Opinião

Compartilhamento de infraestrutura: incentivos para que todos ganhem

O valor destinado à redução das tarifas de eletricidade poderia ser muito maior se o problema regulatório de compartilhamento de infraestrutura fosse resolvido, permitindo que todos os postes usados pelas operadoras de telecom pagassem por esse serviço

Por Claudio Sales

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  • Com coautoria de Eduardo Müller Monteiro

 

O compartilhamento de infraestrutura física entre os setores regulados de eletricidade e de telecomunicações é um tema regulatório discutido há mais de 20 anos, contando inclusive com atuação coordenada das agências reguladoras dos setores de eletricidade (Aneel) e de telecomunicações (Anatel), que chegaram a publicar resoluções conjuntas sobre o tema.

O próprio cidadão comum – ora no papel de consumidor de energia elétrica, ora no papel de consumidor de telecomunicações – consegue ter uma boa intuição sobre as vantagens e os desafios de se compartilhar os postes que foram instalados pelas distribuidoras de eletricidade e que passaram a ser ocupados por operadoras de telecom.

Entre as vantagens, permitir que os mais de 50 milhões de postes espalhados pelo país sejam compartilhados pelos dois setores econômicos abre caminho para: (a) redução de custos para expansão do setor de telecomunicações, aproveitando os postes pré-existentes; e (b) redução de tarifas de eletricidade, já que 60% da receita obtida pelas concessionárias elétricas é revertida para seus consumidores.

Já entre os desafios destacam-se: (a) a intensa disputa pela ocupação do espaço nos postes entre as operadoras de telecom, o que leva a uma sensação de desordem; e (b) como consequência da ocupação desordenada e muitas vezes clandestina, a perda de receita por cobrança pelo compartilhamento para as concessionárias de eletricidade.

Segundo a Aneel, em média as distribuidoras de eletricidade faturam menos de 25% do total de pontos de fixação (postes) que são compartilhados com telecomunicações. Ou seja, há uma perda de 75% da receita potencial por compartilhamento de infraestrutura que poderia beneficiar os consumidores de eletricidade com tarifas menores e permitir uma melhor ocupação dos postes com mais investimentos que poderiam ser feitos com o aumento da receita.

Esses desafios regulatórios foram recentemente enfrentados pela Aneel com a Consulta Pública 073/2021, que teve o objetivo de “Obter subsídios para a Avaliação de Impacto Regulatório – AIR e da proposta de aprimoramentos da regulamentação relativa ao compartilhamento de infraestrutura entre os setores de distribuição de energia elétrica e de telecomunicações”. A Anatel também abriu a Consulta Pública 017/2022 com objetivo semelhante.

As dimensões mais relevantes para se chegar a um novo arranjo regulatório são: (a) a definição de um plano com cronograma realista para que haja a adequada identificação de postes a serem regularizados, a retirada de cabos não identificados e a regularização pelas empresas de telecom; (b) uma estrutura de preços para a cobrança do compartilhamento de infraestrutura compatível com as estruturas de custos de cada concessionária de distribuição; e (c) a redução do percentual atual de 60% para modicidade tarifária a fim de aumentar os incentivos de esforços por parte das concessionárias de distribuição.

Enquanto este problema regulatório não é resolvido, permanecem baixos os incentivos para melhorar a ocupação dos postes e para que seja cobrado o que é devido daqueles que se beneficiam da infraestrutura originalmente instalada.

Tempo é dinheiro: a cada dia que passa, cerca de 3 em cada 4 postes que poderiam estar cobrando pelo compartilhamento de postes não o fazem. O valor anual destinado à redução das tarifas de eletricidade em benefício dos consumidores é de quase R$ 1,5 bilhão, mas esse valor poderia ser de quase R$ 6 bilhões se o problema regulatório de compartilhamento de infraestrutura fosse resolvido para permitir que todos os postes usados pelas operadoras de telecom pagassem por esse serviço.

A Aneel e a Anatel têm, portanto, alguns bilhões de razões para acelerar a solução regulatória de enfrentamento da atual situação de compartilhamento de infraestrutura. Tanto os consumidores quanto os cidadãos brasileiros agradecem: os primeiros teriam tarifas menores e os últimos desfrutariam de cidades mais bonitas e sem a poluição visual que vemos hoje nas ruas.

 

 

Eduardo Müller Monteiro e Claudio Sales são Diretor Executivo e Presidente do Instituto Acende Brasil (www.acendebrasil.com.br). Escrevem na Brasil Energia a cada dois meses.

 

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