Opinião
Ilhas de excelência
Um único operador concentrou o conhecimento, a pesquisa, a formação, em uma organização apenas. Apesar da excelência da empresa, não deixava de ser em um mundo monofônico
Ao mesmo tempo que passamos por um momento delicado em política e economia, o país convive com ilhas de excelência que fazem a esperança de uma retomada de novos patamares produtivos. Por exemplo, o jovem mundo da Geologia e Geofísica – G&G no Brasil, que tão bem proporcionou reservas significativas de hidrocarbonetos para a nação.
Investimentos sistemáticos em capacitação foram decisivos para se ter atualmente um nível comparável ao de outros centros mundiais. Historicamente, por insistência de gestores de E&P da Petrobras das décadas de 70/80, foram treinados centenas de profissionais de G&G no exterior, hoje referências. A constância de projetos e experiências consolidou ainda mais esta capacidade diferencial na empresa. Porém não fora dela, não no restante do país na mesma intensidade.
Segundo o geólogo Paulo Johann, da Petrobras, o primeiro geólogo formado no Brasil data de 1960. O primeiro geofísico, de 1989. As primeiras descobertas no Brasil datam de 1938, enquanto 100 anos antes já ocorriam em outros locais do mundo. Portanto, uma formação local novata, iniciante.
Um único operador concentrou o conhecimento, a pesquisa, a formação, em uma organização apenas. Apesar da excelência da empresa, não deixava de ser em um mundo monofônico.
Considerando Aquisição, Processamento e Interpretação como os três processos da Geofísica de Petróleo, sendo os dois primeiros terceirizáveis para provedores e equipamentos estrangeiros, o último deles se caracteriza por ser interno a cada empresa de O&G.
Em uma visita realizada à UERJ, ao Laboratório de Interpretação Sismoestratigráfica, o Professor Hernani Chaves apresentou uma iniciativa pioneira, quase que única, configurada com inteligência e arrojo. Perto de 30 estudantes por ano são formados em Interpretação Sísmica, em um ambiente tecnológico compatível com a indústria mundial atual, com alunos de empresas de O&G e de prestadores de serviços especializados.
O patrocínio é da empresa Statoil, norueguesa que utiliza 3 ou 4 vagas para empregados seus, das 30 posições. A ANP reconhece o uso da cláusula de P&D para o projeto da empresa de petróleo aplicante. O software é fornecido pela empresa Schlumberger, além de outras também, neste conjunto produtivo. Com isso, professores de alta iniciativa montaram um sistema de ensino que tem chamado a atenção da comunidade de G&G. A UERJ oferece uma visão integradora e de alto interesse para as empresas, o profissional intérprete em sismoestratigrafia, bastante requerido pelo mercado upstream de petróleo. É o “core” de G&G, no qual se fundem vários conhecimentos e é finalizada uma etapa importante e decisora do sistema exploratório de petróleo. Aplica-se para o Desenvolvimento da Produção – D&P e até a Operação da Produção – O&P, com o monitoramento permanente de reservatórios.
Dos alunos que concluem o curso, cerca de 50% retornam para as empresas de origem, que investiram em tempo e recurso nesse treinamento, enquanto os demais são absorvidos pelo mercado.
O próximo desafio dessa equipe de professores quem sabe seja o de ofertar às empresas de médio e pequeno porte de O&G os serviços de interpretação sísmica, por demanda, aproveitando os alunos em projetos reais, treinando e ao mesmo tempo entregando resultados.
Empresas menores não conseguem manter um quadro fixo para tudo, ocorrendo então momentos em que um serviço técnico/científico externo qualificado e confiável se torna uma solução local atrativa. Um modelo que americanos e europeus utilizam com maestria em diversos segmentos de negócio, quando acoplam consultoria ao treinamento, criando um binômio sinérgico, aumentando a capacitação e conectando a indústria e a universidade de forma pragmática. Também qualificam os produtos que as empresas recebem da universidade acima de padrões simplesmente comerciais. E reduzem as teses sem objetividade, substituindo-as por trabalhos realistas e recompensáveis.
Este Brasil aqui descrito da UERJ é diferente daquele outro em fase temporariamente difícil. A força dessas montagens intelectuais e estratégicas é promissora. A cláusula de P&D, da ANP, quando direcionada para estes investimentos em conhecimento estruturante, se torna visivelmente útil, atrativa e oportuna para um Brasil melhor. Provavelmente há outras ilhas de excelência como esta, temos a obrigação de evidenciá-las.
Mecanismos assim poderiam estar multiplicados pelas Universidades brasileiras, não só no G&G de Petróleo, mas em diversas sequências produtivas que demandam capacidade diferencial. Ainda mais para as empresas nacionais que estão em formação e apostam em sucesso pelo conhecimento. Uma quebra de paradigma, em aderência ao natural ambiente de múltiplos operadores, que provavelmente estará cada vez mais presente.