Opinião

Descomissionamento de sistemas submarinos: a remoção pode ser a pior solução

Boas práticas mundiais indicam a necessidade de estudos robustos caso a caso, afirma Eduardo Zacaron, da Petrobras

Por Eduardo Zacaron Gomes

Compartilhe Facebook Instagram Twitter Linkedin Whatsapp

Para viabilizar a produção de petróleo em alto mar, são perfurados poços no leito marinho e instalados dutos e equipamentos submarinos que controlam o escoamento seguro da produção até as plataformas. Essas atividades são reguladas por diversos órgãos públicos, os quais emitem as respectivas licenças e autorizações, permitindo a instalação e manutenção desses dutos e equipamentos no solo marinho por toda a vida útil dos empreendimentos, que pode se estender por mais de 30 anos.

Após anos de operação, quando não há mais viabilidade técnica ou econômica para continuidade da produção em uma determinada região, os sistemas são descomissionados. No descomissionamento, os poços são devidamente tamponados para garantir o isolamento dos reservatórios, e os dutos e equipamentos submarinos, devidamente limpos, permitindo, dessa forma, a desconexão e destinação adequada das plataformas.

Nesse momento, uma questão que se coloca é: qual a melhor alternativa de destinação final desses dutos e equipamentos submarinos instalados? Removê-los integralmente, removê-los parcialmente ou não os remover?

A decisão não é simples, e vários aspectos devem ser considerados, por exemplo: riscos à segurança dos trabalhadores durante as operações de recolhimento; possíveis impactos nos ambientes marinho e terrestre; possibilidade de impactos sobre a navegação e outras atividades econômicas; e os custos envolvidos.

Essa questão tem sido alvo de intensa análise e discussão em todo o mundo nos últimos anos. Para auxiliar na sua solução, a indústria mundial de óleo e gás, com o apoio do meio acadêmico e via parcerias com diversas instituições, tem investido em pesquisas para entender melhor os impactos e riscos de cada alternativa, bem como desenvolver metodologias holísticas e robustas, baseadas em análises de diversos critérios (ambiental, técnico, de segurança, de avaliação do ciclo de vida, social e econômico) que permitem comparar, de forma objetiva, as vantagens e desvantagens das alternativas.

Como essa decisão não impacta apenas a indústria de óleo e gás, as pesquisas e desenvolvimentos têm buscado envolver, além dos órgãos reguladores, diferentes setores da sociedade. Esse é o caso do Termo de Cooperação entre a Petrobras e a COPPE/UFRJ, parceria que visa desenvolver uma metodologia de apoio à decisão em projetos de descomissionamento de sistemas submarinos e que conta com o apoio de várias partes interessadas, as quais puderam contribuir diretamente na construção desta metodologia.

Envolvendo mais de 40 professores e pesquisadores distribuídos em oito áreas temáticas (técnica, ambiental, social, avaliação do ciclo de vida, legislação, segurança e saúde, economia e métodos de tomada de decisão), a parceria teve início em janeiro de 2018 e está dividido em duas fases: a Fase 1, já concluída, consistiu na construção de um guia com diretrizes para o processo de avaliação de alternativas de descomissionamento e tomada de decisão quanto à destinação final de componentes de sistemas submarinos, para definição da alternativa mais indicada para cada caso. Já a Fase 2, que está em andamento, compreende a realização de estudos de caso e o desenvolvimento de uma ferramenta computacional que sintetize a metodologia de avaliação proposta.

Os resultados das pesquisas realizadas por várias empresas e instituições no mundo, bem como a análise de projetos de descomissionamento de sistemas submarinos recentemente executados, evidenciam que a definição da melhor alternativa deve ocorrer caso a caso, não sendo indicada a estipulação de uma “alternativa padrão”, a qual poderia, em determinadas situações, implicar decisões de maior impacto negativo global.

Estudos apontam a não remoção como a alternativa mais apropriada em várias situações, havendo, inclusive, casos já aprovados no Brasil. Trabalhos técnicos têm mostrado que a permanência definitiva dos sistemas submarinos no leito marinho, devidamente limpos, evita o impacto ambiental adicional que se geraria no recolhimento das estruturas que se encontram instaladas há décadas e incorporadas ao ambiente marinho. Há também trabalhos indicando que os dutos e equipamentos submarinos podem trazer benefícios ambientais, atuando como recifes artificiais.

As normas jurídicas nacionais e internacionais não restringem a possibilidade de permanência definitiva dos sistemas submarinos no leito marinho, desde que, é claro, tal alternativa seja aprovada pelos respectivos órgãos reguladores.

Além das questões técnicas e ambientais envolvidas na decisão quanto à destinação final dos sistemas submarinos, há os aspectos jurídicos. Trabalhos publicados abordando a questão sob essa ótica apontam que a permanência definitiva no leito marinho de sistemas submarinos utilizados na produção de petróleo não é proibida pelas normas internacionais e nacionais referentes à matéria, ou seja, estão alinhadas com o entendimento de que a análise e decisão quanto à melhor alternativa de destinação de dutos e equipamentos submarinos deve ser tomada caso a caso, considerando-se os múltiplos critérios envolvidos.

