Opinião

Novas discussões sobre a prorrogação das concessões de distribuição

Esforços deveriam estar concentrados na definição do novo marco legal do setor elétrico, de modo a permitir que os novos contratos de concessão, que perdurarão pelos próximos 30 anos, já possam contemplar uma nova dinâmica

Por Mariana Saragoça

Compartilhe Facebook Instagram Twitter Linkedin Whatsapp

Com o avançar dos meses, considerando a iminência do término de concessões de distribuição de energia elétrica a partir de 2025, e mesmo já descumpridos os prazos legais e contratuais para a definição do tratamento a ser conferido a este grupo de distribuidoras, as discussões sobre o tema ganham novos contornos a partir de ações do Congresso Nacional e do Ministério de Minas e Energia (MME).

Há mais de um ano, alertávamos sobre A necessária discussão acerca da possibilidade de prorrogação das concessões de distribuição e a relevância de que o tratamento a ser conferido a estas concessões fosse definido com a maior brevidade possível, seja por meio de nova licitação ou prorrogação, cuja opção, pelo Poder Concedente, deveria estar fundamentada na comprovação do atendimento ao interesse público.

Ainda que após os prazos estabelecidos na legislação e nos primeiros contratos de concessão a vencerem, o MME promoveu a Consulta Pública nº 152/2023, fundamentada na Nota Técnica nº 14/2023/SAER/SE, propondo a prorrogação dessas concessões como regra geral, como também detalhado no artigo A proposta para prorrogação das concessões de distribuição.

Paralelamente ao processo de Consulta Pública, o setor se deparou com manifestações de membros do Congresso Nacional, em uma tentativa de avocar a responsabilidade para definir as diretrizes a serem aplicadas ao término das referidas concessões.

No que se refere às matérias sob análise Congresso Nacional, há de se destacar que tão ou mais importante que a discussão dos critérios de prorrogação, é a definição do novo marco legal da modernização do mercado, debatida há pelos menos sete anos por meio do PL nº 414/2021 (decorrente do PLS 232/2016) e sem previsão de conclusão.

É neste ponto que deveriam estar centrados os esforços, de modo a permitir que os novos contratos de concessão, que perdurarão pelos próximos 30 anos, já possam contemplar a nova dinâmica do setor elétrico.

Ainda que seja legítimo e parte do processo democrático que o legislativo venha a participar do processo de definição das regras para o tratamento às concessões vincendas – inclusive no âmbito da Consulta Pública aberta pelo MME com essa finalidade –, fato é que já existe previsão legal para a contratação e prorrogação das concessões do setor elétrico, em especial nos termos da Lei nº 9.074/1995.

Com base no arcabouço normativo vigente, o MME promoveu a referida Consulta Pública, cujos resultados/conclusões foram recentemente encaminhados para análise pelo Tribunal de Contas da União – TCU, nos termos consubstanciados na Nota Técnica nº 19/2023/SAER/SE, que trouxe alterações importantes quanto à proposta inicial.

Na conclusão da referida Consulta Pública, destacou-se, inicialmente, a relevância de se garantir uma maior flexibilidade às cláusulas econômicas de modo a permitir que a regulação atue para adequar a prestação do serviço público às novas dinâmicas que estão sendo avaliadas para os serviços de distribuição de energia elétrica, como a abertura do mercado, novas estruturas tarifárias e a possibilidade de separação das atividades prestadas pelas distribuidoras.

Quanto às condicionantes para a prorrogação das concessões, também foi reafirmada a conveniência e adequação de se manter o critério de análise do cumprimento dos indicadores de qualidade/continuidade e de sustentabilidade econômico-financeira que serão avaliados de forma objetiva tendo sido excluída a possibilidade de apresentação de um plano de transferência de controle societário como alternativa ao descumprimento do referidos indicadores.

Para tanto, quando disponíveis, serão avaliados os indicadores de qualidade/continuidade e de sustentabilidade econômico-financeira nos últimos anos da concessão, havendo previsão de que duas violações consecutivas do indicador de gestão econômico‐financeira ou três violações dos indicadores de qualidade levarão à recomendação de não prorrogação ou à possibilidade de troca de controle societário.

Sobre o eventual excedente econômico – um dos temas objeto de maior debate quando da abertura da Consulta Pública –, o MME concluiu que, em decorrência da alta complexidade e ausência de critérios objetivos, deixaria de avaliar as questões referentes a esse ponto.

Na mesma linha, e em outro tópico que se entendia relevante garantir a segurança jurídica, em especial pelo fato de o tema estar sendo discutido no âmbito do Supremo Tribunal Federal (STF), o MME também concluiu pela inadequação, ao menos por enquanto, de se capturar eventuais benefícios tributários, tais como Sudam e Sudene.

Das análises do MME, também merecem destaque os impactos e eventuais prejuízos, inclusive à segurança jurídica e ao equilíbrio econômico-financeiro das concessões, decorrentes da citada indefinição acerca do novo marco legal. Uma série de contribuições e análises de temas de extrema relevância como enterramento de cabos, separação das atividades de distribuição e comercialização, digitalização das redes e aplicação de medidores inteligentes acabaram ficando em aberto para definição e regulação ao longo dos próximos anos.

Embora estivéssemos diante de uma oportunidade para estabelecer a modernização de diretrizes que guiarão o setor elétrico nos próximos anos, a demora na tomada de decisão acabou por impedir uma discussão mais profunda diante da premência do término dessas concessões.

Neste cenário, dados os riscos e prejuízos de não se definir o tratamento tempestivamente, revela-se prudente o encaminhamento sugerido pelo MME, garantindo a segurança jurídica e permitindo atualizações ao longo dessas concessões.

Resta aguardar a conclusão das discussões entre Poder Executivo, Congresso Nacional e TCU para que sejam adotadas medidas adequadas em prol de um setor elétrico mais equilibrado.

Mariana Saragoça é advogada e sócia do escritório Stocche Forbes, com atuação nas áreas de Direito Administrativo, Infraestrutura e Regulação; Frederico Accon Soares é advogado sênior e sócio do escritório Stocche Forbes, com atuação nas áreas de Direito Administrativo, Infraestrutura e Regulação com ênfase no setor elétrico.

Outros Artigos