Opinião
A regulação do gás natural e seus desafios institucionais
Por Maria D´Assunção Costa
A regulação das atividades da indústria do gás natural no Brasil é recente, e por isso exige a superação de vários desafios para harmonizar os diversos normativos, o que demanda acuidade em sua formulação. Essa regulação deve considerar a base constitucional que constitui objetivo da República Federativa do Brasil: a garantia do desenvolvimento nacional, conforme o inciso II, do art.3º. Adite-se a isso o princípio constitucional da ordem econômica, que indica como um de seus fundamentos a defesa do consumidor. Portanto, esses compromissos constitucionais são dos entes federados – União, estados e municípios –, uma vez que o atendimento do interesse público não comporta segmentação.
Além disso, os avanços tecnológicos na cadeia do gás natural, a exemplo do GNL, do GTL, do GNC e do biogás, e os diversos modais de transporte e distribuição exigem aperfeiçoamento interpretativo, tanto dos comandos constitucionais citados acima como dos objetivos da política energética, descritos no art. 1º da Lei Federal nº 9.478/97 i) promover o desenvolvimento, ii) proteger o consumidor e iii) incrementar, em bases econômicas, a utilização do gás natural.
Com este cenário, o aplicador dessas normas, seja regulador ou agente econômico, vai interpretar os preceitos da Lei do Gás (11.909/09) considerando que essa interpretação deve ser sistêmica, uma vez que essa nova lei já nasceu inserida num quadro normativo constitucional e legal de caráter compulsório. Desta forma, a Lei do Gás não está isolada na estrutura legal brasileira. Pelo contrário: quanto mais integrativa for a sua aplicação pelos formuladores de políticas públicas, mais ela atenderá ao interesse público, motivo da aprovação pelo Congresso Nacional.
É fato que até agora não há uma diretriz do CNPE sobre que políticas devem ser elaboradas pelo MME para o gás natural, embora há mais de uma década a maior crítica dos agentes econômicos seja a inexistência de uma política consensada e eficaz para esse energético. Mas o CNPE ainda não atendeu às finalidades para as quais foi criado, porque não há uma única manifestação desse órgão sobre diretrizes e comandos para uma política nacional do gás natural.
Some-se a isso a necessidade de o Poder Público definir regras claras, numa agenda regulatória federal que se conjugue e harmonize com a agenda regulatória dos estados federados. Portanto, os imperativos constitucionais citados no parágrafo primeiro deste artigo exigem da União e dos estados um trabalho conjunto e harmônico de regulação para fomentar os usos do gás natural.
Finalmente, ressaltamos ainda o fato de que a Lei do Gás inovou as relações jurídicas, que necessitam de nova regulação, exigindo dos órgãos com competência normativa o reexame das normas regulatórias publicadas antes da Lei do Gás, seja na esfera federal como na estadual, para adequá-las à nova moldura legal. E mais: harmonizar, sob a ótica regulatória, as atividades dos novos agentes da indústria do gás natural – autoprodutor, autoimportador e comercializador.
Maria D’Assunção Costa
é advogada, doutora em Energia pelo IEE/USP e sócia da Assunção Consultoria