Opinião

Energia elétrica da cana também precisa de política setorial

Por Marcos Jank, presidente da Unica, e Adézio Marques, presidente do Ceise Br     

Por Redação

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Os resultados dos dois últimos leilões de energia elétrica, promovidos em 17 e 18 de agosto pelo governo, deixaram em seu rastro uma certeza: assim como o etanol, a bioeletricidade também precisa de uma política setorial para se desenvolver na matriz energética brasileira.

No leilão de energia nova A-3, a bioeletricidade da cana foi responsável por somente 4,4% do total da energia comercializada. Já no leilão de energia de reserva, a bioeletricidade da cana representou apenas 5,1% da energia comercializada. Ao todo, foram dez projetos, de um total de 81 projetos cadastrados inicialmente que, se aprovados, representariam 4.580 MW, ou 41% da potência instalada da UHE Belo Monte.

De 2005, quando ingressou em leilões regulados, até 2010, a bioeletricidade teve uma evolução de quase 700% no volume de energia vendida para o setor elétrico. Nos últimos anos, todavia, a contratação tem sido pífia, o que fatalmente abrirá um buraco no crescimento dessa fonte em 2014 e 2015, já que a falta de regularidade na contratação hoje se reflete sempre três anos depois,quando a energia começa de fato a ser entregue.

O modelo de leilões genéricos, que misturam fontes não comparáveis, explica boa parte do desempenho pífio da energia da cana nos dois últimos leilões. No A-3, a bioeletricidade concorreu diretamente com a fonte fóssil gás natural e a eólica, enquanto no leilão de reserva a concorrência se deu com as eólicas.

A competição entre fontes busca a modicidade tarifária, ou seja, o menor preço a ser repassado nas tarifas para o consumidor final. No entanto, a competição ocorre em uma licitação pública, na qual todos disputam entre si pela mesma demanda, mas as condições institucionais e os contratos são diferentes, com cláusulas e condições bastante desfavoráveis, quebrando a isonomia competitiva que deveria ser um principio fundamental de licitações públicas.

Mesmo a modicidade tarifária obtida via leilões, com preços cada vez menores, também tem de ser observada com cuidado. É necessário avaliar as consequências no longo prazo, pois essa modicidade é conseguida com uma oferta estruturada, e a falta de política setorial com certeza promoverá o encolhimento da indústria da bioeletricidade no longo prazo e, portanto, da oferta potencial no setor elétrico.

Considerando-se a atual capacidade da indústria da cana-de-açúcar, a biomassa sucroenergética tem hoje capacidade para instalar algo como 500 MW a 600 MW médios por ano. Em 2010, porém, contratou-se apenas 191 MW médios bioelétricos nos leilões em que a fonte participou. Agora, em 2011, foram 81 MW médios no A-3 e no LER. A racionalidade econômica é implacável: essa indústria encolherá no futuro, algo que, aliás, já estamos constatando, restringindo a oferta potencial disponível para o setor elétrico.

Mantendo-se a política de leilões genéricos, não isonômicos, quando precisarmos resgatar o potencial da bioeletricidade no futuro vamos esbarrar na capacidade produtiva da indústria, que seguramente será menor no longo prazo. Não podemos construir a indústria de bens de capital de uma fonte de geração à custa da desarticulação de outra fonte, no caso a biomassa, cuja cadeia produtiva é genuinamente nacional.

Os leilões no ambiente regulado deveriam ser específicos por fonte ou regionais, levando em consideração o potencial de cada fonte ou região. No caso da biomassa de cana, o potencial está sobretudo na região Centro-Sul, que é o maior centro consumidor de energia elétrica do país (77% do consumo nacional).
Um último ponto importante a ser considerado é o papel da bioeletricidade na expansão da oferta de etanol.  Energia e etanol são produtos sinérgicos. Se fechamos a porta para a bioeletricidade, estaremos desestimulando também a tão necessária expansão do etanol no Brasil. Uma política setorial adequada para a bioeletricidade sem dúvida colaborará também para a expansão da produção do etanol e do açúcar.

Marcos Jank é presidente da União da Indústria de Cana-de-Açúcar (Unica) e Adézio Marques é presidente do Centro Nacional das Indústrias do Setor Sucroenergético e Biocombustíveis (Ceise Br)

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