Opinião
A reviravolta é possível
Marcos Cintra comenta comenta os desafios que estarão em pauta durante 2015
Quem vivenciava a euforia do setor de petróleo e gás poucos anos atrás dificilmente acreditaria numa previsão que indicasse o cenário que vivemos hoje. Da exuberância que se exacerbou até a paixão, passamos a um clima de preocupante ceticismo. Talvez a valsa – o primeiro passo à frente, o segundo para o lado ou para trás – seja uma metáfora útil para entender o ocorrido. Após bem-sucedida abertura no final dos anos 90 seguida de notável avanço, o setor se depara com desafios para se mover adiante, ou estagnar e regredir.
Num contexto agravado pelo preço baixo do barril, o ano deve realçar problemas que o setor já vivencia e ressalta a premência de alguns temas: resgatar a Petrobras da crise de credibilidade; restaurar a confiança entre governo e empresários; apontar uma direção sustentável e racional para o conteúdo local; restituir a isonomia entre as empresas; dar celeridade ao licenciamento ambiental; garantir previsibilidade e segurança ao processo de rodadas.
A presença dominante da Petrobras em toda a cadeia produtiva (70% dos investimentos no upstream, por exemplo) indica que o setor inteiro sentirá os efeitos de sua crise. As perspectivas de 2015 dependem, assim, da velocidade e habilidade que a empresa terá para sair do apuro atual. O cenário pode ser um empurrão para que o governo encare questões espinhosas que ele próprio criou. Regras que poderiam ter um sentido à época na qual foram propostas, mas que no contexto atual dificilmente se justificam. Além de macular as condições de competição isonômica entre concorrentes, a vantagem da Petrobras de ter participação de 30% e operar todos os blocos do Pré-Sal, por exemplo,é traiçoeira, pois gera significativo risco financeiro à empresa, atrela o ritmo da exploração a seu caixa e torna os leilões pouco competitivos.
A 13a rodada ocorrerá numa conjuntura de incerteza, queda do preço do barril e competição global por investimento, com destaque para a entrada do México na disputa. A expectativa é de que a participação da Petrobras seja ainda mais moderada do que foi nas rodadas de 2013, o que abre oportunidade para empresas de diversos portes e perfis.
Ações impetradas pelo Ministério Público Federal (MPF) no Paraná, Piauí e Bahia suspenderam os efeitos da 12a rodada, justamente no momento em que precisamos acelerar a exploração de gás natural em terra. Embora focadas na proibição do fracking, tais ações impactam o negócio como um todo ao criar um quadro de insegurança jurídica que fere o cerne do modelo exploratório brasileiro: as rodadas de licitação. Evitar a realização da 13a rodada sob essa ameaça requer urgente mobilização.
A continuidade da sofisticação do parque fornecedor de bens e serviços dependerá do ritmo do programa de investimentos da Petrobras e da solução de problemas emergenciais de fornecedores. Tal cenário torna distante a efetiva capacidade de competição internacional, que exige instituir um horizonte temporal, padrões de desempenho e metas de exportação às empresas brasileiras, assim como assegurar-lhes condições isonômicas na disputa global, que passam por questões macroeconômicas, como impostos, taxa de juros e câmbio.
Considerando todas as implicações desse quadro, não é difícil perceber a magnitude dos problemas políticos a ele inerentes. Avanços dependerão de manobras ousadas que contrariam posições pretéritas do próprio governo e as providências serão interpretadas como um sacrifício não justificado dos interesses de segmentos hoje beneficiados.
Cabe ao setor resistir ao ceticismo e ver no cenário de adversidade uma oportunidade para agir sobre os problemas de curto de prazo. Em vez da crítica virulenta é mais produtivo influir na realidade. A reviravolta no longo prazo requer continuarmos, vagarosa e laboriosamente, acumulando pedra e argamassa, para criar instituições mais resistentes, construídas sobre alicerces bem estruturados e menos vulneráveis.
Marcos Cintra, executivo do setor petrolífero especializado em Economia e Gestão em Energia (Coppead-UFRJ), é mestre em Políticas Públicas, Estratégias e Desenvolvimento (IE-UFRJ)