Opinião

Lei do Gás: articulações e oportunidades

Por Redação

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A Lei do Gás Natural entra numa fase decisiva no processo de tramitação no Congresso Nacional. O debate iniciado no Senado teve como primeiro resultado o Projeto de Lei 6.673, de 2006. Este projeto teve o mérito de colocar na ordem do dia a necessidade de um marco regulatório para a cadeia da indústria do gás natural no Brasil, destacando seus múltiplos aspectos e complexidade (movimentação e estocagem, acesso de terceiros aos gasodutos, compartilhamento de gasoduto de escoamento da produção, comercialização etc.).

No entanto, influenciado pelas premissas liberalizantes, terminou por refletir os interesses dos grandes consumidores. A realidade do nosso infante mercado de gás, que tem na Petrobras o único investidor em dutos de transporte e o grande responsável pelo suprimento do produto, foi tratada neste projeto como uma limitação a ser superada, não prioritariamente por um marco regulatório que incentivasse os novos investimentos e players, mas pela flexibilização no uso dos ativos da estatal brasileira. O predomínio da visão dos grandes consumidores também se fez presente no capítulo da comercialização no qual, à margem das distribuidoras estaduais, se previu a criação de um mercado secundário de gás.

A Câmara dos Deputados, depois de intenso debate do Projeto de Lei 6.673, aprovou o Projeto de Lei Complementar 90, de 2007. Este projeto resultou de um esforço, por parte do relator e da Comissão, pela busca de consensos e alternativas regulatórias que contemplassem o conjunto dos agentes envolvidos na cadeia produtiva. Apesar dos avanços conseguidos em relação ao projeto anterior, terminou com importantes lacunas e dubiedades de formulação, resultantes da tentativa de superar os conflitos de interesses presentes. Em tramitação no Senado, o PLC 90 obteve na CCJ importante relatório que resgata o preceito constitucional contido no art.25, § 2º, afirmando a competência dos estados em fazer a distribuição local do gás canalizado aos usuários, garantindo, assim, estabilidade ao setor de distribuição.

Nos debates ao longo deste período as divergências se concentraram em torno dos conceitos de autoprodução e consumo próprio, gasoduto de transferência e de transporte, condições de acesso aos gasodutos de transporte e criação do consumidor livre. Na visão das distribuidoras, a autonomia dos estados na competência exclusiva dos serviços de gás, além de preceito constitucional, representa uma garantia aos investimentos, principalmente nos estados onde a malha não está consolidada. A criação do consumidor livre e demais artifícios (conceito ampliado de gasoduto de transporte, transferência ou consumo próprio) que possibilitem ao grande consumidor adquirir o gás diretamente do produtor pode inviabilizar os investimentos em expansão das redes estaduais.

O grande consumidor é que dá escala econômica. Como desenvolver os novos mercados, no conjunto do país, com interiorização e diversificação do uso do gás, sem escala? As experiências dos mercados internacionais maduros confirmam esta necessidade. Não podemos pensar e projetar o mercado de gás com base nos objetivos apenas de um restrito e seleto grupo de grandes consumidores. As distribuidoras de gás têm um papel relevante no desenvolvimento econômico e social de seus respectivos estados. A dinamização do mercado de gás é condição sine qua non para sua consolidação.

O contexto atual, marcado pelas oportunidades criadas com as descobertas do pré-sal e as turbulências causadas pela crise financeira mundial, exige um esforço concentrado dos segmentos envolvidos neste debate. Devemos perseguir uma articulação que possibilite: a) aumento da oferta de gás natural com incentivo para produção, importação, múltiplos produtores e autoprodução; b) preservação das vantagens competitivas da Petrobras, com valorização e reconhecimento dos investimentos realizados e transparência na formação das tarifas de transporte; c) incentivo à ampliação das redes estaduais de distribuição.

A Lei do Gás não deve introduzir pedágios ou direito de senhoriagem, mas garantir um marco regulatório seguro para o conjunto dos investimentos. O êxito do mercado de gás no Brasil depende dos esforços que estão sendo empreendidos nas áreas de suprimento, transporte e distribuição (com extensas malhas estaduais). A atração de novos investimentos e estímulos à entrada de novos consumidores depende da capacidade de os diversos atores chegarem a um consenso, em busca da Lei do Gás possível. A pior sinalização para o setor é a não-existência de um marco regulatório.

Davidson Magalhães é presidente da Bahiagás e vice-presidente da Associação Brasileira das Empresas Distribuidoras de Gás Natural Canalizado (Abegás)

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