Opinião
Melhores práticas?
Lei das estatais traz dificuldades às empresas de petróleo em um momento já conturbado da indústria e não traz as melhores práticas mundiais de contratação
LEI Nº 13.303, DE 30 DE JUNHO DE 2016.
Art. 1o Esta Lei dispõe sobre o estatuto jurídico da empresa pública, da sociedade de economia mista e de suas subsidiárias, abrangendo toda e qualquer empresa pública e sociedade de economia mista da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios que explore atividade econômica de produção ou comercialização de bens ou de prestação de serviços, ainda que a atividade econômica esteja sujeita ao regime de monopólio da União ou seja de prestação de serviços públicos.” (http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2016/lei/L13303.htm)
A nova legislação, que será aplicável também às empresas de economia mista na contratação de bens e serviços, inclui obviamente a Petrobras. Sendo uma empresa de petróleo, competindo com outras de porte similar ou até maiores, este regramento é significativo, já que pode reduzir a eficiência administrativa, causar atrasos de processos e provocar incertezas empresariais. Em um momento de preços de petróleo tão acanhados, sem perspectivas de elevação, onde a redução de custos é uma linha de ação imprescindível, esta legislação é pouco desejada.
As melhores práticas mundiais de procurement não estão evidenciadas nessa legislação recente. Não está clara a aplicação de conceitos básicos, até o linguajar não é o típico da indústria de óleo e gás. Também não enfatiza alianças estratégicas, exclusivas ou não; não enfoca o tratamento de fornecedores globais com regras mundiais, não contempla terceirização especializada com materiais e serviços, não força a automação de processos, compras por catálogo, entre outras tantas práticas de melhores resultados para o negócio adotadas ao redor do planeta.
As grandes empresas de óleo e gás utilizam uma sequência básica, obviamente com variações, para os seus processos de aquisição de bens e serviços:
• Estratégia do negócio;
• Estratégia de procurement (processo completo de busca, contrato, negociação, etc.);
• Matriz complexidade de mercado x criticidade do item, como consequência os enquadramentos de alianças, gargalos, longo prazo e automação;
• Táticas de compras, RFQ, RFP, RFI, DA, RA (apenas preço, técnica e preço, apenas informação, contrato direto, leilões reversos), algumas presentes na nova Lei, mas sem separação clara e sem referência a estratégias;
• Estoques em provedores de serviços integrais;
• Fornecedores globais, com regras mundiais;
• Reduzida exposição de preços, custos, nomes de fornecedores, etc., com pouca publicidade de dados internos e de processos.
A atual regra legal parece burocratizar, dar preferência à legislação do que às melhores práticas. Se não há confiança em gestores, que sejam trocados por outros que mereçam ocupar as responsabilidades de negociações e contratos − quem sabe escolhidos por critérios de competência, não de política ou amizades.
Os problemas anteriores recentes no país fizeram a Petrobras concentrar todas as compras e contratos em um único órgão interno, uma organização temporária que provavelmente em breve poderá ser revista. Para as aquisições estratégicas, não há dúvida sobre a centralização, mas este modelo não se aplica de forma geral a todas as compras e contratos de uma empresa de petróleo. Há um exagero de compensação para tentar resolver a questão de conformidade em face das crises recentes.
Aumentam-se tempos, geram-se estoques desnecessários, induzem-se incertezas para os seus decisores e o mercado externo. Alguns argumentam que, por se tratar de empresa “pública”, teria de seguir regras gerais de governo, como transparência, publicidade, etc... Uma empresa de economia mista em petróleo, que compete em oportunidades e custos com gigantes mundiais, deveria ser diferente, até porque muitas outras empresas que são alvo dessa lei nem sempre estão sob este ambiente.
Esses modelos dúbios em que o Brasil está imerso são provavelmente alguns dos fatores de aumento de tantos problemas com os quais nos defrontamos no momento, incluindo a falta de competitividade, a quantidade de colaboradores e o excesso de processos judiciais deles decorrentes.
Estariam submetidas a essas regras companhias como Shell, Exxon, BP, Total, Repsol, Chevron, entre outras? Compliance sim, regras, planos, seleção, capacitação, sem dúvida. Mas não os redutores de negócios, inibidores de aplicação livre de estratégias de negócio e procurement.
Não há dúvidas de que o Brasil vai resolver esses modelos confusos, misturados. O país irá certamente compreender as diferenças e fazer cristalinos os métodos em função de cada situação. Para breve, é o que todos esperamos.
Armando Cavanha é
professor da FGV/MBA