Opinião

O choque de energia “menos cara”

Podemos olhar o início da abertura do mercado de gás neste ano por um prisma que evidencia resultados da concorrência

Por Adrianno Lorenzon

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Três anos depois do lançamento do Novo Mercado de Gás, programa do governo federal com a promessa de um “choque de energia barata” através da redução de 40% do custo do gás, chegamos em 2022 colhendo os primeiros resultados.

De fato, os avanços legais e infralegais foram contundentes, mas a redução noticiada não foi verificada (ainda). Entretanto, podemos olhar o início da abertura do mercado de gás neste ano por um prisma que evidencia resultados da concorrência, algo exaustivamente difundido durante o processo de aprovação da nova lei do gás.

O segundo semestre de 2021 foi marcado por eventos extremos no mercado de gás. No mundo, o GNL spot e o gás negociado no mercado europeu dispararam de preço, ambos fechando o ano em aproximadamente US$ 30/MMBTU valor pelo menos 3 vezes maior que o histórico. No Brasil, apesar dos preços elevados, a importação de GNL bateu recorde para atender ao elevado despacho termelétrico fruto da crise hídrica. Ao mesmo tempo, mais da metade dos contratos das distribuidoras de gás para atendimento ao mercado cativo estavam vencendo e novos precisariam ser firmados para 2022. Neste cenário preocupante, as concessionárias estaduais buscaram opções por meio de chamadas públicas e receberam ofertas da Petrobras, mas também de outros supridores.

A proposta final da Petrobras para estes novos contratos provocava um aumento de 40% na molécula em relação aos preços de 2021 estratégia que posteriormente foi questionada na justiça com sucesso em vários estados. Já os supridores alternativos focaram esforços para pactuar com a estatal e transportadores o acesso às infraestruturas (escoamento, processamento e transporte), condição precedente e necessária para vender seu gás diretamente às concessionárias locais.

As negociações evoluíram, tanto com a Petrobras quanto com supridores alternativos. Muitos destes contratos foram recentemente publicizados pela ANP. A ABRACE está analisando todos esses documentos para entender a formação da tarifa final para o setor industrial. Mapeamos sete fornecedores alternativos com 11 contratos firmados com diversas distribuidoras. Para fins comparativos, simulamos o custo da molécula em cada contrato utilizando premissas de valores de Brent ($85/bbl), Henry Hub ($4,2/MMBTU), NBP ($25/MMBTU) e taxa de câmbio (5,60 R$/US$).

Os resultados mostram que a média ponderada pelo volume dos preços praticados pelos supridores alternativos é aproximadamente 40% inferior ao preço do contrato padrão Petrobras negociado ao fim do ano passado, e 17% inferior ao preço Petrobras dos contratos anteriores (alguns destes ainda estão vigentes e válidos até 2023). Ou seja, a entrada de novos agentes no mercado deixou o gás brasileiro mais barato, especialmente se comparado ao contrato Petrobras negociado à mesma época.

Fonte: ABRACE

Este choque de gás “menos caro” não produzirá os efeitos grandiosos calculados durante a elaboração do Novo Mercado de Gás, de reindustrialização, aumento de investimentos e geração de empregos. Há uma variável importante na equação ainda não exposta: o market share dos produtores alternativos, que é pouco superior a 10% do mercado cativo total das distribuidoras. Apesar do efeito econômico limitado em termos nacionais, os números trazem um choque de realidade ao mercado, expondo o potencial de redução de custos gerado pela concorrência.

Nem tudo são flores, contudo. A continuidade deste processo depende da entrada de novos agentes comercializadores e compradores no mercado. Há dúvidas de quanto gás natural haverá fora do portfólio Petrobras para ser negociado em 2022 e 2023, especialmente porque os contratos atuais variam de 2 a 4 anos de vigência. Se não houver nova oferta e aumento da competição, corremos o risco de estacionarmos nas condições atuais.

Cabe à ANP e ao Cade a análise deste cenário para avaliar a implementação de um programa de desconcentração da oferta o denominado Gas Release , previsto na lei 14.134/2021, com o objetivo de acelerar a concorrência e seus efeitos positivos na indústria do gás. Dessa forma, seguiremos esse ciclo virtuoso na busca pelo choque de energia barata.

Adrianno Lorenzon é diretor de Gás Natural da Associação dos Grandes Consumidores de Energia e de Consumidores Livres (ABRACE)

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