Opinião

A deseconomia de escala na distribuição de gás natural

O cenário atual incentiva as distribuidoras a manter custos operacionais ineficientes e fazer investimentos inviáveis. A distribuidora ganha, mas a sociedade não.

Por Adrianno Lorenzon

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Coautora: Clara Diniz*

A literatura econômica prevê que as revisões tarifárias de monopólios naturais devem ser implementadas de forma a buscar o equilíbrio entre retorno de investidor e modicidade tarifária. Dito de outra forma, os reguladores devem tentar emular um mercado competitivo para os monopolistas, de forma que se incentive ganhos de produtividade, redução dos custos e tarifas, mas mantendo o retorno justo aos acionistas.

No caso da distribuição de gás natural, os processos de revisão tarifária, que ocorrem anual ou quinquenalmente, têm como objetivo a definição da margem média bruta de distribuição, parcela que representa cerca de 17% do valor da tarifa final.

Apesar das especificidades observadas em cada concessionária, evidencia-se um ponto em comum: os recorrentes aumentos nos valores de margem aprovados a cada ciclo. Sobre esta percepção, cabe a análise do comportamento das margens de distribuição ao longo do tempo. Restringiu-se a análise aos últimos cinco anos (2019 a 2024). Não por opção, mas pela dificuldade de obtenção de dados. 

Este exercício objetiva entender o impacto das revisões tarifárias em relação à evolução do mercado brasileiro, a fim de evidenciar possíveis ganhos de escala das concessionárias de gás ao longo dos anos. E o resultado é surpreendente: nenhuma distribuidora analisada possui variações acumuladas negativas entre as revisões de 2019 e 2023.

Isto é, em nenhuma distribuidora há redução da margem média de distribuição (em termos reais, atualizado pelo IPCA). Pelo contrário, ao observar o cenário de valor acumulado entre as revisões do período estipulado, foi evidenciada média de 37% de aumento real, considerando dados de 13 concessionárias brasileiras. Há distribuidoras que, no período, tiveram aumento real de 74%!

Vários fatores podem ser elencados para explicar os números expostos: falta de autonomia do regulador, falta de capacitação das agências, conflito de interesse dos governos estaduais (que são acionistas das distribuidoras em muitos casos) e, principalmente, os termos dos contratos de concessão de distribuição de gás canalizado. Na maior parte dos casos, todas as alternativas acima são verdadeiras.

Conforme exposto recentemente no debate em Sergipe proposta pelo governo, os contratos de concessão de distribuição de gás preveem cláusulas que vão contra o interesse público e precisam ser examinadas. Posicionamento ratificado pelo ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira.

O cenário atual incentiva as distribuidoras a manter custos operacionais ineficientes e fazer investimentos inviáveis. A distribuidora ganha, mas a sociedade não. O gasoduto deve chegar onde efetivamente há (ou haverá) demanda. Enterrar tubo, por si só, não deve ser um objetivo, mas apenas um meio de levar o insumo com custo competitivo a quem queira consumir, de forma a não onerar os demais consumidores. Pelo contrário. Novos investimentos devem promover ganhos de escala. Reduzir o custo médio por meio de diluição de custos fixos e aumento da demanda.

Os contratos de concessão da distribuição e a regulação devem buscar a vocação do gás natural para o Brasil: baixos custos para promover o aumento do consumo, deslocando outros energéticos e elevando a atividade econômica, especialmente da indústria, que é o principal consumidor do insumo. Assim teremos um ciclo virtuoso. Isso gera emprego e renda.

*Clara Diniz é analista de energia da Abrace 

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