Opinião

Guerra cobra seu preço

As atuais condições do mercado de petróleo sinalizam uma possibilidade de escassez na Europa, com os países do Oriente Médio elevando sua produção de forma muito lenta e a Rússia com claras dificuldades de escoamento

Por Pedro Souza

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Se o conflito se estender ainda mais, a Europa tende a necessitar de novas fontes energéticas, enquanto a Rússia deve buscar novos mecanismos para escoar sua produção. Enquanto esse desequilíbrio não for solucionado, as novas altas de preço serão a tônica da indústria nas próximas semanas.

Com a destruição de parte da infraestrutura logística da Ucrânia pela Rússia, as dificuldades de escoamento das commodities russas, além das sanções econômicas promovidas pelos Estados Unidos e seus aliados europeus da Otan, geraram um impacto imediato em todas as economias do mundo, seja a inflação de diversos produtos, principalmente das commodities da Rússia, com grande destaque para o petróleo e o gás natural.

A Rússia é um dos grandes exportadores de diversos produtos primários, como trigo, alumínio e paládio, principalmente para os países industrializados, os quais condicionam a fabricação de outros bens, desde alimentos processados até catalisadores de veículos movidos à gasolina. Dessa forma, as complicações para as exportações russas afetam não apenas a inflação das próprias commodities, como também dos bens industrializados que utilizam esses insumos. Esse quadro se replica para o petróleo.

Em 2020, a Rússia era responsável por 12% da produção global de petróleo, 11% das exportações e por quase 8% da fabricação de combustíveis, de acordo com dados da petrolífera britânica BP. Boa parte dessas exportações de petróleo e derivados se destinam a países desenvolvidos e para a China. No caso da Europa, cerca de um quarto do consumo de petróleo é atendido pelos russos.

Desde o início da guerra, com as dificuldades logísticas atingindo não apenas a própria Ucrânia, como também o acesso ao Mar Negro, onde a Rússia concentra seus ataques, surgiram obstáculos severos para o transporte do petróleo O quadro se agravou com o receio de transportadores levarem seus navios até a região para buscar o produto e, mais, com as sanções financeiras impostas à Rússia que dificultam a própria operacionalização da venda física do petróleo.

Os maiores compradores do petróleo russo já não estão obtendo as garantias dos bancos ocidentais ou conseguindo navios para transportar o petróleo russo. Na última semana de fevereiro, três grandes compradores de petróleo da Rússia tiveram suas compras inviabilizadas em razão da ausência de cartas de crédito que deveriam ser fornecidas por bancos ocidentais.

Associado a esse processo, os grandes produtores do Oriente Médio têm elevado sua produção aquém do esperado. No último dia 02 de março, a Opep+ - grupo que envolve a Opep e outros parceiros, incluindo a própria Rússia – anunciou um aumento de apenas 400 mil barris por dia, o que representa somente 15% da capacidade ociosa do bloco e mantém a recuperação da oferta num ritmo muito lento. Antes desse aumento, a produção da Opep+ já estava “a mais de 1 milhão de barris por dia distante de sua meta”, disse Andy Lipow, analista de petróleo e presidente da Lipow Oil Associates em Houston.

Para a Opep+, o objetivo atual é estabilizar os preços em patamares elevados, mas sem grande volatilidade. Neste sentido, a Arábia Saudita e os Emirados Árabes Unidos não têm o interesse de excluir a participação russa do mercado, ao contrário, buscam retomar a oferta de forma coordenada, administrando as cotas físicas de petróleo e o aumento dos preços.  Observa-se, portanto, que não há interesse em estrangular a indústria russa.

Está claro que a redução das entregas físicas de petróleo russo não deve ser compensada pelo Oriente Médio, fato que irá impulsionar uma alta significativa do preço do petróleo tipo Brent, referência na Europa, onde o consumo depende, fundamentalmente, de russos e árabes. Enquanto esse cenário persistir, o mundo seguirá assistindo às novas altas de preço.

Pedro Souza é líder de O&G da consultoria internacional Bip.

Rodrigo Ferreira é consultor sênior de O&G  da consultoria Bip.

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