Revista Brasil Energia | Hidrelétricas, Água e Sustentabilidade

Conteúdo oferecido por ELETROBRAS

UHE Santo Antônio mostra resiliência e dá volta por cima em 2024

Como a usina do Rio Madeira, que ficou parada por 15 dias em 2023, encontrou este ano solução técnica para se manter gerando na maior seca da história do rio

Por Chico Santos

Compartilhe Facebook Instagram Twitter Linkedin Whatsapp

A partir de manobra operacional, aproveitando a posição geográfica das turbinas da margem direita, usina de Santo Antônio não precisou parar durante a seca de 2024 (Foto: Divulgação Eletrobras)

Dia 1º de outubro de 2023, um domingo. A vazão afluente do pequeno reservatório da UHE Santo Antônio, no rio Madeira, que na verdade funciona a fio d’água, cai abaixo de 3 mil m3/s e acende uma luz vermelha para a segurança técnico-operacional. Este é o limite mínimo para o complexo de 50 unidades geradoras equipadas com turbinas tipo bulbo, de 71,37 MW cada, totalizando 3.568,3 MW de capacidade.

Em comum acordo com o ONS, a Eletrobras, concessionária da usina, decide parar as máquinas da quarta maior hidrelétrica 100% brasileira. Como consequência da parada, foi desligado o chamado Linhão do Madeira, bipolo de 600 kV que conecta as usinas de Santo Antônio e Jirau diretamente ao Sudeste do país.

Dia 12 de outubro de 2024. A bacia do rio Madeira vive a maior seca da história desde que começaram a ser feitas as medições e a vazão em Santo Antônio desce a inimagináveis 1.987 m3/s, mas a usina segue operando e naquele dia gera 410,90 MWmed, segundo as estatísticas do operador do SIN.

Na verdade, a seca extrema deste ano chegou ao Madeira muito antes do começo de outubro. No dia 1º de setembro, os dados do ONS já mostravam afluência de 2.981 e defluência de 3.014 na usina. A sinalização era de que Santo Antônio iria parar novamente, desta vez, bem mais cedo.

Mas não parou. Naquele dia, a usina gerou 674,13 MWmed e a partir do dia 4 de setembro passou a gerar no limite de 490 MWmed. Em 1º de outubro, aniversário da paralisação forçada do ano anterior, a usina gerou 385,55 MWmed. A vazão defluente era de 2.173 m3/s.

Como no mundo tecnológico não existem milagres, o que mudou para tamanha inversão de comportamento? Segundo a Eletrobras, ao longo do período seco deste ano a usina manteve uma disponibilidade média de 487 MW. No ano passado ela ficou parada por 15 dias, só retornando a operar dois domingos depois que parou, quando o rio estava em recuperação e a afluência acima dos 3.200 m3/s.

“Com a crise de 2023, o que nós fizemos, primeiramente, foi nos aprofundarmos no relevo da região, principalmente no barramento da usina. E verificamos que as turbinas localizadas no grupo gerador nº 1, ou seja, na margem direita do rio, tinham uma posição geográfica distinta das demais. À frente dessas turbinas, temos um grande paredão de rochas e esse paredão forma uma espécie de remanso, fazendo com que, se nós concentrássemos a geração da usina na margem direita, poderíamos ter uma elevação da cota jusante e manter a usina operando, mesmo em uma situação mais crítica do que a verificada em 2023”, explica Caio Pompeu de Souza Neto, CEO de Santo Antônio.

Manobra operacional feita pela Eletrobras aproveita a posição geográfica das turbinas do grupo gerador 1, na margem direita, criando uma jusante artificial com o remanso formado pelo paredão de rochas do local (Foto: Eletrobras)

O gerente de Operações da usina, Douglas Morais, relata que a partir do aprendizado proporcionado pelo evento de 2023 e dos conhecimentos adquiridos sobre a formação geológica do trecho imediatamente abaixo (a jusante) da barragem, a Eletrobras concentrou no primeiro semestre deste ano as manutenções necessárias no grupo gerador nº 1, composto por oito unidades (UGs), de modo a que elas estivessem disponíveis quando chegasse o período de seca mais extremo.

