Opinião

De certificadoras para incubadoras

As certificadoras são fruto de uma política de prioridade da fiscalização, em vez do desenvolvimento por competitividade

Por Redação

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Os trabalhos das Certificadoras de Conteúdo Local são intensos, volumosos e detalhados. Incluem analisar documentos, processos, logística de bens e serviços para equipamentos e sistemas para petróleo. Verificam, fiscalizam, necessitam entender cada parte e peça para inferência de origem e quantificação do que é nacional. Atualmente, seriam 37 empresas credenciadas pela ANP para executar a Certificação de Conteúdo Local.

Uma competência interessante, que atende a regulação atual, porém de pouca produtividade para o país. As certificadoras são fruto de uma política de prioridade da fiscalização, em vez do desenvolvimento por competitividade. Têm base na proteção de mercado fornecedor, explícita ou não, por regras de governo, temporais, com a denominação de Conteúdo Local nas Licitações de Blocos Exploratórios, que se apoiam na exploração de recursos naturais nativos. Oscilam em ciclos de montagem e desmontagem de conhecimento, como nos tempos da “nacionalização” das décadas de 70/80 versus a abertura na década de 90, depois novamente com o “conteúdo local” em 2000 versus a recente crise atual de negócios em 2014.

Aparentemente, há um ambiente diferente do resto do mundo em O&G no Brasil, apesar de haver um potencial petrolífero muito interessante. Existe concentração de operação em poucos, demandas com alta flutuação, carência de pesquisa operacional objetiva, influências políticas nas decisões empresariais. Também há poucos operadores intermediários em tamanho, a maioria é de gigantes e não operadores muito pequenos. Os fabricantes mais duradouros são sobretudo estrangeiros com plantas locais. Os nacionais frequentemente são da segunda ou terceira camadas e de assuntos nem sempre tecnológicos. Parcela dos integradores é generalista, atuando mais como articuladores de negócios do que como parte da indústria fabril local contínua. O Brasil exporta muito pouco do que produz em O&G, quando se fala de bens e serviços.

Feita uma tentativa de diagnóstico, segue uma proposta para discussão. As certificadoras poderiam se tornar incubadoras de fabricação local. Descobrindo e revelando os gaps comerciais e tecnológicos, analisando demandas, propondo soluções, arranjos produtivos, conectando investidores, universidades, encaminhando pesquisa operacional objetiva e com viés de resultado. Com a competência já adquirida, por conta da experiência em campo das fiscalizações de conteúdo local, poderiam se tornar mais desejados e sobreviver por tempo mais longo, alavancando a indústria local. Como remunerar essas tarefas? Pelas Associações de Classe? Pelas Federações de Indústria? Pela Cláusula de P&D? Pelo IBP, Onip? Por resultado? Migrando da fiscalização para o desenvolvimento? São detalhes de como fazer, sem dúvida não haverá dificuldades em suportar a iniciativa pelos resultados potenciais aparentes.

Planejar uma passagem da atividade puramente fiscalizadora para uma atividade alavancadora de negócios locais seria um início de uma fase de desenvolvimento por competitividade, suportando uma política industrial a ser discutida e aprovada. Trocar a visão “pelo retrovisor da indústria” e passar a “enxergar as curvas e aclives à frente”.

Um trabalho recente feito pelo Sebrae-RJ organizou um mapa de conexões da Cadeia de Valor (Value Chain) e da Cadeia de Suprimentos (Supply Chain) de O&G. Cada uma com o desdobramento suficiente de três níveis e focalizando a resolução de gaps tecnológicos, comerciais e transversais dessa enorme atividade upstream. Esta poderia ser uma das bases do trabalho proposto, um plano de migração, um programa objetivo de solução competitiva de espaços industriais ainda incompletos.

Uma vez que os fabricantes locais têm muito mais chances iniciais na segunda e terceira camadas da Supply Chain, os esforços poderiam estar nos pequenos e médios, pelo menos como partida. Isto porque, como exemplo, em uma focalização efetuada em subsea, observa-se que todas as empresas fabricantes e instaladoras de primeira camada são estrangeiras com plantas ou bases no país. Assim, no primeiro momento, os espaços de maior potencial seriam os fornecedores de fornecedores, ou seja, o que se chama de fornecedores de segunda e terceira camadas.

As listas de empresas e serviços podem estar incompletas, são uma primeira versão e certamente requerem complementações.
De certificadoras para incubadoras, uma proposta apenas.

Armando Cavanha F.         
cavanha@live.com

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