Opinião

A financeirização diminui importância da oferta e demanda na precificação do petróleo

Os fundamentos macroeconômicos estão tão negativos que, de certa forma, se sobressaem aos aspectos relacionados à oferta e demanda. Portanto, as quedas recentes vistas com os preços do petróleo têm uma questionável sustentação

Por Heitor Paiva

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O mercado de commodities é muito volátil e, em alguns momentos, os preços cotados nas bolsas podem não refletir os fundamentos de oferta e demanda. Isto se deve à chamada financeirização – que, por definição, é o aumento da relevância de instrumentos financeiros na formação de preços das matérias-primas. Em um grau que, a depender da conjuntura macroeconômica, pode escantear a influência que aspectos de disponibilidade e consumo destes ativos têm em seus preços.

Para se ter uma noção, o número de contratos em aberto em futuros e opções de petróleo negociados nas bolsas de Nova Iorque e Londres corresponde a um volume mais que 30 vezes maior que a produção diária da commodity. Por este motivo, fatores psicológicos dos traders de Wall Street ou da City londrina têm a capacidade de fazer mais preço do que os dados normalmente analisados pelos analistas – sendo eles o nível de produção, consumo e estoques das commodities – principalmente as energéticas, como o petróleo e derivados.

É fato que, na maioria das vezes, a mentalidade dos traders está em linha com os fundamentos de oferta e demanda. Ou seja, quando há uma escassez de óleo, os preços dos futuros sobem – e vice-versa. Entretanto, há momentos em que se passa uma divergência e, por mais que o mercado “real” de petróleo e derivados aponte para um sentido, os preços nas bolsas seguem uma outra direção. E parece ser exatamente isto que se passa no momento atual com as commodities energéticas: um descolamento do mercado futuro com o físico.

Por mais que a OPEP+ tenha anunciado um corte de mais de 1 milhão de barris por dia, a partir de maio, e que a indústria do upstream sofra com aumento nos custos de produção e baixo investimentos, os futuros do Brent têm caído mais de 10% desde o início do ano. E o porquê disto? Porque a percepção em relação ao futuro, por parte da comunidade financeira, está pessimista. Ou seja, os fundamentos macroeconômicos estão tão negativos que, de certa forma, se sobressaem aos aspectos relacionados à oferta e demanda – que jamais justificariam tamanhas derrocadas vistas com as cotações das commodities energéticas.

Por exemplo, a questão dos bancos regionais nos EUA, juntamente a uma decepcionante reabertura da China, ofusca as perspectivas de crescimento econômico de curto prazo. Sendo o petróleo e os derivados commodities cuja demanda cresce pari passu à economia global, não há motivos para esperar que o preço suba, não é mesmo? Na verdade, não necessariamente.

Isto porque existem problemas estruturais relacionados à oferta que não devem ser esquecidos. Capex continua globalmente baixo nas atividades de exploração e produção – e, por mais que as grandes petrolíferas tenham anunciado um aumento nos investimentos, a inflação presente nos campos petrolíferos, somada à escassez de mão de obra global, cria um cenário no qual o aumento do investimento mais repõe custo do que, obrigatoriamente, cria condições de aumento de oferta.

Olhando para a frente, as indicações macro continuam preocupantes – o que, por sua vez, deve fazer com que o otimismo da comunidade financeira pelas commodities energéticas permaneça baixo. Bancos centrais estão começando a alterar o curso de alta dos juros – mas as condições financeiras restritas não irão embora da noite para o dia. É natural que a política monetária demore meses para surtir efeito. Portanto, as condições para um descolamento prolongado do mercado físico de petróleo com o de futuros continuam intactas – levando à volatilidade e pessimismo no curto prazo.

 

 

Heitor Paiva é analista da Hedgepoint Global Markets. Atua com inteligência de mercado e pesquisa no mercado de câmbio e commodities, principalmente através de análise fundamentalista aplicada às commodities energéticas. Escreve na Brasil Energia a cada dois meses

 

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