Opinião
Potência reativa e o apagão de novembro de 2009
Por Cláudio de Vasconcellos Júnior, engenheiro eletricista, ex-executivo da GE e presidente da Rio Global Energy Consultoria e Representação
Quando me perguntam o que é energia reativa, uso o exemplo de Rebecca Smith, especialista em energia do The Wall Street Journal: “imagine uma cadeira suspensa no ar; MW (potência ativa) são necessários para fazê-la se mover para frente; MVAR (potência reativa) são necessárias para manter a cadeira suspensa no ar”.
O que isso tem a ver com o apagão de 10 de novembro no Brasil? A princípio, nada. Entretanto, em alguns outros apagões – como o ocorrido nos EUA em agosto de 2003 –, a conclusão de vários especialistas é que faltou energia reativa para controlar as variações de voltagem que acabaram por derrubar o sistema.
Como o sistema brasileiro é predominantemente hídrico, não se constroem usinas onde queremos, mas onde a natureza determina – o que, em geral, é bem afastado dos centros de carga. A energia gerada é transportada ao longo das linhas de transmissão até chegar ao usuário final. Caso não haja correção da voltagem e do fator de potência ao longo da linha pode haver um colapso dessa linha, semelhante ao que ocorre num ser humano com o entupimento de artérias, o que impede o sangue de circular pelo corpo.
No caso das LTs, elas ficam sem capacidade de levar a energia ativa, que move motores, lâmpadas, etc., que então não funcionam adequadamente. A correção à insuficiência de potência reativa é feita acrescentando-se duas categorias de dispositivos – estáticos e dinâmicos – para suprir a energia reativa.
Os dispositivos estáticos são bancos de capacitores, reatores, indutores, que não podem mudar rapidamente o nível de potência reativa desde que o nível de voltagem permaneça constante, e seu nível de produção de energia reativa cai quando o nível de voltagem cai. Eles, porém, não absorvem a energia reativa. Já a energia reativa dinâmica é produzida por equipamento que pode mudar com rapidez o nível de MVAR, independentemente da voltagem. Nessa categoria estão incluídos compensadores estáticos, compensadores síncronos e geradores que fornecem energia reativa dinâmica tanto produzindo como absorvendo, dependendo da necessidade do sistema.
Temos aqui um problema econômico, pois a correção da voltagem com equipamento estático é bem mais barata que usando equipamentos que fornecem energia reativa dinâmica.
Há poucos incentivos financeiros para produzir tal energia no mercado brasileiro. A Aneel até baixou resoluções garantindo reembolso aos operadores e determinando pagamento da energia reativa colocada no sistema, mas com valores pouco atrativos. Se isso mudasse estaríamos num cenário de otimização dos ativos, dando flexibilidade operacional aos operadores, e com uma outra fonte de renda.
Há outro fato: um grande número de turbinas a gás natural no Brasil estão paradas, mas poderiam estar regulando a voltagem e mantendo o fator de potência. Muitas delas estão próximas aos centros de carga, ou ao fim de longas linhas de transmissão, e, portanto, excepcionalmente bem localizadas para fazer o controle dinâmico de voltagem e fator de potência.
No apagão de 10 de novembro faltou um plano B, para que, tão logo fosse isolado o local do defeito, máquinas que estivessem em reserva girante entrassem no sistema daquela região isolada em até dez minutos. Como fazer isso? Turbinas a gás, paradas, sem consumir combustível, mas com os geradores sincronizados na rede, separados por embreagens. No caso de emergência, dá-se a partida das turbinas (colocando-se combustível) e através da embreagem a máquina começa a produzir energia ativa. Isso em dez minutos!
Então, Plano B, com reserva girante suficiente, potência reativa dinâmica e vontade política, é tudo de que precisamos para minorar os riscos de novos desligamentos de energia. Com a proximidade das Olimpíadas e da Copa do Mundo, como nação, não queremos nem o risco de um apagão contribuir para um aumento de violência ao redor do Rio de Janeiro, nem a aparência de instabilidade da rede elétrica nacional diante do mundo.
Cláudio de Vasconcellos Júnior é engenheiro eletricista, ex-executivo da GE e presidente da Rio Global Energy Consultoria e Representação