A nova regulamentação da ANP sobre o tema, Resolução nº 817/2020, define que “quaisquer instalações deverão ser removidas da área sob contrato” e que “a remoção parcial ou a permanência definitiva in situ de instalações poderá ser admitida em caráter de exceção, desde que atendidos os requisitos normativos aplicáveis e devidamente justificada”.

A resolução prevê a adoção da análise de alternativas considerando-se os critérios “técnico, ambiental, social, de segurança e econômico” como ferramenta de apoio à decisão. Os estudos técnicos e ambientais, considerando-se esses critérios de forma global, têm demonstrado que a não remoção ou remoção parcial dos sistemas submarinos são a opção recomendada na maioria dos casos, sem ferir requisitos normativos aplicáveis.

Custos de descomissionamento podem inibir investimentos em campos maduros

Os campos maduros apresentam grandes oportunidades de continuidade operacional, tanto pela migração da operação para empresas especializadas nesse tipo de portfólio como com a implantação de projetos de novas interligações e de revitalização. Contudo, esses ativos possuem longevidade mais restrita, e os custos de uma eventual remoção total dos sistemas submarinos se tornam ainda mais representativos, podendo causar a inviabilidade econômica de continuidade operacional e de novos investimentos e, por conseguinte, implicando a antecipação da interrupção total da produção, com enormes perdas para a sociedade.

Dessa forma -- visto que os estudos técnicos têm demonstrado que a permanência da maior parte dos sistemas submarinos no leito marinho não representa impactos negativos ao meio ambiente e que, por vezes podem até mesmo acarretar impactos positivos --, a decisão pela não remoção pode viabilizar novos investimentos, garantindo a geração de empregos e arrecadações, com benefícios globais significativamente maiores que os associados à remoção total dos dutos e equipamentos.

Fica claro, portanto, que não é recomendável o estabelecimento de uma “alternativa padrão” que pode gerar impactos não avaliados adequadamente, inclusive do ponto de vista ambiental. As boas práticas mundiais apontam a necessidade de estudos robustos, caso a caso, com a definição de metodologias de tomada de decisão objetivas que garantam a adoção de soluções embasadas em análises técnicas, levando-se em conta múltiplos critérios, e que permitam maior previsibilidade à indústria.

Evidentemente, a não adoção de uma “alternativa padrão” não deve representar mitigação das exigências ambientais no descomissionamento de sistemas submarinos, cabendo às empresas demonstrarem que, dadas as características específicas de cada projeto, a alternativa proposta é a mais adequada tanto do ponto de vista ambiental quanto dos demais critérios que devem ser avaliados.

Pelas razões apontadas, entende-se ser fundamental aprofundar o debate sobre o tema no país, com o objetivo de incentivar as melhores decisões de descomissionamento sob os aspectos ambientais, sociais, de risco e custo, bem como estimular os investimentos em campos maduros, maximizando o aproveitamento dos recursos energéticos brasileiros.

Eduardo H. Zacaron Gomes é gerente geral de Descomissionamentos da Petrobras[/vc_column_text][/vc_column][/vc_row][vc_row][vc_column][vc_raw_html]JTNDZGl2JTIwcm9sZSUzRCUyMm1haW4lMjIlMjBpZCUzRCUyMm5ld3NsZXR0ZXItb3Bpbmlhby02ZWY3ZjBkYWRiMWJmYzA0YTA5MyUyMiUzRSUzQyUyRmRpdiUzRSUwQSUzQ3NjcmlwdCUyMHR5cGUlM0QlMjJ0ZXh0JTJGamF2YXNjcmlwdCUyMiUyMHNyYyUzRCUyMmh0dHBzJTNBJTJGJTJGZDMzNWx1dXB1Z3N5Mi5jbG91ZGZyb250Lm5ldCUyRmpzJTJGcmRzdGF0aW9uLWZvcm1zJTJGc3RhYmxlJTJGcmRzdGF0aW9uLWZvcm1zLm1pbi5qcyUyMiUzRSUzQyUyRnNjcmlwdCUzRSUwQSUzQ3NjcmlwdCUyMHR5cGUlM0QlMjJ0ZXh0JTJGamF2YXNjcmlwdCUyMiUzRSUyMG5ldyUyMFJEU3RhdGlvbkZvcm1zJTI4JTI3bmV3c2xldHRlci1vcGluaWFvLTZlZjdmMGRhZGIxYmZjMDRhMDkzJTI3JTJDJTIwJTI3VUEtMjYxNDk5MTItOCUyNyUyOS5jcmVhdGVGb3JtJTI4JTI5JTNCJTNDJTJGc2NyaXB0JTNF[/vc_raw_html][/vc_column][/vc_row]

Outros Artigos