Opinião

Regulação promotora

Compor uma política industrial em que um dos elementos é o conteúdo local deveria se iniciar por trocar multas por bônus de superação

Por Redação

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Compor uma política industrial em que um dos elementos é o conteúdo local deveria se iniciar por trocar multas por bônus de superação.

Os atuais muros e penalizações não apenas parecem funcionar mal, mas também aparentam aprisionar, restringir, isolar, dissimular e incapacitar para o futuro.

Recentemente, o governo propôs ajustar os limites mínimos de conteúdo local, reduzindo os percentuais retroativamente à sétima rodada de licitações de blocos exploratórios. A essência conceitual, porém, parece permanecer a mesma: multar. Dessa forma, o conteúdo local não muda, enruga.

Temos um conjunto regulatório que carrega três vetores aparentemente desmotivadores:
• A complexidade desnecessária (exemplo: uso da cláusula de P&D, dita complicada e com elevada subjetividade decisória);
• A visão punitiva (exemplo: conteúdo local baseado em multas; em vez de, no caso de superação, bonificar);
• A flutuação temporal das regras existentes (exemplo: as regras de conteúdo local mudam quase que a cada rodada de licitação).

Licença ambiental, conteúdo local, Repetro, calendário de rodadas de licitação, royalties. As regras estão sempre mudando, muitas vezes de forma ameaçadora, para aqueles que detêm os recursos para aplicação em projetos em solo nacional.

No caso do conteúdo local, por exemplo, os requisitos foram crescentes até pouco tempo, agora com propostas de atenuações. Complica, depois suaviza, complica novamente. São regras que nascem complexas, em vez de serem concebidas de forma simples. Nos processos de simplificação, de modo geral permanecem resíduos não desejados, quando poderiam ter sido feitas regras inicialmente simples.

Investidores, operadores, sócios ou financiadores precificam variáveis como a estabilidade, a previsibilidade, a inteligibilidade, a objetividade, a não dubiedade, a não subjetividade, etc. Na conta final, não é suficiente ter apenas uma ótima geologia, se por outro lado se costuma demorar cinco anos para fazer leilões, ou se convive com a espera de um ano para obter a licença ambiental de uma campanha de aquisição sísmica ou de perfuração.

A ANP apresentou recentemente as áreas exploratórias da 14a rodada de licitações. Informa que há um volume estimado in situ e não riscado de cerca de 50 bilhões de barris de reservas. Considerada pelos geólogos uma dádiva divina, a geologia que ganhamos é excepcional e motivadora.

Brasil, Golfo do México e Costa da África são os três mais interessantes investimentos do planeta em óleo e gás neste momento, segundo a ANP. Integram o chamado triângulo dourado. Alguns fatores, porém, aparentam roubar a atratividade do Brasil, entre eles o colapsado ambiente político e a carência de estabilidade/simplicidade regulatória e industrial.

O Brasil tem a chance de fazer mudanças essenciais, tornar-se ainda mais atrativo e confiável. Independentemente de ideologias, apenas olhando negócios, empregos, atividade, descobertas, reservas e produção. Sem deixar de acompanhar o que ocorre no mundo mais desenvolvido, de onde costumam vir os equipamentos de tecnologias sofisticadas (navios sísmicos, logging de poços, por exemplo) e os grandes players da atividade, investidores e operadores.

Ainda não deve ter dado tempo para a nova administração da ANP e o recente governo acertarem uma nova lógica industrial, o que seria algo relevante, uma virada mental. No entanto, pelos discursos que vêm sendo proferidos, há esperança de dias melhores para os negócios e o país em óleo e gás.

A política industrial poderia ser mais eficaz sem tantas multas, ameaças, punições. Construída com poucas e claras regras, estáveis, com a visão de bônus e motivação. Quando fosse o caso de punir, por falha importante, a punição deveria, sim, ocorrer com severidade e celeridade. Regulação para permitir, fiscalizar, sim, mas para motivar e gerar negócios também.
Certamente os investimentos, operações e empregos aconteceriam em maior intensidade. Parece que vão acontecer.

Armando Cavanha é professor
convidado na FGV/MBA

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