Opinião
O Senado ante os subsídios para eólica offshore e outros jabutis
O PL 576/2021 e os cinco jabutis nele incorporados, cuja votação foi adiada, geram custos altos e desnecessários para o consumidor de energia
Coautores: Eduardo Müller Monteiro e Richard Hochstetler*
Na manhã de 25/nov/2024, uma 2ª feira, as empresas e os consumidores do setor elétrico foram surpreendidos com a inquietante informação de que no dia seguinte (26/nov/2024) seria pautado para votação no Senado o Projeto de Lei 576/2021 (PL 576/2021), projeto que originalmente trataria do marco das usinas eólicas offshore, mas que foi desconfigurado com a inclusão de múltiplos jabutis.
Além da ameaça de votação relâmpago (de um dia para o outro), a votação do PL 576/2021 na Comissão de Infraestrutura do Senado seria simbólica e sem a divulgação tempestiva do relatório final do Senador relator.
A votação foi felizmente retirada da pauta da Comissão de Infraestrutura na manhã do dia 26 de novembro com a justificativa de que o relator ainda não havia fechado o texto final, o que não deixa de ser assustador. Afinal, a última revisão do PL 576/2021 disponibilizada em abril tinha 29 páginas de conteúdo altamente técnico e cheio de conexões com outras legislações. Portanto, se o texto que estava sendo negociado pelos senadores nesta semana for parecido, como supor que nossos legisladores teriam tempo para analisar um texto tão complexo?
Para que tanta pressa? Seria para impossibilitar o escrutínio da sociedade de um texto eivado de reservas de mercado e subsídios que beneficiariam poucos grupos de pressão às custas de todos os consumidores de eletricidade? E que tipo de processo legislativo é esse que poderia ter colocado para votação um projeto de alto impacto e alto custo sem a ampla divulgação – e com a devida antecedência – do seu texto final?
Há fortes indícios de que o texto do PL 576/2021 sendo negociado no Congresso embute vários ´jabutis´ que impactarão a conta de energia do consumidor.
Além de criar uma injustificável reserva de mercado para eólicas offshore por meio de leilões exclusivos para este tipo de fonte (ou seja, sem permitir a disputa com outras fontes de energia para aumentar a competição entre os ofertantes e diminuir o preço final do leilão), o texto de abril de 2024 já continha os seguintes jabutis:
- ampliação dos subsídios dos custos de transmissão e distribuição de “fontes incentivadas” (solar, eólica, biomassa e cogeração), subsídios que já oneraram os consumidores em R$ 11 bilhões de janeiro a novembro de 2024;
- modificação das bizarras reservas de mercado previstas na Lei de Desestatização da Eletrobras (Lei 14.182/2021) com a contratação direcionada por tipo de fonte e por região de pequenas centrais hidrelétricas, hidrogénio líquido no Nordeste, eólicas no Sul, e termelétricas a gás;
- prorrogação dos subsídios para usinas do anacrônico Proinfa, um programa caro, criado em 2002, e que não faz mais sentido;
- prorrogação dos subsídios da minigeração distribuída, um ´Robin Hood às avessas´ que custará aos consumidores mais de R$ 10 bilhões em 2024; e
- estabelecimento de reserva de mercado para a geração a carvão mineral nacional.
Tanto o objetivo original do PL 576/2021 (reserva de mercado para eólica offshore) quanto os cinco jabutis acima geram custos altos e desnecessários para o consumidor de energia ao introduzir, ampliar ou prorrogar subsídios e reservas de mercado que não deveriam sequer ser cogitados por parlamentares que frequentemente vêm a público reclamar do valor das tarifas de eletricidade, as mesmas tarifas que seriam ainda mais pressionadas com esse projeto de lei.
Confiamos que, cientes da gravidade das distorções acima, os prezados senadores da Comissão de Infraestrutura rejeitarão a aprovação do PL 576/2021 da forma açodada – e sem conhecimento prévio do relatório com suas propostas de revisão – a que estamos assistindo.
Só assim será possível analisar, debater e decidir sobre uma proposta legislativa com conhecimento de seus impactos regulatórios e tarifários. O caminho para reduzir a conta de luz exige transparência e respeito às boas práticas legislativas.
*Eduardo Müller Monteiro e Richard Hochstetler são diretores do Instituto Acende Brasil