
Opinião
Hidrogênio verde e a liderança que exige mais que potencial
O avanço da indústria do hidrogênio verde no Brasil deixou de ser uma perspectiva futura para se tornar uma realidade em construção

Com uma matriz elétrica composta por mais de 90% de fontes renováveis, um marco legal já estabelecido e uma posição geopolítica estratégica, o país reúne as condições técnicas, regulatórias e naturais para se tornar protagonista global na produção e exportação de hidrogênio de baixa emissão de carbono. No entanto, para que essa liderança se consolide, é fundamental garantir a implementação eficiente das políticas públicas e o alinhamento entre os setores público e privado.
A Agenda Prioritária da ABIHV para 2025, lançada em conjunto com a Comissão Especial da Câmara dos Deputados para a Transição Energética e Produção de Hidrogênio Verde (Ceenerg), delineia os sete eixos centrais que devem nortear o desenvolvimento do setor: implementação do marco legal (PHBC); desenvolvimento de hubs nacionais até 2035; ampliação da infraestrutura de transmissão; revisão tributária com fortalecimento das Zonas de Processamento de Exportação (ZPEs); indução de demanda via mercado de carbono e políticas setoriais; acesso a financiamento climático; e integração às cadeias globais de energia limpa. Esses eixos não são apenas estratégicos, mas urgentes, frente ao ritmo de evolução internacional da economia do hidrogênio.
A infraestrutura elétrica ocupa papel central nesse debate. Estima-se que entre 70% e 75% do custo de produção do hidrogênio verde esteja vinculado ao consumo de eletricidade. A proposta da ABIHV prevê a realização de um leilão exclusivo de transmissão em 2026, com contratação de ao menos 4 GW de capacidade adicional e entrada em operação até 2029. A não observância desse cronograma coloca em risco até R$80 bilhões em investimentos e cerca de 30 mil empregos entre 2025 e 2030.
Mais do que conectar novas cargas como plantas industriais e data centers, trata-se de evitar gargalos que já hoje afetam a geração renovável, especialmente no Nordeste, e que comprometem a segurança jurídica dos projetos.
Do ponto de vista regulatório, 2024 representou um marco com a aprovação do Plano Nacional de Hidrogênio (PNH2), do Programa Mover, da Lei do Mercado de Carbono e da Nova Indústria Brasil (NIB). No entanto, a etapa mais sensível e complexa é a regulamentação. A definição da taxonomia, os critérios de certificação e o detalhamento do regime fiscal favorecido para o hidrogênio verde são determinantes para garantir segurança jurídica e previsibilidade aos investidores. A atuação conjunta entre Executivo, Legislativo e setor produtivo, coordenada por entidades como a ABIHV é, portanto, indispensável.
A indução de demanda interna deve acompanhar esse movimento. O hidrogênio verde é vetor estratégico para setores industriais como fertilizantes, siderurgia, cimento, alimentos e transporte pesado.
Adicionalmente, abre espaço para que cooperativas agrícolas e de energia participem de hubs regionais, com acesso a financiamentos verdes e inserção em cadeias produtivas sustentáveis. Essa capilaridade reforça o potencial do hidrogênio como ferramenta de desenvolvimento regional, especialmente em estados do Nordeste e do Sudeste, que já se articulam para integrar essa nova economia.
A agenda de financiamento também avança, com maior interesse de bancos públicos e privados em projetos de energia limpa. A robustez da matriz renovável brasileira, a disponibilidade de água e terras e o alinhamento às metas climáticas internacionais conferem atratividade aos ativos nacionais. No entanto, é essencial que esse potencial se traduza em projetos concretos, com cronogramas definidos, governança transparente e critérios técnicos bem estabelecidos.
O Brasil já reúne as condições objetivas para se consolidar como referência internacional na produção de hidrogênio verde. O desafio está em transformar esse potencial em resultados tangíveis. A ABIHV seguirá atuando como articuladora institucional, representando os interesses de uma indústria comprometida com a sustentabilidade, a inovação e a geração de valor para o país. A transição energética não é apenas uma meta ambiental, mas uma oportunidade econômica e o Brasil tem tudo para liderá-la.