Opinião
Do básico às ambiciosas metas do Brasil na COP 29
A participação do Brasil na COP 29 deveria focar em ações realistas e de longo prazo, visando solucionar questões básicas como garantir as etapas necessárias para atingir as metas do Marco do Saneamento para 2033 e acelerar a implementação da Política Nacional de Resíduos Sólidos que anda lentamente há 14 anos.
O Brasil chega à Conferência do Clima das Nações Unidas de 2024 (COP29) no Azerbaijão com uma nova meta climática (NDC - Nationally Determined Contribution): reduzir as emissões de gases de efeito estufa em até 67% até 2035, em comparação aos níveis de 2005. Este compromisso ressalta a importância de ações não só do governo federal, mas também dos governos subnacionais, em especial do estado de São Paulo, o primeiro da América Latina a aderir às campanhas da ONU por meio de decreto (Race to Zero e Race to Resislience) que também previu a elaboração do Plano de Ação Climática 2050 - PAC2050, para estabelecer uma trajetória de desenvolvimento econômico sustentável e de redução de emissões.
Apesar de tais esforços, o estado é o principal emissor nacional do setor de resíduos, correspondendo a 18,9% do total das emissões nacionais, segundo o Sistema de Estimativas de Emissões e Remoções de Gases de Efeito Estufa (SEEG), do Observatório do Clima.
As maiores emissões provêm dos aterros sanitários e efluentes líquidos domésticos, com destaque às emissões de metano (CH4), principal contribuinte para a formação do ozônio ao nível no solo e com potencial de aquecimento global 80 vezes maior que o dióxido de carbono (CO2) durante um período de 20 anos.
De acordo com o Relatório de Avaliação Global de Metano do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) e da Coalizão Clima e Ar Limpo, a subsequente redução anual do ozônio ao nível do solo evitaria, em termos globais, 260 mil mortes prematuras, 775 mil visitas hospitalares relacionadas à asma, 73 bilhões de horas de trabalho perdido devido ao calor extremo e 25 milhões de toneladas de perdas de safras.
Destaca-se que tais fontes de emissão, os resíduos, são factíveis de controle por meio de soluções potencialmente viáveis em termos econômicos e com claros benefícios ambientais, como é o caso das tecnologias de produção de biogás. No entanto, o sucesso na implementação de tais tecnologias em larga escala depende de uma combinação de fatores, como por exemplo incentivos fiscais, linhas de crédito e apoio técnico especializado (e de qualidade) para empresas, cooperativas e prefeituras.
Neste sentido, o Plano Nacional de Saneamento Básico, aprovado em 2020, estabelece como meta universalizar o acesso ao saneamento até 2033, sendo necessários investimentos anuais de quase R$ 45 bilhões, segundo o Instituto Trata Brasil. Ou seja, seria necessário mais que dobrar os investimentos que são feitos atualmente.
Essa meta ambiciosa tem potencial para mudar o panorama do setor (que hoje conta com aproximadamente 100 milhões de brasileiros sem acesso a coleta de esgoto) e coloca o Brasil em um caminho alinhado aos compromissos internacionais. No entanto, questões como a falta de financiamento adequado, a burocracia e as desigualdades regionais podem comprometer o progresso dessa agenda.
O novo marco legal do saneamento é um passo importante para atrair o financiamento necessário, uma vez que incentiva o envolvimento do setor privado. Implementar essas colaborações é, no entanto, desafiador, particularmente em regiões de menor atratividade econômica, como o Norte e o Nordeste, onde as baixas taxas de acesso ao saneamento básico e a carência de infraestrutura são mais perceptíveis.
Sem uma estratégia integrada que contemple essas regiões, a desigualdade no acesso aos serviços básicos tende a se agravar, dificultando o cumprimento das metas dos ODS.
A precariedade no tratamento de resíduos sólidos é outro problema: a implementação da Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), criada em 2010, tem sido bastante lenta e o país ainda destina grande parte de seus resíduos a lixões e aterros sanitários inadequados, com impactos negativos para o meio ambiente.
A maioria dos municípios brasileiros ainda enfrenta obstáculos para implantar sistemas de coleta seletiva e grande parte dos resíduos é incorretamente descartada.
A participação do Brasil na COP 29 deveria, portanto, focar em ações realistas e de longo prazo visando solucionar ao menos as questões básicas. É essencial que o país apresente planos de ação com metas viáveis e indicadores claros de progresso e que busque alianças com outros países e organizações para compartilhar conhecimento e tecnologia.
Internamente, é preciso buscar parcerias entre governo, universidades e instituições de pesquisa, setor privado e sociedade civil para conscientização e investimentos em práticas sustentáveis, que realmente tragam benefícios para a população e avancem as metas dos ODS.