Morais explica que, com essa providência, quando a vazante do rio chegou ao nível crítico, os técnicos de Santo Antônio concentraram a passagem da água no trecho correspondente àquelas oito turbinas, sete delas o tempo todo disponíveis para geração, e também nas três comportas que compõem o vertedouro da margem direita do rio, propiciando as condições necessárias à continuidade da geração.

A necessidade de elevação da chamada cota de jusante para permitir a operação na seca extrema está associada a aspectos técnicos da engenharia dos equipamentos que compõem as 50 UGs de Santo Antônio.

Resumidamente, as turbinas do tipo bulbo que equipam a usina são especiais para operação em barragens de baixa queda, no caso, segundo Morais, entre nove e 26 metros de distância entre o nível da água a montante da barragem e a jusante, onde o rio segue seu curso. A turbina bulbo também opera necessariamente submersa.

A elevação artificial da cota de jusante, conforme a explicação do gerente, evitou que a queda superasse as especificações das turbinas e permitiu que elas seguissem gerando. Segundo o CEO Souza Neto, a elevação da cota de jusante foi de dois metros, fazendo com que ela ficasse em 46 metros, enquanto as especificações dos fornecedores estabelecem que as máquinas podem operar com cota de jusante de até 44 metros, excepcionalmente. Ou seja, foi possível rodar até com folga operacional de dois metros na cota jusante.

Foco em Rondônia e no Acre

Uma segunda manobra importante foi feita no arranjo operacional da UHE Santo Antônio para assegurar uma destinação ótima da energia gerada durante o período de seca extrema. Das 50 UGs da usina, 44 são normalmente conectadas ao Linhão do Madeira e as outras seis direcionam a energia para a linha de 230 kV que abastece os estados de Rondônia, sede da usina, e Acre.

As turbinas do tipo bulbo que equipam a usina são especiais para operação em barragens de baixa queda, entre nove e 26 m de distância entre o nível da água a montante e a jusante, onde o rio segue seu curso (Foto: Eletrobras)

Como as oito UGs da margem direita fazem parte do conjunto ligado ao Linhão, a empresa e o ONS promoveram uma reversão que direcionou toda a energia gerada pela usina para a subestação de 230 kV, contribuindo para reduzir o risco de blecaute nos dois estados e minimizando o recurso à geração térmica a óleo, de elevado custo financeiro e ambiental.

“Isso reflete o grande compromisso que Santo Antônio e a Eletrobras têm com os estados do Acre e Rondônia”, disse Souza Neto, acrescentando que houve uma orientação clara da concessionária no sentido de manter “a robustez do suprimento” para os dois estados, cuja segurança energética está fortemente ligada ao suprimento de Santo Antônio e Jirau.

O estresse provocado pela seca recorde durou mais de dois meses e somente na primeira semana de novembro as afluências do rio Madeira, na altura das usinas Jirau e Santo Antônio, voltaram a superar os 3 mil m3/s. Na seca do ano passado, o período crítico durou apenas 15 dias.

Nesta primeira quinzena de dezembro a situação já normalizou completamente. Na semana passada, segundo Souza Neto, Santo Antônio operava com 31 UGs, sendo 26 conectadas ao Linhão do Madeira e cinco à linha de 230 kV que abastece Acre e Rondônia.

No dia 12/12, último dado disponível antes do fechamento deste texto, Santo Antônio gerou 2.449,92 MWmed, acima dos 2.313 MWmed de sua garantia física. A afluência no mesmo dia foi de 15.863 m3/s.

Segundo o CEO da usina, os limites operacionais a partir de agora estão mais ligados às conveniências operacionais do ONS do que a limitações de ordem técnica das UGs. Como o avanço das mudanças climáticas acenam com prováveis reprises dos problemas enfrentados este ano, até em graus mais elevados, Souza Neto disse que o centro de inteligência meteorológica da Eletrobras vem trabalhando para municiar os gestores de suas usinas de previsões que lhes permitam buscar a tempo soluções para os próximos desafios.

Newsletter Opinião

Cadastre-se para receber mensalmente nossa newsletter com os artigos dos nossos Colunistas e Articulistas em Petróleo, Gás e Energia

Veja outras notícias sobre hidrelétricas, água e sustentabilidade

Últimas