Opinião

Petrobras não sinaliza plano para o pós-crise

Ajustes devem criar condições para que a companhia saia na frente para o novo mundo do petróleo que virá

Por Rodrigo Ferreira

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Na quinta-feira (26/03), a Petrobras anunciou um pacote de medidas visando “reforçar a resiliência da empresa” em meio ao cenário de “múltiplas crises”. A primeira, de dimensão interna, relaciona-se à forte queda de demanda por derivados de petróleo em razão da restrição de mobilidade urbana no período de pandemia do coronavírus. A segunda, de dimensão externa, associa-se à retração da demanda global por petróleo cru e à queda vertiginosa do preço do barril do petróleo.

Esses aspectos, sem dúvida, impactam de maneira decisiva nas receitas e na rentabilidade da Petrobras ao longo de 2020. A companhia encontra, agora, um mercado em que menos países devem importar petróleo cru e no qual há um menor volume de consumo de gasolina, querosene de aviação e diesel, principalmente, em âmbito nacional.

Por conta de iminente diminuição de receita, a Petrobras lançou mão de algumas ações visando otimizar seus custos operacionais, dentre os quais cabe destacar: (i) não há reposicionamento – neste momento – no segmento de abastecimento, embora já tenha sido noticiado o processo de forte redução do processamento de petróleo nas refinarias; (ii) a redução dos investimentos programados para 2020, de US$ 12 bilhões para US$ 8,5 bilhões (sendo US$ 7 bilhões na visão caixa), em função, sobretudo, de postergações de atividades exploratórias, interligação de poços e construção de instalações de produção e refino, e da desvalorização do real frente ao dólar americano e; (iii) aceleração da redução dos gastos operacionais, com uma diminuição adicional de US$ 2 bilhões por meio, principalmente, da hibernação das plataformas em operação em campos de águas rasas, com custo de extração por barril mais elevado. A produção atual de óleo desses campos é de 23 mil barris por dia, e os desinvestimentos nesses ativos continuam em andamento.

Tais diretrizes explicitam a otimização da atuação da Petrobras nos ativos de exploração e produção do pré-sal, a manutenção de seu market share relativamente reduzido no mercado de derivados e a manutenção em “marcha forçada” do programa de desinvestimentos.

O preço do barril do petróleo despencou 54,2% nos últimos dois meses – o Brent, que custava US$ 59,34 em 24 de janeiro de 2020, fechou em US$ 27,15 no dia 24 de março de 2020 – o que ajuda a entender a redução das atividades em campos de águas rasas, onde o break-even point é mais elevado. Com a perspectiva de preços estruturalmente mais baixos – um benchmark entre as principais agências internacionais avalia que o preço médio do barril do petróleo tipo Brent em 2020 deve ficar em US$ 31 – a Petrobras deve se aproveitar dos custos de extração bastante favoráveis do pré-sal a fim de contornar essa situação.

Essa medida visa proteger a empresa dos impactos de curto prazo oriundos da queda da demanda internacional e do preço do barril do petróleo. Todavia, as demais medidas levantam dúvidas sobre como a Petrobras deve estar posicionada ao final dessa crise.

Já tem sido noticiado que a Petrobras deve reduzir de maneira significativa o processamento de petróleo nas suas refinarias. Em alguns casos, como da Regap, esse corte pode chegar a 40% da carga de petróleo processada no final de 2018. Ou seja, o setor de abastecimento não deve ser utilizado como uma forma de atenuar os impactos deletérios na exploração e produção.

O cenário de menor consumo de derivados abre uma oportunidade para a Petrobras recuperar seu market share sem elevar o fator de utilização das refinarias. No último trimestre de 2018, as importações foram responsáveis por 25,2% (590 mil barris por dia) de todas as vendas de derivados no mercado brasileiro que, naquele mês, totalizaram 2,1 milhões de barris equivalentes por dia.

Neste momento, seria adequado que a Petrobras mantivesse seu volume de petróleo refinado ou fosse capaz de adequá-lo a um patamar que pudesse absorver a participação dos importadores nas vendas de derivados realizados no mercado interno.

Cabe destacar que a petrolífera não fez menção sobre o ritmo e quais projetos devem ser impactados com a redução dos investimentos. Essa questão é crucial, pois é o que determina a capacidade de recuperação da empresa no pós-crise, bem como a sua resiliência em relação a um cenário de maior incerteza. Como já mencionado, o pré-sal é um ativo estratégico nessa conjuntura pelos excelentes resultados operacionais, assim como a preservação da “empresa integrada” para que o downstream possa minimizar as inevitáveis perdas no upstream.

Por fim, a manutenção dos programas de desinvestimentos pode não atrair os recursos esperados pela companhia, uma vez que, com o preço do barril de petróleo desvalorizado, os ativos perdem muito valor. O ideal seria seu cancelamento, pelo menos até a definição de um cenário mais estável.
Os necessários ajustes e adequações não deveriam significar simplesmente cortes e reduções de investimentos. Eles deveriam criar condições para que a Petrobras saia na frente para o novo mundo do petróleo que virá.

Rodrigo Leão é mestre em desenvolvimento econômico (IE/UNICAMP). Coordenador-técnico do Instituto de Estudos Estratégicos de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (Ineep) e pesquisador visitante do Núcleo de Estudos Conjunturais da UFBA.

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