Opinião

Desoneração tributária da indústria de óleo e gás natural

Por Redação

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Há muito se discute a desoneração tributária da produção nacional como forma de torná-la mais competitiva em relação aos produtos importados destinados principalmente ao setor de petróleo e gás natural. Tal desafio esbarra na forma de resolver questões como equalizar os produtos nacionais e os importados (que não pagam PIS e Cofins) e no tratamento dado aos equipamentos brasileiros destinados a plataformas estrangeiras e nacionais.

Em que pese o consenso quanto à desoneração de ICMS, Imposto de Importação (II) e IPI para os equipamentos nacionais, o setor produtivo de óleo e gás natural, da mesma forma que os demais setores produtivos nacionais, carrega uma pesada carga tributária que despreza os efeitos econômicos positivos do desenvolvimento de toda a cadeia produtiva.

Os efeitos diretos da desoneração sobre o mercado são vários, destacando-se :

i) redução de preços sobre bens e serviços;

ii) aumento da capacidade de financiamento das empresas e indústrias;

iii) geração de empregos e renda.

Os anúncios recentes sobre os resultados, ainda que primários, da exploração de petróleo na camada pré-sal apontam para uma atividade promissora e com capacidade de sustentabilidade para o país. Isso reforça a tese de revisão das regras atuais para o conteúdo nacional no maquinário, desonerações tributárias e linhas de financiamento em condições compatíveis às oferecidas no mercado internacional, de modo a manter competitiva as atividades nas demais bacias sedimentares de menor rentabilidade, em especial aquelas de economicidade marginal.

Se concordarmos com o fim da era de baixo preço do petróleo, o pré-sal traz um bom alento para o Brasil. A partir das descobertas de petróleo em Tupi e Iara, são especuladas reservas de mais de 60 bilhões de barris, capazes de gerar, no médio prazo, uma produção média de 4 milhões a 5 milhões de barris/dia. Neste nível de produção, pode-se pensar, num futuro próximo, no Brasil exportando 2 milhões de barris/dia. Isso significa, considerando que as cotações dificilmente cairão abaixo dos US$ 90 há previsões de bater a casa dos US$ 200 –, uma receita estimada de US$ 65 bilhões por ano em exportação. Mantida esta receita por 15 anos, o que não é uma previsão utópica, estamos diante de US$ 1 trilhão.

Pergunta-se: toda essa previsão de receita com o petróleo do pré-sal estará amparada pelos benefícios da desoneração às exportações, considerada uma das políticas públicas estratégicas? Que equilíbrio de forças terão os campos em estágio avançado de produção onshore, ou as áreas inativas com acumulações marginais?

O peso do aço

A indústria de óleo e gás natural, entre outras do setor produtivo, tem impactos diretos do mercado de aço. Como entender que um país como o nosso, com reservas de minério de ferro similares às da China, apresente uma produção de 1/6 do aço que produzem os chineses, obrigando o setor de transformação à importação de aços, comuns e especiais?

Sem incentivos ou uma ampla revisão para desonerar o setor de bens de capital, os editais das rodadas de licitações elaborados pela ANP incluem a obrigatoriedade de as empresas vencedoras cumprirem um mínimo de conteúdo nacional em bens e serviços. Esta mesma obrigação apareceu mais recentemente nos editais da Petrobras para compra de navios e plataformas no país e para afretamento de equipamentos, como as sondas, fabricados com um mínimo de componentes brasileiros.

Para assegurar a descoberta de petróleo é preciso uma campanha anual de perfuração de poços minimamente satisfatória, e isso significa consumo de grandes quantidades de aço na construção de equipamentos, dutos, plataformas, ferramentas etc.

A indústria nacional do petróleo ainda é altamente dependente do fornecimento externo e pouco atrativa para o desenvolvimento de um parque fabril voltado às necessidades do setor, como, por exemplo, de ferramentas de perfuração (brocas, drill pipes, drill collar).

O IPI incidente sobre o aço nacional e produtos derivados é de 5%. Sobre este valor acrescenta-se o II nas compras externas de materiais destinados à atividade exploratória. Em que pese o IPI ter sua regra matriz exteriorizada através da não-cumulatividade e da extrafiscalidade, a transformação do aço em produto acabado tem incidência de ICMS, que por sua vez passa a ser cumulativo, onerando significativamente o produto final. Dessa forma, é fundamental desonerar por completo os investimentos, aumentar a transparência do sistema tributário e resolver a questão dos créditos tributários que resultam da cobrança do ICMS.

