Opinião

O setor petróleo e a retomada do crescimento econômico

Se a escolha for pelo desenvolvimento, é necessário revigorar o Pedefor

Por Adilson de Oliveira

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O Brasil tem, diante de si, uma oportunidade singular: aliar o desenvolvimento de seu potencial petrolífero a uma estratégia de longo prazo para a retomada do crescimento econômico. Para tanto, é fundamental estabelecer as diretrizes da sua política petrolífera, aperfeiçoando regras e instrumentos regulatórios, com o objetivo de explorar os desafios tecnológicos associados à exploração offshore, com a finalidade de maximizar seus  efeitos multiplicadores de renda e emprego e favorecer a inserção brasileira na economia mundial.

O petróleo é uma commodity geopolítica, determinante na inserção geopolítica dos Estados Nacionais na economia global. Seu preço de mercado é muito volátil, flutuando ao sabor de políticas adotadas pelos países da OPEP e da OCDE. As rendas econômicas geradas pela produção petrolífera são elevadíssimas, fruto da enorme distância entre o custo técnico de produção de um barril de óleo (US$ 4 a 5 no Oriente Médio; US$ 30 no Brasil) e o seu preço (US$ 50 a US$ 70).

A repartição dessas rendas entre os proprietários dos recursos petrolíferos existentes no subsolo e os agentes do mercado tem sido, historicamente, fruto de muita disputa. No caso brasileiro, a regulação setorial especifica que a parcela do proprietário dos recursos (União) seja recolhida sob a forma de royalties, participações especiais e bônus de assinatura. Os agentes do mercado, depois de ressarcidos seus custos técnicos de produção (capex mais opex), têm como benefício a diferença entre o preço de mercado e as parcelas pagas à União.

A estimativa da renda petrolífera futura e de sua repartição entre a União e os agentes é tarefa complexa, especialmente por ter que assumir tanto a produção futura de petróleo quanto seu preço. A metodologia de cenários é tradicionalmente adotada por governo e empresas para formularem políticas petrolíferas. No nosso caso, adotamos dois cenários de preços futuros e apenas um para a produção doméstica, já que há consenso de que a produção petrolífera brasileira deverá seguir crescendo nas próximas décadas par alcançar pelo menos seis (6) milhões de b/d em 2040.

Nossa estimativa é que a renda petrolífera deverá oscilar entre US$ 126 e US$ 179 bilhões no período 2020-2040. Desse total, aproximadamente 30% irão para os cofres públicos e outros 70% serão apropriados pelos agentes do mercado.

Esse volume substancial de recursos financeiros pode ser alocado para dar suporte a políticas econômicas voltadas para o curto ou longo prazo. Os países que optaram pelo curto prazo focaram sua política petrolífera na maximização das receitas fiscais, na importação massiva de bens e serviços pelas operadoras e no uso de mão de obra qualificada externa. A literatura petrolífera nos ensina que o foco no curto prazo induz a disputa entre os agentes por fatias da renda petrolífera (rentseeking), culminando na maldição do petróleo. Isto é, quando os recursos petrolíferos do subsolo se esgotam, os benefícios econômicos do período de boom petrolífero desaparecem, emergindo seus efeitos nocivos sociais e ambientais.

Alternativamente, quando o foco da política petrolífera se volta para o longo prazo, como ocorreu na Noruega, o resultado final é a aceleração do crescimento econômico. Nesta opção, a renda petrolífera é utilizada para incentivar a articulação da expansão da produção petrolífera com o aparelho produtivo local por meio da indução de clusters industriais regionais com a ativa participação de fornecedores globais de bens e serviços. Fundos públicos estruturados com as parcelas governamentais da renda são destinados ao fomento de inovações tecnológicas nos fornecedores, com o apoio de grupos universitários e centros de pesquisa locais. As exportações de petróleo são usadas como instrumento geopolítico de apoio à inserção favorável da economia nacional no mundo global.

Nossa política petrolífera está, infelizmente, focada no curto prazo. Mais ainda, os instrumentos regulatórios adotados para orientar o longo prazo estão sendo mal administrados. Os problemas desses instrumentos já foram claramente identificados, inclusive pelo TCU: (i) exigência de conteúdo local nos projetos das operadoras que são inviáveis economicamente; (ii) inexistência de uma lógica técnico-econômica articulada dos fornecedores para atender a essas exigências; (iii) foco em penalidades para as operadoras, quando o correto é a oferta de incentivos para os fornecedores.

Apesar desses problemas, é importante reconhecer que o parque fornecedor local de bens e serviços para os projetos das operadoras é bastante relevante. Estudos das operadoras, de institutos de pesquisa e o banco de dados de conteúdo local da ANP indicam que o parque fornecedor brasileiro é capaz de atender competitivamente entre 50% e 60% da demanda das operadoras. É importante notar que o parque industrial brasileiro, que já tem escala para atender a boa parte dessas demandas, deverá ter ganhos de escala crescentes com a forte expansão do offshore doméstico.

O calcanhar de Aquiles do parque fornecedor doméstico é sua limitada capacitação para inovações. Nesse aspecto, é fundamental aproveitar a instalação no Brasil de centros de pesquisa de diversos fornecedores globais para desenvolver uma política ativa de sua articulação com os pequenos e médios fornecedores locais. Para tanto, o país não pode prescindir da atuação da Petrobras, em especial de seu centro de pesquisa (Cenpes), como fonte principal de inovações tecnológicas para o offshore petrolífero.

A expansão da produção de hidrocarbonetos é consensualmente aceita como a principal oportunidade para a retomada do crescimento da economia brasileira. No conturbado contexto atual, o Brasil encontra-se em posição favorável para alcançar inserção favorável na economia global. Sua matriz energética o habilita a cumprir as metas acordadas na reunião de Paris. Seu suprimento seguro de petróleo, indispensável para uma transição energética não conflitiva, serão disputadas por nossos parceiros comerciais. Em suma, o Brasil reúne condições favoráveis para exercer liderança na transição global para uma sociedade sustentável.

No plano doméstico, o país conta com uma operadora nacional com reconhecida competência tecnológica e vasta experiência na articulação da produção de petróleo com o parque fornecedor doméstico. A substancial e crescente renda associada à expansão da produção coloca a política petrolífera diante de uma escolha: foco no curto prazo com a perspectiva de colher a maldição do petróleo ou políticas de longo prazo voltadas para o desenvolvimento econômico.

Se a escolha for pelo desenvolvimento, é necessário revigorar o Pedefor (Programa de Estímulo à Competitividade da Cadeia Produtiva, ao Desenvolvimento e ao Aprimoramento de Fornecedores do Setor de Petróleo e Gás Natural). Nesse caso, é fundamental não renegar a história. “Destruir as instituições a que o jogo de influências históricas deu corpo e que traduzem o mecanismo de suas ações constantes é destruir a Nação.” (Benjamin Disraeli)

Adilson de Oliveira é professor e membro do Conselho Curador da UFRJ

 

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