Opinião

No longo prazo... o petróleo ultraprofundo tem futuro

A crise é oportuna. Durante as baixas, ocorrem as fusões e as apostas na ampliação da capacidade de produção

Por Redação

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A queda do preço do barril e sua volatilidade chamam a atenção. O petróleo não é uma mercadoria qualquer. Por isso, o entendimento de como se estabelece o preço e seu comportamento interessam tanto. Para o Brasil, México, Angola e Nigéria, com jazidas ultraprofundas, ele tem interesse especial.

Trata-se de uma fronteira aberta onde o desenvolvimento ocorrerá independentemente do preço atual. A incerteza é um desafio. Sem paradigmas, nas ciências sociais, até os dogmas servem de ponto de partida. A precisão conceitual, a atenção ao método e abstrações simples sobre o comportamento do comprador, do vendedor e do coletor de impostos esclarecem sobre uma realidade em permanente mutação na superfície, como os preços de certas mercadorias. O entendimento, contudo, depende da descoberta dos fundamentos e de leis, que dão sentido ao movimento.

Nos últimos sessenta e cinco anos, corrigido pela inflação, o preço médio do barril foi de US$ 40; bem menor que o vigente antes do final de 2014 e, assinale-se, ele esteve mais tempo abaixo, que acima, deste valor. De fato, nos últimos 160 anos, os preços foram cíclicos e relacionados ao movimento pendular da estrutura do mercado. As rupturas de monopólios e conluios e o restabelecimento desses correspondem às quedas e subidas do preço. As crises são estudadas na busca por uma explicação endógena. Após entendida a volatilidade, revela-se a distinção entre ciclos de preço e produção. Incapaz de coordenar os acréscimos, submetida à indivisibilidade da escala e incitada por elevações de preço prolongadas, a oferta cresce à frente da demanda, em grandes saltos. A conduta desordenada dos produtores acentua as quedas subsequentes. O mesmo ocorre em todas as atividades capital-intensivas.

Os múltiplos usos asseguraram a posição do mineral no passado, mas, na década por vir, desde que não ocorram rupturas, será o transporte que conduzirá a demanda. A mobilidade das mercadorias e dos indivíduos, longe de ter sido plenamente alcançada, por algum tempo ainda, dependerá do petróleo. Por maior que seja a restrição ambiental, está em seu início a substituição da gasolina, do óleo diesel, do óleo bunker e do querosene de aviação. Em razão das perdas irrecuperáveis, o custo da substituição seria superado apenas por uma imprevisível revolução tecnológica.

A relativa rigidez da economia, alguns fundamentos e poucas estruturas de mercado esclarecem sobre os ciclos e a natureza seletiva da competição em meio instável, com permanentes oscilações de preço e crises periódicas. Meia dúzia de petroleiras privadas gigantescas sobreviveu e, hoje, elas disputam com as estatais o acesso ao petróleo do século 21. O risco, o prazo de maturação, o volume dos investimentos e o fato de ser exaurível fazem do negócio uma aposta renovada e ampliada a cada rodada, na busca por áreas inexploradas, numa expansão geográfica incansável, um continente após outro, uma bacia sedimentar após outra.

Desenvolvidas a partir de 1960, hoje, as jazidas no mar respondem por um terço da produção. O petróleo “offshore” sustentou a expansão das empresas privadas e estatais sem acesso às melhores reservas. A última fronteira são os depósitos ultraprofundos localizados no Atlântico Sul e Golfo do México. A propósito, os ciclos são conhecidos das empresas, que saíram maiores após cada crise, e as baixas não impediram a lavra no Lago de Maracaibo na década de 1920, o primeiro “boom” no Golfo do México no final da década de 1950, e na costa Oeste africana na década seguinte.

A despeito de incerto, o longo termo condiciona o comportamento do capital. Atender a uma demanda crescente exige adicionar reservas, além de repor o que foi exaurido. A crise é oportuna. Durante as baixas, ocorrem as fusões e as apostas na ampliação da capacidade de produção. Tem sido assim nos últimos 160 anos e, até 2030, não se vislumbra mudança radical. Depois de 2010, após venderem ativos não essenciais, abandonarem campos menores, reduzirem custos e dividendos, as maiores – Exxon, Chevron, Shell, BP e Total – anteciparam-se ao ciclo. Elas estão preparadas para a próxima década e dispõem de bilhões de dólares em lucros retidos, para bancar as apostas. O ultraprofundo é prioridade e, fora das águas estadunidenses, os alvos estão em poucos países: Angola, Nigéria, Brasil e México; todos na periferia.

Luís Eduardo Duque Dutra é professor adjunto da Escola de Química da UFRJ

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