Pré-sal para desoneração tributária

Ora, se há inúmeros desafios para identificar sabiamente onde e como investir os recursos oriundos da exploração das grandes reservas do pré-sal, por que não incluir no rol de desejos que uma parte desses recursos seja canalizada para suportar as atividades exploratórias e de desenvolvimento da produção nos campos em terra, sobretudo aqueles com acumulações marginais e em bacias maduras, onde os benefícios socioeconômicos são imediatos e perceptíveis às comunidades onde se localizam esses campos?

O custo marginal de produção ou de elevação do Fator de Recuperação (FR) nestas áreas é sempre crescente. Bacias maduras, como o Recôncavo, já demandam técnicas de recuperação avançada (EOR – Enhanced Oil Recovery), como injeção de CO2 miscível, nitrogênio ou biopolímeros.

Por outro lado, os desafios exploratórios em novas bacias terrestres consideradas fronteiras tecnológicas, como Rio do Peixe, Parnaíba e São Francisco, exigem um mínimo de conhecimento geológico, obtido de levantamentos sísmicos, preferencialmente 3D. Esses dados devem ser supridos em quantidade e qualidade de cobertura pela própria ANP. A agência, porém, passa por um contingenciamento orçamentário imposto pelo governo federal que impede que os recursos gerados pela própria indústria, como os bônus pagos nas licitações, por exemplo, sejam reinvestidos para o desenvolvimento do setor de óleo e gás nacional.

Como desoneração, a redução das alíquotas de royalties para as áreas inativas com acumulações marginais, nos editais a partir de 2005, representa significativo avanço no sentido de desonerar sem necessariamente abdicar de resultados. O Gráfico 1 mostra o impacto das alíquotas dos royalties na taxa interna de retorno (TIR) dos projetos de áreas com acumulações marginais.

Diversos outros países utilizam uma política de redução de royalties, e até mesmo royalty negativo, para fomento de atividade em determinadas regiões.

Considerando estes cenários e as oportunidades do pré-sal ou mesmo de campos de alta rentabilidade, a desoneração poderia vir na forma de investimentos com os recursos dos royalties, aplicados com maior intensidade na obtenção de dados sísmicos pela ANP, ou com a obtenção de licenças ambientais, que invariavelmente extrapolam os prazos regulamentares, para o início das atividades exploratórias. Esta forma de desoneração dispensa os artifícios dos subsídios ou as renúncias fiscais, em que a diferença de arrecadação acaba recaindo sobre a sociedade.

ICMS diferido

Por fim, há de se considerar também a necessidade de um entendimento dos estados produtores de petróleo de que é preciso haver um diferimento de ICMS nas vendas de petróleo bruto, qualquer que seja o ponto de entrega no estado produtor. A exemplo do que já ocorre na Bahia.

A propósito deste entendimento, cabe registrar a edição do Decreto 45.362/2000 pelo governo do estado de São Paulo, que desonerou “Insumos, Materiais e Equipamentos Destinados à Indústria Naval e Pesquisa e Lavra das Jazidas de Petróleo e Gás, enquanto igual benefício for concedido pelos Estados do Rio de Janeiro e do Espírito Santo”. Ora, independentemente de configurar uma disputa fiscal, os três estados assimilaram a validade dessa renúncia.

Um exemplo da desoneração sobre a TIR para o setor de petróleo e gás natural, considerando apenas as incidências tributárias sobre o lucro das empresas e o ICMS, é mostrado no Gráfico 2.

Vários estudos mostram que as taxas de retorno vão diminuindo com o tamanho do campo, e que nos campos menores (áreas com acumulações marginais) essa taxa de retorno chega a ficar bem no limite da economicidade. Inclusive chegando a ser inviável, se houver a incidência de impostos sobre os investimentos.

Embora o governo invariavelmente alegue perda de uma substancial parcela de receita quando desonera os investimentos do setor, quando não o faz torna alguns investimentos inviáveis. E isso, para o governo, pode não ser uma alternativa válida, já que é sabido por todos que a indústria petrolífera traz diversos benefícios para as regiões onde está inserida, muitas vezes executando obras de infra-estrutura de responsabilidade do estado, tais como estradas e eletrificação.

Sem dúvida alguma, a cadeia produtiva do petróleo e gás natural terá benefícios significativos com a desoneração, principalmente com impostos cumulativos como o ICMS e de encargos sobre lucro, o que ampliará os benefícios socioeconômicos para regiões onde se localizam os seus projetos.

As arrecadações de royalties e uma adequada reversão de parcela desta arrecadação para a própria atividade trarão sem dúvida nenhuma enorme contribuição para a sustentabilidade das atividades, sem, contudo exigir renúncia fiscal ou subsídios à indústria.

Normando Paes é presidente da Panergy e da Associação das Empresas de Petróleo e Gás Natural Extraídos de Campos Marginais do Brasil (Appom)

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