de varredura maiores, também assegurando maior eficiência na captura dos ventos e na sua conversão em eletricidade.
Esses são exemplos de inovações feitas lá fora e que, com o desenvolvimento da indústria brasileira, aos poucos foram introduzidas no mercado local. É de se esperar, contudo, que aos poucos o inverso aconteça, tendo o Brasil papel preponderante no desenvolvimento de novas tecnologias. Essa mudança de fluxo pode inclusive ser acelerada com a chegada de novos centros de pesquisa e desenvolvimento que contemplem estudos no setor eólico, a exemplo do que já ocorre no Rio de Janeiro no centro de pesquisa da GE e de outros desenvolvedores de tecnologias para o segmento energético.
Visto dessa perspectiva, pode-se acreditar que a partir dos próximos anos o Brasil desponte como um dos líderes em inovação no setor e se posicione como um exportador de tecnologias. Ainda que por ora este cenário seja apenas uma projeção, se analisarmos o atual estágio da indústria eólica no País constataremos que essa realidade pode estar bastante próxima. Inovações tecnológicas somente são possíveis quando há cenários desafiadores à frente e investidores ávidos por novidades, ambas características inerentes ao mercado local e que ficaram ainda mais evidentes a partir da regra de nacionalização de componentes eólicos.
A base para uma indústria competitiva e inovadora passa necessariamente pela atração de talentos e investidores externos e pelo intercâmbio de conhecimento e experiências. O caminho à frente é promissor e o Brasil parece estar na direção certa ao investir na indústria local, o que será fundamental para consolidar o País como um dos protagonistas no desenvolvimento da indústria eólica global.
Rodrigo Ferreira é diretor de Suprimentos da divisão de Energias Renováveis da GE