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Primo pobre do milho, sorgo é promessa na produção de etanol
Mais barato, mais adaptável a áreas de baixa pluviosidade e mais resistente a pragas, o cereal é pouco conhecido no Brasil, mas bastante cultivado no mundo. Pelas suas propriedades, começa a ganhar espaço no mercado de combustíveis renováveis

Primo pobre do milho nas safras agrícolas brasileiras, o sorgo começa a despontar como uma alternativa viável de matéria-prima para a produção de etanol principalmente em áreas de estresse hídrico, como o semiárido nordestino. No Brasil, pelo menos duas empresas, a Inpasa e a Cooperativa Pindorama, já estão ensaiando os primeiros passos para a produção de etanol com o sorgo. A expectativa de especialistas é que, com esse novo uso, a planta deixe o posto de coadjuvante e ganhe protagonismo nas lavouras brasileiras.
Na produção do etanol, o sorgo vem seguindo o rastro do milho, que está ampliando a sua participação como matéria-prima para a produção de etanol. De acordo com dados da União da Indústria de Cana-de-Açúcar e Bioenergia (Unica), na safra 2024/2025 foram produzidos 34,9 bilhões de litros de etanol, dos quais 8,2 bilhões de litros tiveram como matéria-prima o milho. O volume de etanol de milho verificado nessa safra representou um crescimento de 30,7% à produção do combustível a partir do cereal na safra anterior.
Para a Unica, a expansão da produção do etanol a partir do milho representa a possibilidade de estender a atividade a áreas em que a cana-de-açúcar não se adapta devido a condições de clima e solo e manter a oferta do combustível o ano todo, além do período típico das safras sucroalcooleiras.
Plantio de sorgo no Perímetro Irrigado Jaguaribe-Apodi (CE): mais barato que o milho, sorgo tem mesmo desempenho na produção de etanol e reduz riscos de quebras na produção em épocas de veranicos (Foto: Divulgação/Dnocs)
O sorgo oferece essas mesmas possibilidades de ampliação da oferta de etanol com algumas vantagens: tem um custo mais baixo que o milho e se adapta melhor a regiões de estresse hídrico e altas temperaturas e de solos com baixa fertilidade. “O sorgo oferece o mesmo desempenho que o milho na produção de etanol, com a vantagem de oferecer uma matéria-prima mais barata e de reduzir o risco de quebras da produção na lavoura devido a veranicos”, explica Flavio Tardin (foto), pesquisador da Embrapa Milho e Sorgo. Segundo ele, o preço da saca de sorgo normalmente é 75% a 85% do valor da saca de milho.
Outra vantagem do uso do sorgo para produzir o etanol é que resulta, do processo de produção, o DDGS (sigla de Dried Distillers Grains with Solubles), que são os resíduos do processo de esmagamento do sorgo. O DDGS é uma alternativa de alto valor proteico e de baixo custo que pode ser utilizada na alimentação animal.
Até há pouco tempo, o sorgo era plantado no Brasil como alternativa para atender somente a demanda por ração animal. O cereal é considerado uma cultura de segunda safra, cultivada depois da safra principal, quando a cultura da soja é o grande destaque. O sorgo é uma planta que tem um curto ciclo de produção e, além de se adaptar a regiões de baixa pluviosidade, é resistente a pragas. Devido a essas características, e também a um custo de produção menor, está presente principalmente em áreas de maior risco à produção de milho, que também é cultivado em uma segunda safra.
Segundo dados da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), a produção de sorgo na safra 2024/25 é estimada em 4,42 milhões de toneladas, com aumento de 2,9% na área plantada. Esta safra atingiu um volume 3,5 vezes maior que o volume da safra de 2020, quando a produção foi de 1,2 milhão de toneladas. O crescimento da produção tem se dado como reação de uma combinação de fatores, entre os quais está a busca por maior segurança no plantio de segunda safra devido à ocorrência de veranicos.
Para Paulo Bertolini, presidente da Associação Brasileira dos Produtores de Milho e Sorgo (Abramilho), a expectativa é de que a produção de sorgo no Brasil triplicará nos próximos anos, devido tanto a um esperado crescimento da demanda de usinas de etanol como da possibilidade de exportação do cereal. “As usinas de etanol a partir do milho já estão se preparando para usar o sorgo”, afirma.
Pindorama: produção pioneira em usina ‘flex’
Com 30 mil hectares de áreas produtivas, a Cooperativa Pindorama, localizada entre os municípios de Penedo, Coruripe e Feliz Deserto, em Alagoas, está realizando, de forma pioneira, a sua primeira produção de etanol a partir do sorgo. A moagem teve início em setembro de 2024 e deverá estender-se até o final de junho. A expectativa é que, neste período, sejam moídas 75 mil toneladas dos grãos da planta, com a produção de 30 milhões de litros de etanol.
Klécio Santos (foto), presidente da cooperativa, explica que o sorgo surgiu como alternativa depois de uma primeira tentativa de produzir o álcool a partir do milho. A ideia era manter a usina em atividade após o ciclo de moagem da cana, criando uma alternativa de renda para a cooperativa e seus associados. A saca do sorgo custa entre 15% e 20% a menos que a do milho e, além disso, não há diferenças no processo de extração do sorgo em relação ao adotado pelo milho, o que facilitou a substituição.
Atualmente, a cooperativa está adquirindo sorgo produzido em lavouras do Piauí e na região de Barreiras (BA) para suprir a usina. A cooperativa, contudo, está estimulando o plantio do sorgo entre os produtores cooperados e também no vizinho Estado de Sergipe. “O sorgo é uma planta mais rústica. É menos exigente em relação à água, além de ser mais resistente a pragas. Por isso, essa cultura se dá melhor em regiões de semiárido que o milho, que é mais dengoso”, comparou.
Outra vantagem é o fato de a linha de moagem do sorgo funcionar paralelamente à da cana-de-açúcar. Graças a investimentos realizados nos últimos anos, a cooperativa conta agora com uma usina ‘flex’. Segundo Santos, as duas linhas podem usar, em paralelo, a mesma infraestrutura de produção, que compreende geração de vapor e de energia, manutenção, água e laboratório.
Cooperativa Pindorama investiu em usina ‘flex’, com linha de moagem de sorgo funcionando paralelamente à de cana-de-açúcar (Foto: Divulgação)
Neste primeiro ano da moagem do sorgo, parte da produção se deu paralelamente à produção de etanol da cana, que ocorreu entre os meses de agosto do ano passado e fevereiro deste ano. “Com as duas estruturas de moagem, é possível manter a usina em operação o tempo todo. Nesse ano, vamos parar a usina somente para a manutenção”, disse Santos.
Outro benefício é o fato de a moagem do sorgo produzir um resíduo que pode ser utilizado para alimentação do gado. Trata-se do WDG, resíduo que tem em sua composição cerca de 36% de proteína. A previsão é de que, neste ano, sejam geradas 35 mil toneladas de WDG, já ofertadas para vários estados do Nordeste. Além do elevado teor de proteínas, o WDG custa quase a metade do valor pago pelo farelo de trigo, por exemplo, o que tem chamado a atenção de pecuaristas do Nordeste.
A cooperativa desenvolveu um sistema de confinamento coletivo, batizado de “Boitel”, que conta com mais de 2 mil animais. Nesse sistema, o criador deixa os animais aos cuidados da cooperativa, que o alimenta e realiza os tratos necessários, mediante o pagamento de um valor por esses serviços.
(N.R. Consultada, a Inpasa preferiu não se pronunciar)
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