Opinião
PL 7401/2017 e a retomada do crescimento
Expansão programada ajuda a mitigar riscos associados ao conteúdo local mínimo, que pode desenvolver capacidade produtiva e tecnológica
Está tramitando na Câmara o PL 7401/2017 que pretende estabelecer níveis mínimos para o conteúdo local global nos bens e serviços adquiridos pelas operadoras petrolíferas (30% na fase de exploração e 50% na fase de desenvolvimento da produção). Esse projeto vem sendo criticado sob o argumento de que “a obrigação de aquisição de níveis mínimos de bens e serviços no mercado local onera os investimentos das operadoras, depreciando a competitividade das reservas petrolíferas domésticas”. Nessa percepção, o projeto prejudicará o desenvolvimento socioeconômico ao reduzir a arrecadação de tributos e participações governamentais da União, Estados e Municípios.
Essa é uma visão míope do papel da atividade petrolífera no desenvolvimento dos povos. O foco na obtenção de receitas fiscais, visando equacionar o déficit nas contas públicas, negligencia o papel da atividade petrolífera no desenvolvimento industrial local. Esse foco induz importações crescentes de bens e serviços para atender as demandas do nosso setor petrolífero. Ele nos conduzirá paulatinamente à maldição do petróleo (rentismo e desemprego urbano), que atualmente atormenta o povo venezuelano.
Os hidrocarbonetos são recursos naturais exauríveis cuja exploração gera rendas econômicas (preços menos custos técnicos de produção) muito elevadas. No Brasil, essa renda deverá se situar entre 126 e 179 bilhões de dólares no período 2020-2040. Aproximadamente, 30% dessa renda vêm sendo canalizados para os cofres públicos (royalties, participações governamentais e bônus de assinatura); os 70% restantes são repartidos entre as operadoras e seus fornecedores de bens e serviços.
As políticas de conteúdo local (PCL) na indústria do petróleo são adotadas para induzir as operadoras a agregarem valor às cadeias produtivas locais. Elas buscam orientar parcela significativa da demanda de bens e serviços das operadoras para o mercado fornecedor local. Graças a essa política, o Reino Unido conseguiu reativar sua base industrial depois de décadas de desindustrialização, e a Noruega desenvolveu capacidade industrial local para atender competitivamente o mercado petrolífero global. Essas duas experiências inspiraram o Brasil a adotar sua PCL.
Diversos estudos setoriais (IBP, ANP, grupos acadêmicos) indicam que a PCL adotada no Brasil permitiu elevar a capacidade de o parque fornecedor brasileiro atender competitivamente entre 50% e 60% da demanda de bens e serviços das operadoras, patamar significativamente superior aos mínimos propostos no PL. No entanto, a forte ociosidade do parque fornecedor de bens e serviços global, provocada pela redução dos investimentos das operadoras após a recente transformação do mercado petrolífero, acirrou a concorrência nesse segmento produtivo. Essa situação conjuntural minou a competitividade do parque fornecedor doméstico, colocando em risco a sobrevivência da maior parte de sua capacidade instalada, construída nas últimas décadas.
A expansão programada da produção petrolífera doméstica oferece condições privilegiadas para mitigar esse risco, apoiando-se na PCL. Detentor de mercado doméstico expressivo, o Brasil tem oportunidade singular para adotar estratégia de longo prazo visando retomar seu crescimento industrial assentado nessa expansão. A geração de capacitação produtiva e tecnológica não é uma futilidade socioeconômica.
Como nos ensina a experiência chinesa, o desenvolvimento econômico é um processo construído em torno dos ganhos de produtividade obtidos pela agregação de valor nas cadeias produtivas domésticas. Os investimentos das operadoras devem ter uma lógica constitutiva de cadeias produtivas que viabilizem a inserção virtuosa da indústria brasileira do petróleo no mercado global, não apenas como provedor de óleo.
O PL 7401/2017 é um passo importante, porém não suficiente nessa direção. Ele deve ser acompanhado da reativação do Pedefor com o objetivo de ampliar os efeitos multiplicadores de renda e emprego associados à cadeia petrolífera doméstica.
Adilson de Oliveira é membro do Conselho Curador da UFRJ